"Disregard Doctrine", mais uma fonte de incerteza jurídica no Brasil
Empreender é uma atividade altamente arriscada. O empresário se expõe às incertas oscilações da atividade empresarial, que poderiam implicar a perda de todo o seu patrimônio pessoal em caso de quebra repentina. Uma execução judicial de despejo para o pagamento de débito com credores pode levar a vida de indivíduos e famílias à ruína.
Nesse contexto, o aparecimento do conceito jurídico de responsabilidade limitada é um dos grandes marcos no desenvolvimento das instituições econômicas modernas. A noção de responsabilidade limitada estabeleceu a distinção entre bens corporativos, atrelados à responsabilização legal de uma Pessoa Jurídica (PJ), dos bens pessoais dos sócios, atrelados à responsabilização legal de uma Pessoa Física (PF). Essa distinção garantiu a proteção do patrimônio de sócios e acionistas diante de um eventual processo falimentar. O instituto da PJ limita os riscos de empreender, constituindo um importante estímulo à abertura de novos negócios, à inovação e à criação de empregos.
Entretanto, o conceito de responsabilidade limitada vem sendo questionado por tribunais no Brasil. É o que expõe a obra “A Desconsideração da Personalidade Jurídica na Justiça do Trabalho”, do professor em Direito e advogado Rodrigo Saraiva Marinho. Nessa obra, demonstra-se como juízes trabalhistas têm proferido sentenças orientando-se na Disregard Doctrine. A Disregard Doctrine estabelece a desconsideração das personalidades jurídicas e a responsabilização direta dos sócios em passivos empresariais. Proveniente dos EUA e originariamente utilizada para aplicação em casos específicos de fraude administrativa, a Disregard Doctrine vem sendo aplicada de forma abusiva pela Justiça do Trabalho nas execuções de dívidas trabalhistas de empresas.
Com a Disregard Doctrine, torna-se institucionalizada a prática de despejos judiciais, atingindo os sócios, para o pagamento de passivos trabalhistas, mesmo diante da falência de uma PJ. E isso é agravado por uma legislação trabalhista altamente reguladora, que leva à judicialização das relações de trabalho, contribui para um ambiente de fortíssima incerteza jurídica e de inviabilização da abertura de novas empresas. O empresário, nessa situação, iniciaria um negócio que passa a envolver não somente o risco inerente à atividade, como também riscos institucionais que podem levar à destruição de todo o seu patrimônio pessoal.
O Brasil é o 140o colocado no ranking mundial de liberdade econômica, segundo dados da Heritage Foundation. Um ambiente de liberdade econômica depende de um quadro de leis estáveis que garantam limitação dos riscos e previsibilidade do cálculo empresarial. Não é o que ocorre em um ambiente de altíssima insegurança jurídica como no Brasil. E a legislação trabalhista brasileira, combinada com a sua interpretação por magistrados, detém inúmeras nuances processuais que contribuem para promover um ambiente de insegurança e aversão ao empreendedorismo.
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