Macroeconomia

A proposta do Senado para reduzir o spread bancário

18 dez 2018

Semana passada a Comissão de Assuntos Econômicos (CAE) do Senado aprovou um importante relatório do Grupo de Trabalho criado este ano para elaborar propostas de redução do spread bancário, coordenado pelo Senador Armando Monteiro. O foco do documento são os efeitos produzidos pelas inovações tecnológicas que induzam o aumento da competição no mercado financeiro.

O spread bancário médio no Brasil é de 22,7%, mas ele é muito mais elevado no segmento de recursos livres, alcançando 39,9%. Já o crédito direcionado, que inclui operações de financiamento subsidiado do BNDES para empresas, e do Banco do Brasil e Caixa Econômica Federal para os setores rural e imobiliário, é de apenas 3,7%.

As inovações tecnológicas podem reduzir os spreads bancários por diversos canais. Primeiro, permitem a redução dos custos administrativos e podem garantir maior eficiência nas transações financeiras. Segundo, por meio da queda da inadimplência, em função do fortalecimento do sistema de garantias permitido pelo seu compartilhamento eletrônico e da disponibilização de informações sobre o universo de clientes. Finalmente, as inovações permitem a entrada de novos players no mercado, aumentando a competição e induzindo uma diminuição das margens financeiras.

Nos últimos anos, as fintechs têm criado novos modelos de negócio, em áreas como conta corrente, cartão de crédito e débito, empréstimos pessoais e corporativos, pagamentos, investimentos, seguros e criptomoedas.

Segundo levantamento recente do BID, 58% das fintechs no Brasil empregam até 10 funcionários e somente 10% desses empreendimentos têm um quadro acima de 100 colaboradores. Portanto, as fintechs apresentam um modelo de negócios baseado em custos fixos menores, o que abre espaço para a prática de taxas de juros mais competitivas.

O surgimento de novas empresas no setor financeiro também propiciou a inclusão de pessoas até então sem acesso ao sistema bancário, por meio de prestação de serviços por meio de aparelhos móveis, evitando o enorme custo de entrada de capilaridade de agências físicas.

Segundo o relatório da CAE, a maior contribuição que o Poder Legislativo pode oferecer para resolver o problema de eventual uso de poder de mercado é criar mecanismos que estimulem a entrada de novos participantes, como fintechs, e que eliminem práticas anticompetitivas e outras barreiras à competição, sejam elas regulatórias ou de caráter legislativo.

Nesse sentido, são propostas várias medidas referentes ao funcionamento dos mercados de empréstimos e pagamentos, e pertinentes ao Congresso Nacional, Banco Central e CADE.

Dentre as recomendações para aumentar a competição no mercado de crédito, destaca-se a aprovação da nova Lei do Cadastro Positivo (PLP 414/2017), que pode permitir que fintechs tenham acesso a informações bancárias que atualmente são monopólio de poucas instituições financeiras, e desta forma possam oferecer condições de crédito mais vantajosas.

Outra proposta é eliminar a exigência de um decreto presidencial para instituições bancárias estrangeiras operarem no País. Um relatório ao PLS 102/2007, que busca atualizar a lei de regulamentação do sistema financeiro, foi apresentado na CAE e dispensa essa exigência.

O chamado open banking é um sistema de compartilhamento de informações bancárias que confere ao consumidor e não aos bancos o poder de decidir com quais instituições seus dados financeiros serão compartilhados. Seu principal pressuposto é que dados bancários são propriedade do consumidor e não dos bancos, o que está de acordo com a Lei de Proteção de Dados Pessoais (Lei 13709/2018), aprovada recentemente.

Na Europa está em vigor um sistema de open banking conhecido como PSD2. No Brasil, o Banco Central indicou que irá apresentar em breve uma proposta de open banking. A CAE sugere que o compartilhamento de informações não se limite a pagamentos, e seja estendido também a produtos de crédito, seguro e aplicações financeiras, a exemplo do modelo australiano.

No mercado de meios de pagamento, alguns grupos financeiros controlam todos os elos da cadeia de pagamentos: bandeira, emissão e credenciadora. O diagnóstico da CAE é de que a forte verticalização do setor cria grandes entraves à competição.

Além disso, problemas de governança do Sistema de Controle de Garantias (SCG) têm resultado em barreiras à entrada de novos players e dificultado o acesso ao crédito por parte de pequenas empresas. Isso ocorre especialmente por meio das chamadas travas bancárias, que travam os recebíveis de cartão de crédito mesmo quando estes excedem o valor da transação.

Para lidar com esses problemas, o Banco Central deveria criar um sistema de registro de recebíveis, acabando com a trava bancária e criando padrões de interoperabilidade para o compartilhamento de informações entre as registradoras. A Consulta Pública 68 representa um avanço nessa direção.

Um entrave adicional são barreiras à competição criadas por bancos de grande porte e suas credenciadoras. Desde abril de 2017, foram firmados pelo CADE 11 Termos de Compromisso de Cessação (TCCs) envolvendo as maiores instituições financeiras e suas controladas, para que sejam cessadas condutas danosas à competição no mercado de meios de pagamentos.

A recorrência de condutas anticompetitivas por parte de grupos verticalizados indica que os TCCs têm sido insuficientes para estimular a concorrência no setor de meios de pagamento.

Nesse sentido, a CAE propõe que o CADE considere a possibilidade de proibir que o mesmo grupo financeiro seja controlador de empresas que atuam em todos os elos do sistema de pagamentos: bandeira, emissão e credenciadora.

Em resumo, as recomendações do Senado oferecem uma importante contribuição para a agenda de estímulo à competição e redução dos spreads bancários, criando condições para que as inovações tecnológicas produzam seus efeitos de queda das taxas de juros.

Este artigo foi originalmente publicado pelo Broadcast da Agência Estado em 14/12/18.

As opiniões expressas neste artigo são de responsabilidade exclusiva do autor, não refletindo necessariamente a opinião institucional da FGV. 

 

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