Terminem com esta depressão já
Em 2012, Paul Krugman, professor da Universidade de Princeton/EUA, laureado com o Prêmio Nobel de Economia de 2008, lançou um livro com título semelhante e inspirador deste artigo.[1] Nele Krugman criticava a inação do governo em relação à depressão que se abatera sobre a economia americana desde dezembro de 2007, na esteira da crise financeira. A recessão terminou em junho de 2009, mas a recuperação foi lenta e pouco resultou para a geração de emprego, já que 24 milhões de trabalhadores permaneciam desempregados mesmo após os primeiros sinais de recuperação.
Em 26 de março deste ano, no jornal Valor Econômico, em coautoria com Aloisio Campelo Jr., publicamos o artigo “O pior quinquênio de nossas vidas”, em que chamávamos a atenção para que, após dois anos de finda a recessão de 2014-16, a economia brasileira havia recuperado apenas 42% do produto perdido durante a recessão. Mais desalentador ainda era a previsão, até então, do Boletim Focus do Banco Central de um crescimento de apenas 2% em 2019. Que dizer agora diante da nova previsão, da mesma fonte, três meses depois, de que o crescimento este ano será de apenas 0,8%?
O Brasil está vivendo uma tragédia econômica e social: são mais de 13 milhões de desempregados, perspectiva de baixo crescimento econômico e de queda da renda per capita. Esta, conforme ilustrado no gráfico abaixo, passou durante a recessão (desde o segundo trimestre de 2014) por 13 trimestres apresentando taxas de variação negativas, voltando a taxas positivas em torno de zero por seis trimestres e, no primeiro trimestre deste ano, voltou a apresentar taxa negativa.
Fonte: Elaboração própria a partir de dados do IBGE/SCN e PNADC.
O desperdício de fatores produtivos é assustador: a perda de qualificação dos desempregados será sentida quando, e se, voltarem a ter ocupação; a obsolescência do capital parado (com perda de produto potencial), junto com a mão de obra desqualificada pelo desemprego serão dois fatores quase incontornáveis para a melhoria da produtividade. E fica a “sociedade de economistas” discutindo se deve ou não dar impulsos fiscais antes da aprovação da reforma da Previdência, ou ainda divagando sobre fim do bônus demográfico, ou ainda lembrando que este desastre é um legado de 13 anos do PT no governo. Essa nossa “ciência triste” deprime qualquer um!
A teoria econômica nos diz que há duas possibilidades de retomada do crescimento econômico: pelo lado da oferta depende de educação, melhoria no ambiente de negócios e outros elementos que elevariam a produtividade – todos fundamentais, mas associados ao longo prazo. Pelo lado da demanda os dois elementos seriam o consumo e o investimento. Para o consumo muitos estímulos têm sido dados no período recente, que levaram a apenas um breve período de crescimento sem impulso duradouro para o investimento em capacidade instalada adicional. E, isto está diretamente associado ao enorme hiato do produto na indústria de transformação (-8% no 1º trimestre de 2019 – diferença entre a capacidade potencial e o produto realizado).
Pelo lado do investimento, as informações das Contas Nacionais mostram que os investimentos da economia se dividem em máquinas e equipamentos (35%), construção (52%), e outros (13%). Pesquisa em andamento na SUEP/IBRE/FGV mostra que 46% dos investimentos em máquinas e equipamentos, dentro dos 35%, são feitos pelas indústrias de transformação e da extrativa mineral. A eles se somam cerca de 21% dos gastos em máquinas e equipamentos investidos pelas atividades de serviços, construção e comércio. Por sua vez, essas cinco atividades mencionadas, em conjunto, fazem apenas 10% dos seus investimentos em construção. Ou seja, esses números revelam três aspectos: primeiramente, que as atividades econômicas investem pouquíssimo em construção; em segundo lugar, que os investimentos em construção dependem da demanda por moradias e por obras públicas; e, em terceiro lugar, que os investimentos em máquinas e equipamentos só serão retomados com o esgotamento da capacidade ociosa das indústrias de transformação e extrativa, que atualmente operam com um hiato de produto de -8%.
Isto posto, fica evidente que é necessário ativar fortemente a indústria da construção: ela opera atualmente com um hiato do produto de -10,3%, no 1º trimestre de 2019, e é responsável por cerca de 8,5% do emprego gerado na economia. Tendo em vista que a crise brasileira impossibilitou a venda de unidades residenciais para as famílias, que além de perderem seus empregos estão fortemente endividadas, restam apenas as obras públicas. Dada a situação de inadimplência dos Estados brasileiros, cabe ao governo federal realizar as obras necessárias à reativação dessa atividade, visando a retomar o crescimento e o emprego e assim gerar um círculo virtuoso de crescimento econômico. E isso deve ser feito a despeito de todas as dificuldades que teria o governo federal para aumentar seus gastos.
E isso tem que ser feito imediatamente. Na carta do IBRE, publicada na revista Conjuntura Econômica deste mês, chama-se a atenção de que há cerca de 6.000 obras públicas paradas no país cuja retomada é relativamente simples, dado o fato de já passaram por todos os trâmites burocráticos necessários a sua realização. Além disso, investimento não tem impacto na regra de ouro.
Não há porque se esperar a reforma da Previdência. Não há sentido em se prolongar o sofrimento de 13 milhões de brasileiros e de suas famílias. Terminem com esta depressão já!
As opiniões expressas neste artigo são de responsabilidade exclusiva do autor, não refletindo necessariamente a opinião institucional da FGV.
[1] Paul Krugman, End this depression now, W.W. Norton & Co., NY, 2012.
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