Dispersão das projeções econômicas é a menor desde 2015: o que isso significa?

Expectativas do Indicador de Incerteza atingiram menor nível desde 2015, refletindo maior consenso sobre evolução de variáveis-chave da economia, como inflação, câmbio e juros, à luz da atual política monetária restritiva.
A dispersão de projeções econômicas é um indicador bastante utilizado como referência de incerteza econômica. De fato, é de conhecimento intuitivo e um fato quase tautológico que quanto menor o consenso em relação ao cenário futuro da economia, maior será o nível de incerteza.
Por este motivo, o Indicador de Incerteza Econômica do FGV IBRE (IIE-Br) foi criado ao combinar duas medidas de incerteza. Primeiro, o chamado Indicador de Incerteza na Mídia, que mede a incidência de termos que denotam incerteza no debate público nacional[1], uma metodologia que se tornou popular após a crise financeira de 2008-09, com os estudos pioneiros de Bloom, Baker e Davis. Segundo, as dispersões das projeções dos especialistas consultados pelo Banco Central, em seu relatório Focus, para variáveis como câmbio, juros e inflação nos 12 meses seguintes. O primeiro pesa 80% no IIE-Br; o segundo, 20%.
Apesar da diferença metodológica entre os dois componentes, eles tendem a caminhar juntos e a apresentar pequenas diferenças ao longo do tempo. Mas isso não vem acontecendo em 2025. Apesar de um recuo em junho, o Indicador de Incerteza de Mídia fechou o primeiro semestre em patamar elevado em termos históricos, no limiar entre incerteza moderadamente elevada e incerteza muito elevada. Já o Indicador de Incerteza nas Expectativas, recuou em cinco dos seis meses percorridos em 2025 e fechou o semestre no nível mais baixo desde janeiro de 2015, ou seja, mais de 10 anos atrás. Ambos os indicadores são padronizados para ter média 100 no período de 2006 a 2015. Nos últimos 20 anos, a média dos dois componentes ficou em torno de 108 pontos. Embora o componente Mídia esteja atualmente apenas ligeiramente acima dessa média histórica, o componente Expectativas está substancialmente abaixo.
Gráfico 1 – Componente de Mídia e de Expectativas do Indicador de Incerteza Econômica (IIE-Br), em pontos
O que explicaria esta diferença e o que ela significa para economia brasileira?
O ponto de partida para se entender o motivo desta diferença pode ser o entendimento das motivações para o nível atual de cada um dos dois componentes do IIE-Br. O componente de Mídia (IIE-Br Mídia) vem girando em níveis elevados em 2025 por fatores de origem tanto interna quanto externa. Os principais fatores internos seriam a resiliência inflacionária e as incertezas em relação ao cenário fiscal. O principal fator externo seria a incerteza gerada pela guinada na política externa americana e seus sobressaltos.
Já o IIE-Br Expectativas encontra-se baixo no momento em grande parte devido à política monetária contracionista que vem sendo adotada pelo Banco Central este ano, levando especialistas de mercado a preverem uma rota mais ou menos parecida para câmbio, inflação e juros. Embora as expectativas dependam de outros fatores, este comportamento vem sendo tratado na literatura praticamente como um fato estilizado dos indicadores de dispersão. Diante de um cenário inflacionário, que tende a ser menos previsível, um aperto monetário - apesar de seus efeitos deletérios sobre a atividade econômica - pode reduzir as possibilidades de diferentes cenários macroeconômicos de curto e médio prazos. Adicionalmente, a manutenção da política monetária restritiva, aliada a uma comunicação mais clara por parte do Banco Central, tem contribuído também para uma menor dispersão das expectativas.
E qual seria a interpretação desta combinação pouco comum de resultados? Pensando no impacto tradicionalmente esperado da incerteza sobre decisões de investimento e contratações, por exemplo, considerando-se apenas o cenário macroeconômico interno, uma redução de incerteza das dispersões não deveria ser considerada, por si só, como um fator de impulso ao crescimento no momento, uma vez que os próprios juros necessários para promover esta alta seriam um fator limitativo. Este nível historicamente baixo das dispersões nas projeções de especialistas, portanto, não poderiam ser considerados como um indicador antecedente do outro componente, o Indicador de Mídia.
Este último, por sua vez, tornou-se imprevisível nos últimos tempos, seja pelo comportamento errático da política econômica americana, seja pelas dificuldades encontradas no diálogo entre Executivo e Legislativo no Brasil, seja pela proximidade das eleições do próximo ano.
A combinação entre a baixa dispersão nas projeções e a elevada incerteza captada pela mídia aponta para um cenário de maior previsibilidade técnica, mas com persistência de incertezas no debate público, especialmente em torno das contas públicas e do ambiente externo. Isso indica que, embora haja maior confiança nas trajetórias dos indicadores macroeconômicos, essa estabilidade não se converte automaticamente em decisões de investimento e consumo, que também são influenciadas por outros fatores econômicos e geopolíticos mais amplos.
[1] A fonte de informações para o chamado debate público seriam as matérias publicadas em versões impressas e online de sete dos principais veículos jornalísticos do Brasil.
As opiniões expressas neste artigo são de responsabilidade exclusiva do autor, não refletindo necessariamente a opinião institucional da FGV.
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