2025: um ano de grandes desafios
Novamente estamos perdendo uma oportunidade por falta de sustentabilidade fiscal. Menor crescimento em 2025 e juros bem mais elevados vão aumentar o déficit nominal e tornar a dinâmica da dívida pública mais insustentável.
O ano de 2024 foi marcado pela queda do preço dos ativos brasileiros, em grande parte refletindo o aumento do prêmio de risco doméstico. Em particular, desde as mudanças das metas de resultado primário a partir de 2025, bem como das exclusões de certos gastos do cômputo das contas públicas, para fins de cumprimento das regras fiscais, o risco país foi se descolando do risco médio de países emergentes denominados “high yield”.[1]
E esse descolamento foi se intensificando conforme piorava a percepção sobre a situação fiscal do país. O pacote apresentado em novembro de 2024 não mudou esse quadro, contendo poucas mudanças estruturais, algumas das quais parcialmente desidratadas pelo Congresso. Em vez de reverter a situação, serviu apenas para reforçar o diagnóstico de que a dívida pública não deve se estabilizar nos próximos anos. Consequentemente, o próprio arcabouço foi perdendo credibilidade: não apenas será difícil que venha a ser cumprido inteiramente nos próximos anos, mas, mesmo que seja, isso será insuficiente para produzir trajetórias fiscais sustentáveis ao longo dos próximos anos.
Desde 2013, com exceção do ano de 2015, o déficit estrutural do Governo Central (governo federal e Banco Central) tem sido negativo[2]. Em 2023, o déficit estrutural do Governo Central chegou a -2,0% do PIB potencial, de acordo com as novas estimativas da Secretaria de Política Econômica, apresentando elevação de 1,18 p.p. em relação ao ano anterior, dados os efeitos da ampliação de despesas promovida pela PEC da Transição, aprovada no final de 2022. Concomitantemente, após vários anos de superávit estrutural dos Governos Regionais, estes passaram a contribuir negativamente para o resultado consolidado.
A prévia de 2024, que cobre até o terceiro trimestre do ano, mostra certa redução do déficit primário estrutural – portanto, uma orientação de consolidação. Observa-se, porém, que o resultado primário estrutural do Setor Público Consolidado ainda ficou em -1,41% do PIB potencial, do qual -1,16% se refere ao Governo Central, -0,16% a Estados e Municípios, e -0,09% às Estatais. Assim, mesmo com a redução do déficit do Governo Federal, este seguiu estimulando a demanda doméstica, efeito ao qual se somaram, em 2024, os mais de R$ 90 bilhões de gastos com precatórios, que foram contabilizados no final de 2023, mas tiveram impacto na economia no ano passado.
Em suma, tivemos nos últimos dois anos uma postura fiscal fortemente expansionista, contribuindo para que a economia operasse acima do seu potencial. Consequentemente, os riscos inflacionários se elevaram, pressionando não apenas a inflação corrente, como também as expectativas para os próximos anos. Em particular, o Relatório Focus de 13 de janeiro mostrou uma expectativa de inflação em torno de 4% para 2026 e 2027, e de 3,56% para 2028, ou seja, bem acima da meta de 3%.
E nesse contexto doméstico desafiador que observamos os ventos externos mudarem fortemente, para pior, em relação à nossa perspectiva, nos últimos meses. Nos EUA, a atividade e a inflação continuaram resilientes. Com isso, como destacado na seção internacional, em dezembro, após redução de 0,25 p.p. na taxa de juros, o banco central americano definiu que “o timing e a extensão” de ajustes adicionais na taxa de juros dependeriam da evolução dos dados, da avaliação do cenário e do balanço de riscos. Além disso, apontou que o cenário deve ser revisto “em função das políticas implementadas por Trump, da reação global a elas e da intensidade dos seus efeitos sobre o equilíbrio macroeconômico. Eventuais cortes adicionais da Fed Fund serão espaçados e, provavelmente, parcos.”
Devido a essa combinação de fatores tanto domésticos quanto externos, a taxa de juros de mercado, medida pelo Swap-360, passou de um valor nominal em torno de 11% em junho de 2024 para 15% em dezembro passado. Em termos reais, foi de 7,0% para 9,6% (média mensal de dezembro), superando o pico anterior, de setembro de 2015, de 8,9%.
Sem dúvida, a piora das condições financeiras cobra o seu preço e setores mais dependentes de crédito devem desacelerar expressivamente ao longo deste ano.
Dados do quarto trimestre mostram sinais de moderação do crescimento, de forma que esperamos um crescimento de 0,7% em relação ao terceiro trimestre e de 4,4% na comparação com o quarto trimestre de 2023. Para 2025 como um todo, projetamos crescimento de 1,8%, metade dos 3,6% estimados para 2024. Adicionalmente, esperamos que setores exógenos ganhem força, como a agropecuária, impulsionada por condições climáticas favoráveis, e a indústria extrativa, devido à inauguração de novas plataformas de petróleo Com isso, esperamos que, em 2025, os setores exógenos contribuam com 0,7 p.p. para o crescimento anual, o que representa um aumento moderado em relação a 2024, quando deram contribuição estimada em 0,4 p.p. Concomitantemente, prevemos que, em 2025, os setores cíclicos contribuam com 1,1 p.p. para o crescimento anual, o que representaria uma forte desaceleração em relação a 2024, quando deram contribuição estimada em 3,2 p.p.
O menor crescimento econômico e a taxa de juros bem mais elevada vão contribuir para aumentar o déficit nominal e tornar a dinâmica da dívida pública mais insustentável. Esperamos que a dívida bruta atinja 82% do PIB este ano e 86% no ano que vem. É importante destacar que tanto a dívida bruta quanto a dívida líquida devem acelerar: esperamos que esta supere 70% do PIB em 2026.
De acordo com estudo recente do Itaú-BBA [3] e previsões do FMI, a expectativa é um aumento da diferença entre a dívida do Brasil e aquela dos demais países emergentes e da OCDE. Adicionalmente, a trajetória também é divergente em relação àquela de outros países de rating semelhante, de acordo com a metodologia do S&P. Ou seja, tudo indica que ficaremos a uma distância ainda maior da retomada do grau de investimento, que seria um grande benefício para o Brasil, com redução de custo de financiamento público e privado.
Novamente estamos perdendo uma oportunidade. Para assegurarmos uma taxa de crescimento mais elevada, desemprego e inflação baixos, e com ganhos de produtividade, é necessário haver sustentabilidade fiscal. Isso não é novidade: ao longo desses anos, e de 2024, em particular, muito se alertou para isso, e para o risco de que o país caminhe para uma situação de dominância fiscal. O que, porém, não se mostrou suficiente para que se adotassem medidas que mudassem o rumo de deterioração das contas públicas. Conseguir mudar essa atitude é o grande desafio para 2025.
Este é o Sumário do Boletim Macro FGV IBRE de janeiro de 2025.
As opiniões expressas neste artigo são de responsabilidade exclusiva dos autores, não refletindo necessariamente a opinião institucional da FGV.
[1] High yield (“alto rendimento”, em tradução para o português) é um termo utilizado no mercado financeiro para classificar papéis de renda fixa que pagam taxas de juros consideravelmente mais altas que a média, de forma a compensar baixas notas de crédito (rating).
[2] A Secretaria de Política Econômica divulgou uma atualização do Resultado Fiscal Estrutural com dados até o terceiro trimestre de 2024. Esse indicador tem como objetivo aferir de maneira mais precisa a contribuição permanente da política fiscal sobre o endividamento, excluindo o efeito das flutuações cíclicas da economia e os eventos não recorrentes. A publicação pode ser obtida em: https://www.gov.br/fazenda/pt-br/assuntos/politica-fiscal/atuacao-spe/resultado-fiscal-estrutural
[3] Ver https://macroattachment.cloud.itau.com.br/attachments/6157925d-ae8d-4680...
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