Pré-COPOM (nov/24): Mais rápido, mais alto, insuficiente
BC deve elevar Selic para 11,25% hoje, acelerando ritmo de alta para 50bps. Taxa terminal deve atingir 12,50% no 1º tri de 2025, nível insuficiente para garantir cumprimento da meta. Há pouco espaço para juros ainda mais altos.
Esperamos que o Banco Central eleve a taxa Selic em 50bps na sua reunião de novembro. Dando sequência ao processo de restrição, a autoridade monetária deve elevar novamente a taxa Selic em sua reunião de novembro, em ritmo mais intenso do que o realizado em setembro[1].
Desde a última reunião do COPOM, entendemos que houve uma inequívoca deterioração do cenário. A situação ficou mais delicada para a autoridade monetária, com uma piora do binômio atividade-inflação e sinais de que a convergência inflacionária, com as informações atuais, ficou mais distante. Há múltiplos fatores, alguns bem específicos, que tornam a avaliação do cenário sensivelmente mais complicada.
Houve uma brutal reavaliação da estimativa oficial para a ociosidade da economia. Na comunicação da última reunião do COPOM (Comunicado e Ata da reunião de setembro), o Banco Central definiu que o hiato do produto havia migrado para terreno positivo; ou seja, a economia operava acima da sua capacidade. Restava a quantificação, que veio no Relatório Trimestral de Inflação do 3º trimestre: ocorreu não somente uma relevante revisão do hiato recente (no 2º trimestre de 2024, a economia passou a operar 0,5p.p. acima do potencial), como também das estimativas históricas (agora, avalia-se que economia operou acima do potencial desde o 2º semestre de 2022).
Com hiato positivo, a condução da política monetária precisa ser repensada. Com as novas estimativas para o hiato do produto, chega-se à conclusão de que todo o ciclo recente de flexibilização monetária (de agosto de 2023 a maio de 2024) foi feito com a economia operando acima das suas possibilidades. Combinando isso a sucessivas rodadas de impulso fiscal e a uma inflação (corrente, projetada e esperada pelo mercado) acima da meta, fica difícil construir um cenário que não aponte para ampla revisão na estratégia monetária.
Para além das estimativas de hiato do produto, há inúmeros indicadores de uma economia sobreaquecida. Sempre se pode argumentar que o hiato do produto é variável não-observável, muito sensível a hipóteses de modelagem e sujeito a revisões históricas – o que, de fato, acaba de ocorrer. No entanto, há outros sinais de sobreaquecimento, emanando do mercado de trabalho (volumes e preços), da política fiscal e de descasamentos entre oferta e demanda na economia (o que se pode observar, por exemplo, na composição do PIB do 1º semestre de 2024).
Desde o último COPOM, os preços de ativos também pioraram sensivelmente. As inflações implícitas a mercado (nos títulos públicos indexados à inflação) e a taxa de câmbio tiveram desempenho desfavorável nos últimos 45 dias, colocando pressão adicional sobre o cenário prospectivo. Há um misto de questões domésticas (especialmente a desconfiança fiscal) e externas (como as eleições americanas e a geopolítica) em operação, conspirando para tornar o trabalho do Banco Central mais difícil.
O cenário externo piorou. A recente reavaliação do orçamento de cortes de juros nos Estados Unidos, bem menor do que o anteriormente suposto, e o fortalecimento do dólar americano colocam os países emergentes sob pressão. Riscos geopolíticos crescentes e a possibilidade de fragmentação comercial com um avanço do contencioso entre Estados Unidos e China tornam o cenário prospectivo mais arriscado – especialmente na inflação de bens.
A convergência da inflação doméstica segue muito desafiadora. Múltiplos choques negativos de oferta farão com a inflação de 2024 provavelmente termine o ano pouco abaixo de 5,0%. A inflação mais elevada tem efeitos na dinâmica prospectiva, em cenário de mercado de trabalho apertado, dissídios salariais reais superiores à variação da produtividade, inflação de serviços relativamente elevada e riscos crescentes para a inflação de bens (especialmente os tradables industriais). Em paralelo, há dúvidas sobre a intensidade da contração fiscal prometida pelo governo, especialmente se confirmada a expectativa de desaceleração do crescimento econômico nos próximos trimestres.
Não vemos outra opção que não seja uma aceleração do ritmo de elevação da taxa Selic – em meio a uma piora do cenário prospectivo. Na BRCG, esperamos que o Banco Central eleve os juros em 50bps na reunião de novembro, reconhecendo a piora do cenário corrente, do balanço de riscos e das suas projeções condicionais. No cenário de referência[2] (com Selic atingindo 12,50%a.a. em meados de 2025 e recuando até 11,50%a.a. ao final do ano), esperamos que a projeção oficial de IPCA seja de 3,4% no 2º trimestre de 2026 – ou seja, esse orçamento de juros não será suficiente para o cumprimento da meta no horizonte relevante.
Esperamos que o Banco Central sinalize a necessidade de mudanças no orçamento de juros do mercado – sem indicar, no entanto, como pretende fazê-lo. Tendo por princípio a manutenção da sinalização recente de cumprimento estrito da meta de inflação, a autoridade monetária terá duas opções: aumentar a taxa terminal e manter um ciclo de cortes relativamente rápido, ou manter a taxa terminal e suprimir os cortes esperados pelo mercado para a segunda metade do ano que vem. De uma forma ou de outra, o juro médio de 2025 precisará ser mais elevado do que o presente, atualmente, no cenário de referência. Para manter seus graus de liberdade e avaliar o desenrolar do cenário, não achamos que o Banco Central irá telegrafar os seus próximos passos, deixando todas as opções na mesa – nisso incluindo a possibilidade de novos ajustes, no futuro, do orçamento total e do ritmo de elevação da Selic.
Nosso cenário inflacionário é mais negativo que o oficial, vislumbrando um crescente desconforto para a autoridade monetária durante o ano que vem. Com Selic atingindo 12,50%a.a. até 1º trimestre de 2025, e sem cortes posteriores, os modelos da BRCG colocam o IPCA do 2º trimestre de 2026 em 3,9%. Não vemos espaço para que a Selic seja elevada ao nível que julgamos necessário para promover o cumprimento da meta no horizonte relevante, o que seria (bem) acima do pico mais recente dos juros, de 13,75%a.a. O discurso da autoridade monetária precisará mudar no decorrer de 2025, abandonando o cumprimento da meta e voltando à narrativa de convergência inflacionária, o que será um teste de fogo para a nova diretoria do Banco Central.
As opiniões expressas neste artigo são de responsabilidade exclusiva dos autores, não refletindo necessariamente a opinião institucional da FGV.
[1] Essa é uma versão modificada do artigo publicado como Destaque BRCG. Disponível em https://brcg.com.br/destaque-brcg/
[2] Tomando como referência a Pesquisa FOCUS de 01 de novembro de 2024.
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