Como aumentar a efetividade de políticas de apoio a empresas?
Estudos mostram que inovações institucionais adotadas recentemente em outros países podem dar uma contribuição importante para a redução do impacto fiscal e o aumento da efetividade das políticas de apoio a empresas no Brasil.
O anúncio da nova política industrial estimulou um debate intenso sobre o tema. Na última coluna, discuti alguns aspectos da política que me parecem equivocados, como o foco na indústria, a ênfase em conteúdo local e o uso de incentivos para firmas e atividades específicas, que tendem a reforçar a má alocação de recursos que é uma causa fundamental de nossa baixa produtividade.
Nesta coluna vou discutir em mais detalhe minha última crítica, que diz respeito à ausência de um arcabouço baseado em metas claras, monitoramento e avaliação de impacto, o que tende a fazer com que políticas ineficazes continuem a ser adotadas indefinidamente.
Entre o início dos anos 2000 e meados da década passada, o governo federal implementou um amplo conjunto de políticas de apoio a empresas, além de ter expandido programas já existentes. Dois estudos abrangentes sobre esses programas merecem ser revisitados, para que suas lições possam contribuir para que a nova política industrial seja mais efetiva e menos custosa.
Um relatório do Banco Mundial (“Business Support Policies: Large Spending, Little Impact”) analisou as políticas de apoio a empresas no Brasil, tanto no que diz respeito ao seu impacto fiscal como seus efeitos sobre a produtividade, emprego e outros indicadores de desempenho. Segundo o relatório, os gastos federais com políticas de apoio a empresas no Brasil mais do que dobraram em termos reais entre 2006 e 2015, saltando de 3,0% para 4,5% do PIB ao longo do período.
Os gastos tributários foram o componente mais importante, tendo atingido 2,9% do PIB em 2015. A segunda maior categoria abrangeu os subsídios creditícios, que atingiram 1,3% do PIB em 2015. A terceira categoria de políticas de apoio a empresas consiste em gastos diretos, com menor peso no total de despesas.
Os diversos estudos analisados no relatório do Banco Mundial mostram que, de modo geral, as políticas de apoio a empresas não contribuíram para o aumento da produtividade e tiveram pouco efeito em outros indicadores de desempenho das empresas, como o nível de emprego. Além disso, o impacto fiscal foi elevado, o que indica uma relação custo/benefício bastante desfavorável.
Um relatório do BID (“Assessing Firm-Support Programs in Brazil”) analisou vários programas de apoio a empresas na modalidade de políticas de desenvolvimento produtivo (PDP). Os PDPs abrangem várias áreas, como crédito, consultoria, cadeia de valor, promoção de exportações e inovação. Esses programas tiveram grande expansão desde meados da década de 2000, especialmente depois da crise financeira internacional de 2008-2009.
O estudo do BID fez uma avaliação de PDPs do governo federal. Nove agências e instituições estabeleceram parcerias com o Office of Evaluation and Oversight (OVE) para conduzir uma avaliação de impacto de seis programas, abrangendo mais de 600.000 firmas durante o período 2002-2012.
Os resultados econométricos indicam que, de modo geral, os efeitos sobre a produtividade das firmas não foram estatisticamente significantes e, nos poucos casos de impacto positivo, a magnitude não foi muito expressiva. Também foram encontradas poucas evidências de efeitos positivos em outras medidas de desempenho das firmas, como nível de emprego.
Além do baixo efeito direto na produtividade das firmas, programas de apoio a empresas podem estar contribuindo para distorcer a alocação dos recursos produtivos na economia brasileira. De fato, o estudo do BID mostra que empresas beneficiadas tendem a permanecer mais tempo no mercado. Isso não é algo necessariamente positivo, já que empresas menos eficientes podem estar sendo favorecidas, com efeitos deletérios sobre a produtividade agregada.
Essas evidências mostram que é preciso rever o arcabouço de políticas de apoio a empresas no país de modo a reduzir seu ônus fiscal e elevar sua eficácia. Embora os detalhes mereçam uma discussão aprofundada, alguns princípios deveriam ser incorporados ao processo de concessão e avaliação de incentivos por parte do governo federal e dos entes subnacionais.
Em primeiro lugar, a concessão ou renovação de qualquer incentivo deveria especificar os objetivos da política e estabelecer metas de desempenho a serem alcançadas ao longo do período de vigência do benefício. Além disso, é necessário especificar um conjunto de indicadores de desempenho, para fins de avaliação do cumprimento das metas e seu monitoramento ao longo do tempo.
Também deve ser estabelecido um prazo para cada benefício concedido e sua renovação deve estar condicionada ao cumprimento das metas estabelecidas no momento de sua concessão. A ideia é inverter o ônus da prova, de modo que somente políticas com eficácia comprovada sejam renovadas, ao contrário do padrão atual no Brasil, em que incentivos permanecem por décadas, sem qualquer evidência de efetividade.
Outro grave problema do arcabouço existente de apoio a empresas no Brasil é sua enorme fragmentação, com atuação de diversos ministérios e agências, e nenhuma instância de coordenação. Portanto, seria importante criar um mecanismo institucional para a coordenação das políticas de aumento da produtividade.
Inspirados no modelo implementado na Austrália no final da década de 1990, vários países criaram Comissões de Produtividade nos últimos anos, que consistem em arranjos institucionais que buscam reduzir os problemas de coordenação inerentes à implementação de reformas do ambiente de negócios, além de propor e avaliar políticas voltadas para o aumento da produtividade.
Em resumo, existem várias inovações institucionais adotadas em outros países que, mediante cuidadosa implementação, podem dar uma contribuição importante para a redução do ônus fiscal e o aumento da efetividade das políticas de apoio a empresas no Brasil.
As opiniões expressas neste artigo são de responsabilidade exclusiva do autor, não refletindo necessariamente a opinião institucional da FGV.
Este artigo foi originalmente publicado pelo Broadcast da Agência Estado em 16/02/2024.
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