Macroeconomia

Desenha-se a recuperação cíclica

11 dez 2019

Em seguida à fortíssima crise que se abateu no Brasil entre 2014 e 2016 – maior queda nos últimos 120 anos de PIB absoluto e segunda maior queda de PIB per capita – e na sequência de uma recuperação muito lenta – por três anos seguidos, entre 2017 e 2019, a economia caminhará ao passo de cágado de 1% ao ano –, estão dadas as condições para uma recuperação cíclica, segundo a avaliação da coluna.

O ano deve terminar com a economia 2,1% acima do nível do quarto trimestre de 2018 e crescendo ao ritmo, ante o terceiro trimestre, de 0,8%, já considerando os ajustes sazonais.

Ao longo de 2019, dois choques pioraram nosso desempenho. O agravamento da crise de balanço de pagamentos da Argentina e seus impactos sobre o desempenho de nosso vizinho tiraram 0,5 ponto percentual do crescimento brasileiro.

O desastre com o lago de rejeitos da Vale do Rio Doce na cidade de Brumadinho tirou cerca de 0,1 ponto percentual. Tudo computado, o crescimento deste ano, que deve fechar em torno de 1,2%, está com cara de 1,8% em termos tendenciais.

Adicionalmente, o carregamento para 2020 – isto é, o crescimento da economia em 2020 em comparação com a média de 2019, se o crescimento em cada trimestre a partir do próximo ano for nulo, na comparação com os trimestres anteriores – será de 1%.

Ou seja, se a economia conseguir sustentar crescimento médioo trimestral de 0,5% ao trimestre, fechará 2020 com crescimento de 2,2% em relação a 2019 (cenário do Ibre). Se chegar a 0,6%, o PIB chega à marca de 2,5%.

A pesquisa Focus prevê crescimento de 2,08% em 2020. Diversas casas têm revisado o desempenho da economia brasileira para 2,2% no próximo ano.

A aposta da coluna é que estão dadas as condições para uma recuperação cíclica da economia brasileira no triênio 2020-2022. Não será nada brilhante, mas o suficiente para manter a economia rodando a 2,5% – um pouco menos ou um pouco mais – até o próximo processo eleitoral.

Desde o primeiro ano do segundo mandato da presidente Dilma, temos feito um forte esforço de ajuste das contas públicas. Com o governo Temer, algumas reformas importantes foram aprovadas: reforma trabalhista; institucionalização da terceirização; melhora dos mecanismos de concessão de subsídio ao investimento, com a criação da Taxa de Longo Prazo (TLP); uma importante reforma política, tema que abordamos na coluna anterior. Já no governo de Jair Bolsonaro foram aprovadas a reforma previdenciária e a Lei da Liberdade Econômica.

Esse conjunto de medidas é suficiente para estabilizar nossa economia até 2020 ao ritmo de 2,5% ao ano.

Mais do que isso é difícil imaginar sem uma nova rodada de reformas.

Níveis maiores de crescimento econômico demandam que o investimento cresça a taxas bem elevadas. Para isso ocorrer, será necessário um marco legal e institucional mais bem definido. Um ingrediente fundamental dessa agenda é a reforma tributária dos impostos indiretos – ISS, ICMS, PIS e Cofins e IPI. Há enorme demanda e existe, de fato, necessidade de que avance a agenda de redução do custo de conformidade tributária. A sociedade já compreendeu esse fato. Todos sabem que, em cinco anos, esses impostos estarão totalmente modificados. Enquanto essa agenda não andar, difícil que o investimento cresça a taxas muito fortes. É muito elevada a incerteza tributária para o cálculo de um fluxo de caixa futuro.

A avaliação da coluna é que a aceleração do crescimento para esse patamar moderado de 2,5% nos próximos anos ocorrerá de forma relativamente independente dos ruídos da política. O presidente continuará a se comunicar diretamente com sua base por meio do Twitter, haverá seguidos ruídos, mas de forma geral a recuperação persistirá.

As diversas casas que projetam a atividade – departamentos de pesquisa econômica dos grandes bancos e consultorias econômicas – caminham na direção desse cenário. Há algumas diferenças relativas ao desenho da aceleração. Alguns ainda enxergam 2020 fraco e projetam a maior aceleração em 2021, enquanto outros já veem a economia mais forte em 2020.

Viveremos alguns anos com descolamento da economia da política.

A recuperação moderada tem como um de seus sustentáculos a retomada do equilíbrio financeiro e da lucratividade das empresas. A crise profunda tem uma dimensão macroeconômica – a desorganização das contas públicas e maior leniência com a inflação –, mas também possui uma faceta microeconômica.

A crise foi a culminação de um longo ciclo de investimento com forte intervenção do Estado na economia, que gerou verdadeiro hospital de empresas: estavam endividadas e sem capacidade de geração de caixa, em função da má qualidade do investimento.

Ao longo dos últimos três anos, esteve em curso um silencioso, mas persistente, processo de arrumação da casa do setor privado. A leve aceleração deve estimular uma moderada recuperação do investimento.

Em particular, em diversas regiões do país – São Paulo, Minas, Paraná, Santa Catarina e todo o Centro Oeste – há claros sinais de recuperação da indústria da construção civil no segmento de imóveis para renda mais elevada.

Assim, parece que sairemos nos próximos anos do pior da crise. Evidentemente, uma forte crise internacional pode descarrilhar a leve recuperação que se delineia. Até há alguns meses, havia uma perspectiva de uma crise na economia norte-americana. O processo de redução dos juros nos Estados Unidos parece ter jogado esse risco para 2021. Quando e se essa crise vier, a economia brasileira já estará num ritmo de crescimento mais sólido.

A inferência para a política é que o cenário de recuperação moderada reduzirá as chances de uma vitória da esquerda em 2022. A redução da chance de vitória da esquerda reforçará a recuperação da economia.

Tudo conspira para que o presidente Jair Bolsonaro seja o grande favorito em 2022. A dúvida é se o centro da política conseguirá se organizar em torno de uma candidatura competitiva. A coluna não consegue fazer prognósticos sobre essa questão.


Esta é a coluna Ponto de Vista da Conjuntura Econômica de dezembro de 2019 (algumas projeções foram atualizadas para publicação neste Blog).

As opiniões expressas neste artigo são de responsabilidade exclusiva do autor, não refletindo necessariamente a opinião institucional da FGV.

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