Macroeconomia

Comportamento dos consumidores no pós pandemia e as perspectivas para o turismo

6 ago 2021

Consumidores de classe mais alta de renda pretendem aumentar gastos com viagens, transporte, restaurantes, cinema e atividades sociais após maioria dos brasileiros estarem vacinados contra Covid-19, enquanto os mais pobres têm intenção de aumentar o consumo de alimentos.

Com a chegada da pandemia de covid-19 ao Brasil, em fevereiro de 2020, grande parte da população brasileira tornou-se mais avessa a riscos, não apenas àqueles relacionados à saúde, mas também aos que possam afetar as finanças familiares. Essa maior aversão a riscos foi observada de forma mais pronunciada no 2º trimestre de 2020, durante a primeira onda, mas persiste ainda hoje, como se observa pela cautela do consumidor em realizar novas compras discricionárias de bens e serviços, o que vem limitando o crescimento diante de um cenário mais favorável a partir do avanço do programa de vacinação no Brasil.

Richard Curtin (2020)[1], estudioso do comportamento do consumidor, sugere que, em condições normais, as preferências preexistentes dos consumidores determinariam suas decisões econômicas uma vez que os altos riscos desapareçam. Mas alerta que não podemos esquecer de como as emoções modelam esse comportamento e interferem em nossas decisões, principalmente em eventos que não têm bases de comparação anterior.

A ameaça do vírus à saúde e às finanças afetaram as decisões dos agentes econômicos e seu bem-estar. Por isso, a resposta intuitiva foi previsível: as pessoas evitaram locais e serviços com maior circulação de pessoas e passaram a poupar de forma precaucional diante da maior probabilidade de perda do emprego ou de redução da renda.

Ao longo da pandemia, o humor dos consumidores não vem se recuperando na mesma velocidade das empresas. Ainda que tenha havido melhora das vendas de bens no ano passado, o segmento de serviços, principalmente os prestados às famílias, foi bastante prejudicado.

Nos últimos quatro meses, o humor dos consumidores melhorou, o que é um sinal favorável, principalmente no que diz respeito ao seu comportamento daqui para frente. Mas será que tendência de consumo de serviços voltará ao nível anterior à pandemia?

Quesitos especiais incluídos na Sondagem do Consumidor vêm tentando mapear esse comportamento e a tendência para os próximos meses. Questionados sobre o comportamento do consumo, consumidores das classes mais altas de renda pretendem aumentar seus gastos com viagens, transporte, restaurantes, cinema e atividades sociais após a maioria dos brasileiros estarem vacinados contra a covid-19, enquanto os mais pobres têm intenção de aumentar o consumo de alimentos.

A proporção das famílias com maior poder aquisitivo que pretendem aumentar os gastos com lazer chega a 70%. Tal comportamento, contudo não é o mesmo para famílias com renda mais baixa, que continuam priorizando o aumento do consumo de alimentos, que acabou sendo reduzido pelo aumento dos preços e maior endividamento das famílias.

Gráfico 1 - Saldo da intenção de consumo após maioria da população vacinada

A proporção de consumidores que voltaria a frequentar sem restrição ou com cautela vem aumentando nos últimos meses. Isso está relacionado ao avanço da vacinação, que traz uma sensação de maior segurança para famílias. Shopping centers e bares e restaurantes são os locais com maior intenção de frequência dos consumidores. Chama atenção, que entre janeiro e junho desse ano, houve um avanço de 12,6 pontos percentuais na proporção de pessoas que têm intenção de viajar de férias para hotéis e pousadas e 6 p.p. em viagens de avião ou ônibus, o que confirma o maior otimismo para viagens no segundo semestre. Em direção oposta, os shows têm a menor proporção de consumidores com intenção de frequência: apenas 29,5%.

O perfil desses consumidores mais propensos ao retorno da frequência em locais de lazer é o de renda mais alta, pessoas que conseguiram poupar de forma precaucional, e não as famílias de menor renda, que estão mais endividadas e sofrendo com o desemprego e carestia.

Tabela 1 – Intenção de frequência dos consumidores em alguns locais (em %)

Locais

Proporção de consumidores que voltaria a frequentar sem restrição ou com cautela

out/20

jan/21

jun/21

Diferença entre jun e jan

Shopping Centers

60,9

65,2

65,2

0

Bares e Restaurantes

54,1

58,4

64,4

6

Viajar de férias (hotéis e pousadas)

NA

51

63,6

12,6

Viajar de férias (avião ou ônibus)

47,8

52,8

58,8

6

Praia

NA

54,2

58,7

4,5

Cinema/teatro

27,0

46,4

45,2

-1,2

Shows

NA

27,2

29,5

2,3

As informações disponíveis das vacinas, o avanço do programa de imunização e do aprendizado diante dos mais de 500 dias de pandemia parecem ter transformado o humor dos consumidores e como as informações são percebidas.

Pela ótica das empresas de serviços, principalmente os serviços prestados às famílias, que mais sofreram na pandemia, as perspectivas positivas de retomada vêm gerando aumento do otimismo pelos empresários.

Uma saída especial das sondagens para observar os segmentos relacionados ao setor de turismo mostra que as expectativas que vinham girando em torno dos 90 pontos, caiu em março e abril, subindo para 112,0 pontos em julho, o maior patamar desde fevereiro de 2013 (112,3).

Os empresários projetam um aumento de demanda e fazem melhores projeções sobre a tendência dos negócios que parecem estar relacionadas com o retorno dos consumidores ao consumo maior de serviços do que de bens e principalmente uma tendência maior ao lazer depois de tanto tempo restrito.

Gráfico 2 – Confiança de segmentos do setor de serviços ligados ao Turismo

Os bons ventos parecem estar mudando o comportamento dos consumidores novamente e trazem ânimo para o segmento de serviços prestados às famílias, principalmente os relacionados com turismo e lazer. Há de se lembrar, contudo, que a nova cepa (variante Delta) consiste em um risco expressivo – que não deve ser ignorado – a esse cenário.

As perspectivas mais otimistas dependerão, claro, da continuidade do processo de imunização, do controle das novas cepas, e a flexibilização gradual das medidas restritivas que permitirá, para muitos consumidores, o retorno à normalidade em relação às atividades relacionadas ao lazer e turismo.


As opiniões expressas neste artigo são de responsabilidade exclusiva da autora, não refletindo necessariamente a opinião institucional da FGV.

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Camila Fortunato
Camila Fortunato
Viviane Seda

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