Produtividade

Crescimento da produtividade em 2023 parece ter sido temporário

30 set 2024

Os dados sugerem que ocorreu um aumento do nível e não uma aceleração duradoura do crescimento da produtividade. Caso isso se confirme, teria havido uma elevação temporária e não permanente do crescimento do PIB potencial.

Em coluna escrita no final de março, analisei em que medida o crescimento da produtividade da economia brasileira em 2023 teria sido temporário ou permanente (“O Crescimento da Produtividade em 2023 foi Temporário ou Permanente?”). Além das suas consequências para o crescimento econômico, a resposta tem implicações importantes para a condução da política monetária.

Como tem sido destacado em diversas atas do Copom, aumentos salariais superiores ao crescimento da produtividade podem resultar em pressões inflacionárias e, consequentemente, afetar a trajetória da taxa de juros. Naquela ocasião, a Selic ainda estava em queda, mas este mês o Banco Central iniciou um ciclo de alta que pode ser expressivo.

A possibilidade de a elevação da produtividade ter sido temporária deve-se ao fato de que o aumento de 1,9% da produtividade agregada por horas efetivas em 2023 resultou em grande medida do crescimento extraordinário da produtividade da agropecuária (21,1%). A produtividade da indústria cresceu 2% e o setor de serviços, que concentra cerca de 70% das horas trabalhadas, teve aumento de apenas 0,1%.

Por outro lado, a hipótese de ganhos permanentes de produtividade está relacionada aos possíveis efeitos das reformas implementadas desde 2016. Em particular, o forte crescimento das ocupações formais desde o final de 2021 contrasta fortemente com o padrão de aumento da informalidade observado entre 2017 e 2019. Na medida em que o setor formal é muito mais produtivo que o informal, isso poderia sinalizar ganhos de eficiência.

Com base nos dados do Observatório da Produtividade Regis Bonelli do FGV IBRE referentes aos dois primeiros trimestres de 2024, já temos algumas evidências sugestivas do que parece ter acontecido. No segundo trimestre de 2024, a produtividade por hora efetivamente trabalhada teve uma queda de 0,3% em comparação com o mesmo trimestre de 2023. Enquanto a produtividade por horas habituais teve uma pequena redução (-0,1%), a produtividade por população ocupada teve um leve aumento (0,1%) na mesma base de comparação.

Os dados com ajuste sazonal mostram que, após um aumento nos dois primeiros trimestres de 2023, as diferentes medidas de produtividade do trabalho ficaram praticamente estagnadas desde então, indicando uma perda de dinamismo nos quatro últimos trimestres.

Os indicadores de produtividade setorial ajudam a entender a trajetória da produtividade agregada. Considerando a medida por hora efetiva, a produtividade da agropecuária aumentou 2,3% no segundo trimestre de 2024 em comparação com o segundo trimestre do ano passado. No entanto, a indústria teve aumento bem menor (0,7%) e o setor de serviços teve queda de 0,8%.

Quando fazemos uma comparação setorial da variação de produtividade por hora efetiva entre o segundo trimestre de 2022 e o segundo trimestre de 2023, constatamos que o crescimento da produtividade da agropecuária foi muito maior (25,9%) e a indústria teve um aumento expressivo de 2,5%. Embora menor, o aumento de 0,7% da produtividade dos serviços contrasta fortemente com a queda que ocorreu este ano.

Esses dados sugerem que a elevação de produtividade do ano passado decorreu em grande medida do salto da produtividade da agropecuária nos dois primeiros trimestres. Como o crescimento da produtividade da agropecuária teve forte desaceleração desde então, a produtividade agregada perdeu dinamismo.

Em outras palavras, parece ter ocorrido apenas um aumento do nível e não uma aceleração duradoura do crescimento da produtividade. Caso isso se confirme, teria havido uma aceleração temporária do crescimento do PIB potencial, sem alteração de sua taxa de crescimento no médio e longo prazo.

Isso não significa que as reformas não possam vir a elevar a produtividade de forma mais duradoura. Como já discuti neste espaço, um estudo recente do FMI encontra um efeito positivo da reforma trabalhista sobre a produtividade total dos fatores (PTF) das empresas graças à redução da insegurança trabalhista. Além disso, estudos mostram que a reforma tributária pode aumentar de forma significativa a eficiência das empresas com a eliminação da cumulatividade na tributação e redução da heterogeneidade de alíquotas entre diferentes produtos e setores.

Para que esses ganhos de produtividade se materializem, o controle das contas públicas é um pré-requisito fundamental. No entanto, diante da falta de esforço do governo para controlar a expansão dos gastos e das dificuldades de obter novas receitas, o risco de descontrole da dívida pública voltou à tona, o que pode colocar em risco a recuperação do investimento e o processo de formalização em curso. Seria mais uma oportunidade desperdiçada de superarmos a trajetória de baixo crescimento.


As opiniões expressas neste artigo são de responsabilidade exclusiva do autor, não refletindo necessariamente a opinião institucional da FGV. 

Este artigo foi originalmente publicado pelo Broadcast da Agência Estado em 27/09/2024.

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