Cenários

A economia em 2024

26 mar 2025

Temos um crescimento que foi liderado pela demanda em uma economia que opera a plena carga. Evidentemente, a inflação encontra-se muito elevada. Em 2025, esperamos que as políticas monetária e fiscal estejam mais sincronizadas.

Em 7/3, sexta-feira, o IBGE divulgou o desempenho da economia brasileira no quarto trimestre de 2024. A economia cresceu 0,2% ante o terceiro trimestre. Houve uma sensível desaceleração com relação ao desempenho nos três primeiros trimestres do ano, quando a média das taxas de crescimento foi de 1%.

A surpresa negativa no quarto trimestre foi em consumo das famílias: o boletim macroeconômico do FGV IBRE esperava um crescimento de 0% e o resultado foi de queda de 1%. A mesma surpresa ocorre quando olhamos os números do quarto trimestre em comparação ao quarto trimestre de 2023. O FGV IBRE esperava crescimento do consumo das famílias de 5% e o número divulgado foi 3,7%, 1,3 ponto percentual menor. Aparentemente, iniciou-se um ajuste no consumo das famílias, que provavelmente veio, ao menos em parte, de um aumento da poupança das famílias. A poupança agregada no quarto trimestre elevou-se em 0,5% do PIB, em comparação ao terceiro trimestre. Se a elevação foi integralmente na poupança das famílias, este fato explicaria 0,8 ponto percentual da queda de 1% do consumo das famílias. Talvez esteja começando a aparecer uma maior cautela das famílias.

Pela ótica da oferta, houve surpresa negativa na agropecuária, queda de 2,3% ante expectativa de 0%, na comparação com o terceiro trimestre; e de serviços, crescimento de 0,1% ante 0,6% da expectativa do FGV IBRE. Em particular, houve forte surpresa negativa na intermediação financeira: queda de 0,3% ante 1,3% de crescimento esperado; e no varejo, crescimento de 0,3%, ante 1% de expectativa. Talvez o ciclo de alta da taxa básica de juros esteja começando a afetar o crédito. Finalmente, outros serviços recuaram 0,1%, um pouco melhor somente do que o recuo projetado de 0,2%. Tomando-se esses números como um todo, aparentemente a tão esperada desaceleração da economia chegou.

A desaceleração fica mais clara quando consideramos o PIB do quarto trimestre de 2024 em comparação ao do segundo trimestre; e o do segundo trimestre de 2024 em comparação ao do quarto trimestre de 2023. Fica clara a desaceleração entre o período 4º tri 2023 - 2ºtri 2024, com alta de 2,3%; e o período 2º tri-4º tri 2024, com elevação de 0,9%.

Quando olhamos 2024 fechado, a natureza do crescimento, em comparação com 2023, é totalmente diferente. Vale separar a economia a componente cíclica, aquela que responde à política econômica, da componente exógena. Esta segunda é formada por indústria extrativa mineral, agropecuária, aluguéis e serviços da administração pública. Em 2023, a componente cíclica cresceu 2,1%, e a exógena, 5,8% – esta última em função do forte desempenho da agropecuária, que cresceu 16,3%, e da indústria extrativa mineral, que cresceu 9,2%. Em 2024, a componente cíclica cresceu 4,4% e a componente exógena cresceu 1,1%. Ou seja, a parcela da economia que responde à política econômica acelerou de 2,1% em 2023 para 4,4% em 2024. De fato, a demanda interna privada cresceu 5,3% em 2024, acelerando muito do 1,9% de 2023. O mesmo ocorreu com a demanda interna, que acelerou de 2,2% em 2023 para 4,7% em 2024.

O crescimento da demanda interna muito maior do que o da economia tem como efeito colateral a forte queda das exportações líquidas. Aos preços de 1995, a queda foi de 1,5 ponto percentual do PIB, saindo de 1,5% do PIB em 2023 para 0% do PIB em 2024. Outra forma de evidenciar o mesmo fato é, a partir das Contas Econômicas Integradas, calcular a taxa de poupança e a taxa de investimento, tomando como base a renda nacional e não o PIB. A renda nacional retira do PIB a parcela deste que é remuneração de investimentos de não residentes. Em 2023, a taxa de poupança foi de 15,5% da renda nacional e o investimento foi de 16,3%. A necessidade de financiamento foi de 0,8% do PIB. Os mesmos números para 2024 foram respectivamente 14,9% e 17,4%, gerando uma necessidade de financiamento de 2,5% da renda nacional.

Ou seja, temos um crescimento que foi liderado pela demanda em uma economia que opera a plena carga. Evidentemente, a inflação encontra-se muito elevada. Em 2024, o IPCA fechou em 4,8%, bem acima dos 3,9%, o valor esperado pela pesquisa Focus no final de 2023 para a inflação de 2024.

Em 2025, esperamos que as políticas monetária e fiscal estejam mais sincronizadas. A componente cíclica deverá desacelerar para algo entre 1% e 1,5% e, em função da boa safra e do bom desempenho da produção de petróleo do pré-sal, a componente exógena deve acelerar para 3,2% aproximadamente. O crescimento da economia em 2025 deverá ser ao redor de 2%.

A grande dúvida, como tenho escrito em meus artigos, é se o presidente Lula aceitará a desaceleração com seus impactos ruins sobre o emprego – mas impactos positivos sobre a inflação – para chegar melhor em meados de 2026; ou se logo começará a apertar os botões para estimular a economia e neutralizar o combate à inflação.


Esta é a coluna Ponto de Vista, da Conjuntura Econômica, de março/2025.

As opiniões expressas neste artigo são de responsabilidade exclusiva do autor, não refletindo necessariamente a opinião institucional da FGV. 

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