A chegada do tsunami

Combinação de choques inflacionários e desinflacionários do tarifaço de Donald Trump torna muito difícil prever efeitos finais na economia global. Mundo está em compasso de espera, assistindo o desenrolar da guerra comercial.
No dia 2 de abril, que o presidente americano Donald Trump chamou de liberation day, ele anunciou tarifas comerciais “recíprocas”. Em um evento ao ar livre, contando com a participação de um trabalhador de chão de fábrica, Trump anunciou uma brutal elevação das tarifas de importação.
Essa tarifa seria o máximo entre dois números: ou 10% ou metade do saldo da balança comercial de bens sobre as importações de bens. Países com os quais os EUA têm uma balança comercial de bens equilibrada, superavitária ou levemente deficitária, caíram na tarifa de 10%. Para os demais países a alíquota de importação foi maior e, em particular, para os países asiáticos a tarifa foi bem maior. Nesse contexto, se destacam as tarifas de 34% atribuídas à China, de 20% à Zona do Euro, 32% a Taiwan, 27% à Índia, 24% ao Japão e 46% ao Vietnã, além de diversos outros países. Os países latino-americanos foram majoritariamente enquadrados na alíquota base de 10%, enquanto México e Canadá foram isentos do novo plano tarifário, preservando o acordo do USMCA. Impressionou a todos o amadorismo da fórmula. Não há base conceitual e analítica para a regra empregada. A impressão que se tem é que a maior e mais importante economia do mundo tem amadores no timão da política econômica. O secretário do Tesouro, Scott Bessent, se adiantou e avisou que não tinha participado dos cálculos das tarifas recíprocas.
A China respondeu com tarifas de 34% sobre todas as importações de bens originários dos EUA. A resposta americana elevou ainda mais o tom da disputa, e a escalada tarifária chegou à imposição de tarifas de 145% sobre produtos chineses, o que levou Pequim a retaliar com tarifas de 125% sobre as exportações americanas.
Os mercados reagiram muito mal. Trump deve ter sentido que a guerra comercial jogava o mundo inteiro no colo da China e isolava os EUA. Trump, decidiu, consequentemente, manter as tarifas chinesas e, por 90 dias, adotou tarifas de 10% para os demais. A situação ao fechamento deste Boletim é a seguinte: (i) tarifas universais de 10% sobre a maioria dos países (exceto China, México e Canadá); (ii) tarifas setoriais de 25% sobre aço, alumínio, automóveis e autopeças; (iii) tarifas de 20% para a União Europeia (o Reino Unido ficou na alíquota reduzida de 10%); (iv) tarifa de 25% sobre todos os bens provenientes do México e do Canadá que não cumprem os critérios do USMCA (United States-México-Canada Agreement); e tarifas de 145% sobre os produtos chineses (com a retaliação da China, que colocou 125% nas importações americanas). O governo Trump também decidiu isentar das tarifas recíprocas produtos eletrônicos como computadores, celulares e semicondutores
É muito difícil fazermos hoje qualquer prognóstico. A guerra tarifária não terminou, não sabemos o desenho final, e há dificuldades, mesmo com o atual desenho, de sabemos todos os impactos. O mais difícil é avaliarmos a transição para um novo equilíbrio. Se as alíquotas do comércio bilateral EUA-China forem mantidas, será o fim do comércio bilateral. Haverá uma separação total dos dois territórios.
A fortíssima elevação da incerteza deverá reduzir o investimento mundo afora, o que caracteriza um choque desinflacionário. Por outro lado, a desorganização das cadeias produtivas representa um choque inflacionário. Finalmente, o forte desvio de comércio gerará pressões inflacionárias e desinflacionárias caso a caso. Por exemplo, o excedente exportável de bens chinês gerará pressão desinflacionária no mundo, em particular no Brasil. Por outro lado, a redução da demanda chinesa por grãos americanos gerará uma pressão inflacionária por nossas commodities. A inflação de alimentos por aqui deve ser maior.
A incerteza é tão elevada que a ótima leitura do índice de inflação ao consumidor americano, conhecido por CPI, de março, não alterou muito os preços de mercado. O mundo está em compasso de espera, assistindo o desenrolar da guerra comercial liderada por Trump.
Este a a Seção Internacional do Boletim Macro FGV IBRE de abril de 2025.
As opiniões expressas neste artigo são de responsabilidade exclusiva dos autores, não refletindo necessariamente a opinião institucional da FGV.
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