Macroeconomia

Debate com o ex-governador Tarso Genro

16 abr 2021

No domingo 3 de abri escrevi uma coluna na Folha de São Paulo sobre a gestão do atual governador do Rio Grande do Sul, Eduardo Leite. Fiz uma crítica às gestões petistas no Estado. o ex-governador Tarso Genro respondeu-me na Folha no sábado, 9 de abril. Respondo a Tarso na coluna que sai na Folha de SP no domingo 18 de abril.

No início desta semana, recebi um e-mail de Darcy Francisco Carvalho dos Santos. Darcy é economista formado na UFRGS e que trabalhou como auditor externo do TCE e da secretaria da Fazenda, ambos do Rio Grande do Sul. É conselheiro do Corecon do RGS.

O texto de Darcy consiste numa análise minuciosa das contas públicas dos últimos governos gaúchos, bem como elabora outros pontos tratados por Tarso Genro.

Segue aos leitores do blog o texto que Darcy enviou-me.

Análise do texto do Sr. Tarso Genro em resposta à coluna de Samuel Pessôa

Darcy Francisco Carvalho dos Santos

Em recente resposta ao artigo de Samuel Pessoa com críticas à sua gestão como governador do Rio Grande do Sul – ambas as peças foram publicadas pela Folha de São Paulo –, o sr. Tarso Genro inicialmente faz uma referência a Thomas Piketty, economista francês, que foi capaz de ver o mundo de maneira mais generosa, segundo ele.

Pois é em Piketty, no seu livro O Capital no Século XXI, que buscamos uma das argumentações sobre a impossibilidade de proporcionar grande crescimento da folha de pagamento, como veremos adiante. Por que isso? Porque, não podemos aumentar a despesa acima do crescimento da receita. E este aumento da receita, salvo situações excepcionais,[1] depende do crescimento econômico. E o autor citado na referida obra, sobre crescimento econômico assim se expressa:

“O crescimento nos próximos séculos está claramente destinado a retomar patamares muito baixos, ao menos em relação ao componente demográfico” (Piketty, 2014, p.79).

...........................

“(...) é essencial começar recapitulando essa realidade, uma vez que continuamos, em grande medida impregnados pela ideia de que o crescimento deve ser de ao menos 3% ou 4% ao ano. Isso é uma ilusão, seja do ponto de vista histórico, seja do ponto de vista da lógica” (Piketty, 2014, p.98).

Ora, o PIB brasileiro, entre 2001 e 2018, cresceu em média 2,3%, sendo 1% decorrente do aumento da população e 1,3% da produção por habitante. Se tomarmos o RS, é ainda pior. PIB: 1,8%, sendo 0,6% para o aumento da população e 1,2% para a produção por habitante. E, em 2029, o crescimento populacional cessa, restando somente a produção por habitante (Dívida Pública e Previdência Social, p.318 e 319).

Por incrível que pareça, o crescimento real da despesa com pessoal no período do Sr. Tarso Genro foi, em média, de 6,1% ao ano, mais de duas vezes a variação média dos últimos três governos, que foi 2,9%, o triplo do crescimento médio do PIB,   e mais de 2,5 vezes o incremento real de RCL que foi de 2,4% (Dados retirados dos balanços do Estado do RS).

Criticar o gasto excessivo não é ser neoliberal. Pelo contrário, quando se cria despesa além da receita, se gera déficit, que se transforma em dívida, que gera juros. E, cada vez que se pagam juros, se reduzem os recursos que poderiam ser aplicados na área social. Aliás, é próprio da esquerda ignorar a restrição orçamentária dos governos, como se dinheiro desse em árvores ou caísse do céu, tal qual o orvalho numa noite estrelada.

A seguir o Sr. Tarso usa de uma meia verdade para dizer que o governo Leite não sucedeu o seu governo, mas sim o do governador Sartori, a quem acusa de ter feito a pior gestão financeira “neoliberal” da história gaúcha.

É claro que o governador Leite não sucedeu ao sr. Tarso, mas recebeu uma folha de pagamento inchada no período governamental deste, que concedeu altos reajustes salariais que iniciaram sua vigência em janeiro, maio e novembro de todos os anos durante todo o período seguinte, o do sr. Sartori. E esses reajustes tiveram uma consequência social, que vai além do financeiro, pois os cargos vagos de policiais militares aumentaram no seu período de 32,9% em 2012 para 42,5% em 2014, indo para 50,6% em 2017, só para dar um exemplo. Os demais cargos sofreram as mesmas consequências (Parecer Prévio do TCE-RS, no 2016 p.137 e ano 2017, p.134).

O sr. Tarso concedeu reajustes, alterou quadros de pessoal, provocando crescimentos da despesa em percentuais muito superiores ao do crescimento da receita corrente líquida e da inflação, conforme Tabela 1, a seguir.

Tabela 1. Crescimento da folha de pagamento do Estado, 2011-2018

 

Valores em R$ milhões nominais.

     

 

 

 

 

 

ANOS

DESPESA

CRESCIMENTO

   
 

COM PESSOAL

POR PERÍODO

RCLe  (*)

IPCA

 

 

GOVERNAMENTAL

 

 

2010

              13.432

 

        22.028

       3.114,50

2014

              21.611

                     8.179

        30.790

       3.953,15

2018

              29.215

                     7.604

        39.915

       5.025,99

CRESC.FOLHA

 

                   15.783

 

 

CRESC.% NOMINAL

 

 

 

2011-2014

61%

 

40%

26,9%

2015-2018

35%

 

30%

27,1%

2010-2018

117,5%

 

81,2%

61,4%

Fonte: Dados brutos dos balanços do Estado.

(*) RCL gerencial.

Nota: O crescimento do período 2015-2018 foi gerado no período anterior.

 
Entre 2011 e 2014, a inflação foi de 27%, a RCL cresceu 40% e a folha de pessoal, 61%. E o pior foi que os reajustes foram concedidos em grande parte para começarem a vigorar no período governamental seguinte, conforme já citado, fazendo com que nos oito anos a folha passasse de R$ 13,4 bilhões em 2010 para R$ 29,2 bilhões em 2018, sem que quase nada fosse concedido pelo governo Sartori.

E o pior de tudo é que foi criada despesa permanente sem a existência de receita com essa característica, ou seja, com receita finita. Para isso, ele usou o caixa único e os depósitos judiciais. Todos os governos fizeram uso desse artifício, mas com uma grande diferença: PAGAR DESPESAS EXISTENTES E NUNCA PARA CRIAR DESPESAS NOVAS, como fez o Sr. Tarso, num flagrante desrespeito à Lei de Responsabilidade Fiscal.

As tabelas 2 e 3 a seguir mostram os saques do caixa único e dos depósitos judiciais.

Quanto à Tabela 2, deve ser destacado que o governo Olívio inaugurou as retiradas do caixa único sem posterior devolução, o que se tornou praxe daí em diante. O governo Yeda só sacou no primeiro ano, já que começou sem as alíquotas majoradas do ICMS que cessaram em dezembro/2006. E, ainda, devolveu R$ 100 milhões em 2008, em valores da época.

Tabela 2. Saques do caixa único por período governamental
Em R$ mil correntes e constantes.

 

 

 

 

 

   

Valores

 

Período

Governo

Correntes

Constantes

%

1999-2002

Olívio

               1.728.728

         5.452.989

18,6%

2003-2006

Rigotto

               1.513.388

         3.219.521

11,0%

2007-2010

Yeda

               1.394.800

         2.728.941

9,3%

2011-2014

Tarso

               7.153.221

         9.938.305

33,9%

2015-2018

Sartori

               7.156.447

         7.995.336

27,3%

Total

 

             18.946.584

       29.335.091

100,0%

FONTE: Secretaria da Fazenda - RS. Balanços Gerais do Estado.

 

Tabela 3. Saques dos depósitos judiciais por governo
Em R$ mil correntes.

 

 

 

 

Período

Governo

Valor (*)

%

2003-2006

Rigotto

               1.427.999

13,4%

2007-2010

Yeda

                   615.001

5,8%

2011-2014

Tarso

               5.665.000

53,2%

2015-2018

Sartori

               2.943.000

27,6%

Total

 

             10.651.000

100,0%

Fonte:  Pareceres Prévios do TCE  e site da Sec. Fazenda.

Os valores não foram atualizados por ser referirem a períodos governamentais e não anos.

 

 

No período do Sr. Tarso, conforme já citado, foram criadas despesas novas de caráter continuado, para serem pagas com recursos do caixa único. O Governo Sartori não criou despesas novas, mas teve que suportar uma folha alta e crescente gerada no governo que lhe antecedeu. Além disso, pegou a recessão, que implicou um crescimento real médio da RCL de apenas 0,5% ao ano. Com isso, não conseguiu pagar as prestações da dívida resultantes do acordo de 2016, entrando com liminar no STF em julho/2017, que permanece em vigor até hoje.

A bem da verdade deve ser dito que a ASSEMBLEIA LEGISLATIVA aprovou por unanimidade os reajustes salariais do Governo Tarso Genro. Quanto ao Tribunal de Contas aprovar, ele aprova sempre, principalmente se o governo atendeu os interesses corporativos dos servidores.

Quanto ao governo Britto ter concedido reajustes e depois não os cumprir, é verdade, mas deve ser feito um acréscimo a essa afirmativa. Os governos seguintes (inclusive o do sr. Olívio) concederam novos reajustes sem revogar o parcelamento das leis não cumpridas, o que foi feito pelo governo Yeda, que sempre foi criticado pelo PT, pelo fato de ele não ter concedido reajustes, já que suas concessões eram para substituir o que fora revogado. A não revogação das leis que criaram os reajustes não cumpridos foi uma das causas dos precatórios. Mas não foi só essa.

As duas grandes causas dos precatórios do Estado foram os reajustes do Governo Britto, citados, e a pensão integral, aprovada pela Constituição de 1988, que muitos dos governadores aprovaram como constituintes e depois não quiseram ou não puderam cumpri-la.

Quanto ao Fundo de Previdência dos servidores, foram transferidos do regime em capitalização para o regime de repartição simples 17.000 servidores que estavam em benefício definido, que ingressaram entre 15/07/2011 e 16/08/2016 (data em que começa o regime complementar), porque as alíquotas de contribuição progressivas eram muito dispendiosas ao Estado, que não podia usufruir da contribuição dos servidores e, ainda, tinha que contribuir com igual importância ao plano. Segundo o governo estadual, esse valor era de R$ 1,8 bilhão (e não R$ 3 bilhões) e nada foi aplicado em vacinas (não houve compra de vacinas por nenhum ente subnacional, pelo menos, até agora). Foi apenas um ajuste para tornar a previdência estadual sem essa assimetria. Sobre esse assunto fiz um artigo na época. https://financasrs.com.br/2020/08/04/a-questao-do-projeto-que-transfere-r-18-bilhao-ao-tesouro/

De fato, houve um maior crescimento do PIB estadual que o nacional no governo Tarso, o que não quer dizer que decorreu de políticas locais. Se em outros governos o PIB cresceu menos, muitas vezes decorreram de secas, como foi o caso do governo Rigotto, que sofreu duas enormes estiagens.

Tabela 4. PIB-BR e PIB-RS, 2011-2014
Taxas de crescimento anual

 

 

 

ANOS

PIB-BR

PIB-RS

2011

3,97%

4,6%

2012

1,92%

-2,1%

2013

3,00%

8,5%

2014

0,50%

-0,3%

Cresc. Período

9,7%

10,8%

Média geométrica

2,30%

2,6%

Fonte: PIB-BR - IPEADATA, Acesso em 02/06/2018.

FEE-RS: PIB-RS. Acesso em 07/06/2014.

 

Mas se, de fato, foi por ação sua o crescimento do PIB estadual, foi também o governo que, depois do acordo de 1998, que mais endividou o Estado, com um crescimento real de 8,5% no saldo devedor da dívida, sem contar os saques do caixa único e dos depósitos judiciais, já tratados (Tabela 5).

Tabela 5. Saldo devedor da dívida no final de cada período governamental

Em valores constantes *

     

 

 

 

R$ mil.

Ano

Valores

Relativo

Variação

1970

              2.501.409

                  100,0

 

1974

              5.472.715

                  218,8

118,8%

1978

            10.018.711

                  400,5

83,1%

1982

            17.939.407

                  717,2

79,1%

1986

            24.907.369

                  995,7

38,8%

1990

            24.862.201

                  993,9

-0,2%

1994

            30.789.742

               1.230,9

23,8%

1998

            68.444.163

               2.736,2

122,3%

2002

            68.265.329

               2.729,1

-0,3%

2006

            69.521.225

               2.779,3

1,8%

2010

            68.832.209

               2.751,7

-1,0%

2014

            74.676.180

               2.985,4

8,5%

2018

            78.932.327

               3.155,5

5,7%

Variação 1970-1998

            65.942.754

2636,2%

12,5%

Variação 1999-2018

            10.488.163

15,3%

0,72%

Fonte: Tabela 1.

*IGP-DI.

   
 

Quanto à dívida com a União, de fato a primeira lei que modificou as condições contratuais existentes foi a Lei Complementar nº 148, de 25/11/2014, mas as mudanças definitivas só vieram com a LC n° 156, de 28 de dezembro de 2016 (governo Sartori), que estabeleceu as condições finais para o refinanciamento das dívidas. Foi um bom acordo que estabeleceu o pagamento das prestações de julho a dezembro de 2016 com 100% de desconto, reduziu os juros e alterou o indexador. As prestações posteriores concediam descontos decrescentes, aumentando o valor pago. O governo estadual conseguiu pagar somente até julho/2017.

E por que fez isso? Porque, mesmo sem pagar as prestações, continuou com déficit e atrasando a folha de pagamento, o que durou mais de 50 meses. Nada garante que não volte a atrasar.

Isso não decorreu da má gestão do governo Sartori, mas dos valores altos e crescentes da folha de pagamento que recebeu do governo Tarso e do baixo crescimento da arrecadação decorrente da crise nacional. Conforme já referido, o crescimento real da receita no governo Sartori foi de apenas 0,5% ao ano.

Despesas com educação

A Constituição Federal determina a aplicação de no mínimo 25% da RLIT (receita líquida de impostos e transferências) em MDE (educação), e a estadual, 35%. Nenhum governo cumpriu o dispositivo estadual. Já o federal todos cumpriram.

Na verdade, tanto o governo Tarso como o do sr. Olívio Dutra aplicaram um percentual maior em educação (Tabela 6).

O sr. Tarso diz que usou os depósitos judiciais em educação e saúde. Ora, no período 2011-2014, a RLIT total foi de R$ 86.593,1 milhões (Tabela 7). Como o seu governo aplicou 0,8% (30,6%-29,8%) a mais que o governo Sartori, isso representou R$ 692,7 milhões. Como a retirada dos depósitos judiciais foi de R$ 5.665 milhões, isso correspondeu a apenas 12,2 % dos depósitos judiciais.  Mais uma inverdade.

Tabela 6. Despesa com MDE, 1999-2018, em % da RLIT

 

 

 

 

     

Média por

Exercícios

Governo

MDE

Governo

1999

Olívio

35,00

 

2000

Olívio

33,30

 

2001

Olívio

32,00

 

2002

Olívio

33,40

33,4

2003

Rigotto

32,67

 

2004

Rigotto

32,60

 

2005

Rigotto

29,50

 

2006

Rigotto

31,20

31,5

2007

Yeda

30,23

 

2008

Yeda

25,57

 

2009

Yeda

27,67

 

2010

Yeda

26,99

27,6

2011

Tarso

28,31

 

2012

Tarso

29,96

 

2013

Tarso

31,18

 

2014

Tarso

32,79

30,6

2015

Sartori

33,68

 

2016

Sartori

29,28

 

2017

Sartori

28,92

 

2018

Sartori

27,26

29,8

       

Fonte: Balanços Gerais do Estado, até 2006. Após: TCE e RREOs.

 

Despesas com saúde

A Constituição Federal manda aplicar 12% da RLIT em saúde. O Governo Tarso aplicou uma média de 10,7% da RLIT, enquanto o governo Sartori aplicou 12,2%, portanto 1,5 pp a mais, o que representa, em relação à mesma RLIT, R$ 1.306,5 milhões (Tabela 7). Então, em saúde, a aplicação do governo Tarso foi menor que a do governo Sartori. Se o governo Tarso aplicou em educação R$ 692,7 milhões a mais do que o governo Sartori, este aplicou R$ 1.306,5 milhões a mais em saúde.

Por uma questão de honestidade, cabe destacar que as aplicações em saúde sempre tiveram os critérios alterados com o consentimento do Tribunal de Contas, porque a preocupação dos governos sempre foi no sentido de achar uma maneira de forjar o percentual constitucional, em vez de aplicar efetivamente em saúde. Os Governos assim procediam, devido ao grande déficit que enfrentavam.

Tabela 7. Aplicações em saúde pública no Estado RS. 2011-2018

Em milhões correntes e em % da RLIT

   

 

 

 

 

 

ANOS

 APLIC.SAÚDE

 RLIT

SAÚDE/RLIT

MÉDIA

2011

        1.509,2

             18.710,7

8,1%

 

2012

        1.955,6

             20.274,3

9,6%

 

2013

        2.844,4

             22.819,6

12,5%

 

2014

        3.152,4

             24.788,5

12,7%

10,7%

 

SOMA

             86.593,1

   

2015

        3.219,1

             26.256,7

12,3%

 

2016

        3.559,5

             29.176,4

12,2%

 

2017

        3.787,4

             30.841,6

12,3%

 

2018

        4.099,5

             33.634,3

12,2%

12,2%

 

 

 DIFERENÇA

 

1,5%

DIFERENÇA entre  2015-2018 e 2011-2014

          1.306,5

 

FONTE: Balanços do Estado do RS.

   
 

Precatórios e fornecedores

Não disponho dos dados pregressos de pagamento dos precatórios, mas todos os governos pagaram uma quantia significativa, até porque são obrigados a utilizar 1,5% da receita corrente líquida nesse objetivo (EC 62/2009). No RS há ainda um dispositivo estadual determinando a aplicação de mais 1,5% nos chamados RPVs, requisições de pequeno valor (Lei 13.756, de 15/07/2011). O mais importante dos precatórios são suas causas, já abordada no item que trata do governo Britto.

Quanto a fornecedores, os balanços não deixam claros os atrasos. O que sabemos é que sempre houve muito atraso. No governo Yeda, foi divulgado na época que se pagava em dia, conseguindo, por isso, melhores preços.

Para qualquer uns dos assuntos, o Aod Cunha (ex-secretário da Fazenda do Rio Grande do Sul) tem mais condições de explicar, porque foi agente desse processo à época.

Por fim, o Sr. Tarso gosta muito de rotular os que não concordam com ele de liberais ou de neoliberais. Se é para rotular, podemos rotulá-lo como seguidor da política econômica da ditadura militar, quando foram gerados déficits primários e orçamentários entre 1971-1986, numa média anual de 16%. Aliás, ele defende o mesmo modelo.

Resta agora dizer: “Com todo o respeito”, sr. Tarso: o senhor foi quem errou feio.

De fato, a política do Sr. Tarso Genro tem muito a ver com o peronismo. A frase abaixo é bem elucidativa do caso.

Meu caro amigo: dê ao povo tudo o que for possível. Quando lhe parece que você está dando muito, dê ainda mais. Você verá os resultados. Todos irão tentar lhe apavorar com o espectro do colapso econômico, mas tudo isso é uma mentira. Não há nada de mais elástico do que a economia.”

Juan Domingo Perón, em carta a Carlos Ibáñez, então presidente do Chile: citado em referência aos elementos culturais da economia por Roberto da Matta no seu livro Tocquevilleanas – notícias Da América. Rio de Janeiro, Rocco, 2008

Retirado de Giambiagi, Fabio e Pinheiro, Armando Castelar, em “Além da Euforia, p. 13.

Porto Alegre, 11 de abril de 2021.

EM TEMPO: Governo Eduardo Leite

Não fiz referência a ele, porque o sr. Tarso criticou o governo Sartori. No entanto, ele fez reformas que pareciam ser impossíveis de aprovação, como a da previdência e a dos quadros de pessoal, como a do magistério e a retirada das vantagens temporais dos demais que ainda recebiam. Ambas tornavam o crescimento vegetativo da folha igual ou maior que o crescimento da receita. Por exemplo, nos últimos 20 anos, entre 1998 e 2018, a RCL cresceu em média 3,3% e a despesa com pessoal, 3,2%. Com as reformas, em 2020 sobre 2019, em termos reais, a despesa com pessoal caiu 5,2%, enquanto a RCL cresceu 3,5%.

Os dois últimos governadores, embora tenham disputado o segundo turno da eleição, possuem as mesmas políticas reformistas, tanto que o atual governo está dando continuidade ao que foi feito no governo anterior.

É verdade que o governador vem tendo um pouco de sorte. O que a pandemia reduziu na arrecadação própria foi compensado com vantagem pelas transferências federais para esse fim. Concorreu para isso também o congelamento imposto pela LC 173/2020 e o crescimento da arrecadação do ICMS a partir de agosto/2020, provocado pela a inflação no atacado, entre outros fatores.

No entanto, restam dois grandes dilemas, que são a dívida com a União, que não vem sendo paga, mas que não recebe grandes reajustes, já que estão sendo feitos pela Selic, e o fato de ter que deixar de usar a despesa com inativo na comprovação da MDE.

O Regime de Recuperação Fiscal (RRF) é a única saída em troca do pagamento da dívida. Nos primeiros anos o pagamento é favorável, mas em 2031 a prestação atingirá R$ 5,6 bilhões anuais, ou R$ 470 milhões mensais, segundo cálculos próprios, sujeitos a enganos. Em relação à RCL, será 10%, decrescendo até 5,6% no final do contrato, em 2051. Poderá ser inferior se a Selic se mantiver baixa.

É algo possível de suportar, tendo em vista a redução do grande crescimento vegetativo da folha, mas necessitará de um crescimento real de 3% ou mais, o que não será fácil.

Um dos agravantes é o alto valor da folha da segurança pública, com tendência a crescimento, e pelas vantagens que os servidores receberam em relação aos demais nas aposentadorias: na Brigada Militar foi mantida a integralidade e paridade, ad infinitum, e nos demais órgãos civis para os que ingressaram até 2015. Esse fato impedirá uma maior redução nos incrementos reais da despesa com pessoal.

Parece que no RS, além da maioria formada na Assembleia e da capacidade de negociação do governador, houve o amadurecimento de uma ideia que há anos vinha sendo debatida, que era como acabar com a crise sem fim das finanças estaduais. Tanto a imprensa, como os políticos e a sociedade civil, foram ganhando consciência disso. Parece confirmar aquela frase de Victor Hugo de que nada é mais poderoso do que uma ideia cujo tempo chegou.

As opiniões expressas neste artigo são de responsabilidade exclusiva do autor do post e do autor das considerações nele transcritas, não refletindo a opinião institucional da FGV.


[1] No momento estamos vivendo esta excepcionalidade, porque o ICMS cresceu 22,2% em março/2021 e 10,6% no acumulado, sobre os mesmos períodos do ano passado. Isso decorreu da grande inflação nos preços por atacado, que entram com 60% na composição do IGP-DI, que variou 22,2% nos últimos doze meses. Isso, com o congelamento da despesa pela LC 173/2020, tem o peso de um crescimento real.

Comentários

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Eurico Dias
Jonas Carmelo
Darcy Francisco...

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