Macroeconomia

Acompanhamento da China e do mundo pós Covid-19

3 jun 2020

Como já tratamos neste espaço, em abril o FMI divulgou seu cenário da atividade econômica para 2020 e 2021. Essencialmente fomos informados de que a economia mundial recuaria 3% em 2020 e cresceria 5,8% em 2021. As projeções anteriores, antes da eclosão da fase aguda da crise da Covid-19, eram de crescimento de, respectivamente, 3,3% e 3,4% em 2020 e 2021. Houve, portanto, com relação à projeção anterior à pandemia, queda de 6,3 pontos percentuais (pp) em 2020 e crescimento de 2,4pp em 2021.

O cenário básico do FMI indica forte perda de produto em 2020, 6,3pp, com recuperação parcial de 2,4pp, em 2021, em relação ao cenário sem pandemia. Se, a partir de 2022, a economia mundial retornar à sua dinâmica pré-pandemia – crescimento de 3% ao ano, com economias desenvolvidas crescendo a 2% ao ano e as emergentes a 4% – a crise da Covid-19 terá custado 4pp do PIB mundial a partir de 2020.

O cenário básico do FMI tem como hipótese fundamental que o convívio com o vírus, após os países normalizarem a atividade econômica, não será muito deletério ao funcionamento da economia. Trata-se de um cenário relativamente otimista.

Para avaliarmos se o cenário básico do FMI está se materializando, o melhor que podemos fazer é acompanhar a recuperação da China no segundo trimestre. Com os dados do varejo, da indústria e da evolução do crédito e do endividamento, todos para o mês de abril, nossas estimativas para o crescimento chinês no segundo trimestre, que no boletim anterior rodavam a 5,1% ante o mesmo período de 2019, foram revisadas para 3-3,5%.

Trata-se de uma piora substantiva, provocada muito pelos dados de comércio internacional de abril. Porém, no meu entender, não altera o cenário: a normalização da economia pós-flexibilização da política mais extrema de distanciamento social promove uma recuperação em ‘V’ da atividade. Basta lembrarmos que, no primeiro trimestre, a China rodou 6,8% abaixo do mesmo período de 2019.

Portanto, com os dados divulgados entre o atual boletim e a edição anterior, continuamos a apostar que o desenho mais geral do cenário básico do FMI continua de pé. Os números exatos não sabemos, mas, com o que temos até o momento, há, sim, normalização após a saída da supressão da atividade econômica.

Outro tema é sabermos qual será o balanço entre oferta e demanda que vigorará no mundo pós Covid-19. Será mais inflacionário do que o atual? Há grande preocupação com o enorme endividamento que ocorrerá em todas as economias. Por outro lado, há evidências de que grandes choques como o atual, que cortam a renda de parte considerável da população, acabam por produzir comportamento mais cauteloso da população, elevando, portanto, a taxa de poupança. Finalmente, há tendências de muito longo prazo, como o envelhecimento das populações das economias centrais, que devem, em algum horizonte à frente, gerar queda de poupança.

Segundo a melhor evidência que temos, cada 10 pontos percentuais na dívida pública das economias centrais adiciona 0,35 ponto percentual no juro neutro internacional. Assim, pelo aumento endividamento, devemos esperar uma subida em 0,5-0,75pp no custo internacional de capital.

Por outro lado, 2021 deve ser ano de forte consolidação fiscal nas economias centrais. Adicionalmente, deve haver, em função da poupança por precaução, algum processo de redução do consumo das famílias. Elas sairão mais pobres da crise e terão passado por muita incerteza e, em muitos casos, por desemprego. As empresas, por sua vez, sairão da crise mais endividadas. Podemos esperar um período de dificuldades até a retomada do investimento. As empresas estarão em processo de redução das suas dívidas. Assim, em uma primeira avaliação, não parece que nos primeiros anos em seguida à pandemia haverá subida do custo internacional do capital.

Este artigo faz parte do Boletim Macro IBRE de maio de 2020. Leia aqui a versão integral do BMI Maio/20.

As opiniões expressas neste artigo são de responsabilidade exclusiva do autor, não refletindo necessariamente a opinião institucional da FGV. 

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