Macroeconomia

A economia do Carnaval do Rio

25 fev 2022

O Carnaval do Rio movimenta R$ 4 bilhões na economia; é o mês com maior arrecadação de ISS dos serviços ligados ao turismo; e tem, pelo menos, 45 mil trabalhadores nos eventos. Por tudo isso, Carnaval também é desenvolvimento econômico!

A Prefeitura do Rio divulgou, em fevereiro de 2022, um estudo chamado “Carnaval de Dados”,[1] elaborado pela Secretaria Municipal de Desenvolvimento Econômico, Inovação e Simplificação (SMDEIS), em parceria com a Fundação João Goulart (FJG), para mostrar diversos dados de como a Prefeitura atua na organização do Carnaval, bem como informações econômicas, mostrando que Carnaval também é desenvolvimento econômico!! 

Um dos objetivos da SMDEIS, por meio da Subsecretaria de Desenvolvimento Econômico e Inovação (SUBDEI), é fazer análises e estudos sobre a economia carioca, para poder subsidiar a alta gestão da Administração Municipal na elaboração de políticas públicas. Todo esse material se encontra disponível no Observatório Econômico do Rio, um portal elaborado pela SMDEIS com dados e análises sobre a economia carioca. Nesse sentido, a publicação “Carnaval de Dados”, bem como o Estudo Especial da SUBDEI/SMDEIS, “Economia do Carnaval do Rio”, procura mostrar alguns dados econômicos da principal manifestação cultural e mais importante evento turístico do Rio, com as centenas de blocos e os desfiles das Escolas de Samba, considerados por muitos como o “maior espetáculo da terra”.[2]

Começando pelos impactos do Carnaval na Economia do Rio, que são todas as movimentações econômicas, em diferentes setores da economia, relacionadas ao evento. Vale frisar que neste momento não estamos falando apenas de arrecadação de impostos, mas sim de movimentação econômica. Por exemplo, se um turista vem para o Rio no Carnaval, ele fica em um hotel, vai à bares e restaurantes, em pontos turísticos, faz compras em lojas, utiliza transportes para deslocamentos, assiste aos desfiles no Sambódromo, entre outras atividades. Ou seja, todas essas movimentações, feitas pelos turistas e algumas também pelos cariocas, movimentam a economia nesse período, gerando também arrecadação de impostos.

De acordo com a pesquisa “Rio de Janeiro a Janeiro”, elaborada pela FGV, em relação aos impactos do turismo durante o Carnaval, há impactos diretos, a quem o turista paga diretamente; além dos indiretos, como salários e fornecedores. Entre os impactos diretos, há itens como hospedagem, alimentação e bebidas, transporte local, passeios e atrativos e compras. Sobre os impactos indiretos, indústria fornecedora de insumos, treinamento, imobiliário, hospitais, entretenimento e logística. Além disso, também há impactos operacionais do evento na economia do Rio. Entre os impactos diretos, gastos com produção; palco, montagem do evento e artistas; equipamento de som. E, entre os impactos indiretos, energia, imobiliário; artistas; entre outros.

Diante disso, com dados públicos divulgados pela RIOTUR, o Carnaval no Rio movimentou R$ 4 bilhões em 2020, com um forte crescimento ao longo dos últimos dez anos, tendo atraído 2,1 milhões de turistas.[3]

Uma das principais informações disponíveis nas publicações “Carnaval de Dados” e “Economia do Carnaval do Rio” são sobre os impactos do Carnaval na arrecadação do Imposto Sobre Serviços (ISS), que é o imposto municipal que incide sobre os serviços, que correspondem a 86% da economia carioca. Um equívoco que geralmente ocorre é quando se comenta que a arrecadação municipal de imposto não aumenta durante o mês do Carnaval, logo o evento não teria grande impacto na economia. É importante frisar que este raciocínio não está correto. O erro deste tipo de pensamento está no fato de que não devemos olhar para a arrecadação total de ISS, mas sim para a arrecadação de setores específicos ligados ao Carnaval - como os relacionados ao turismo, por exemplo. Sob esse olhar, é incontestável a importância do Carnaval para a arrecadação de impostos municipais.

Em uma análise da arrecadação de ISS do somatório de três grupos que têm grande relação com o Carnaval (serviços relativos à hospedagem, turismo, viagens e congêneres; serviços de diversões, lazer, entretenimento e congêneres; e serviços de artistas, atletas, modelos e manequins), cuja fonte dos dados é a Secretaria Municipal de Fazenda e Planejamento (SMFP) do Rio, verifica-se que a arrecadação de ISS desse grupo é maior no Carnaval (R$ 25,8 milhões, em média), contra R$ 21,0 milhões na média dos demais onze meses do ano. A arrecadação de ISS desse grupo foi 23,0% maior no Carnaval do que nos demais meses do ano, na média do período 2011-19. A arrecadação de ISS desse grupo também é maior no Carnaval do que no Réveillon. Em média, entre 2011 e 2019, a arrecadação municipal de serviços relativos à hospedagem, turismo, lazer e artistas no Carnaval foi 16,8% maior do que em dezembro (Gráfico 1). Ao se incluir os dados de 2020, a diferença também fica ainda maior.

Ao se olhar a taxa de variação da arrecadação de ISS desses serviços relacionados ao Carnaval, observa-se que, em 2021, em função da pandemia e da não realização do Carnaval, houve uma queda de quase 60% (-57,4%), contra um crescimento médio da arrecadação de 2,0%, entre 2012 e 2020.

Na análise sobre o impacto do Carnaval na arrecadação do Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços (ICMS), o imposto estadual, o foco está no imposto referente aos setores de Alojamento e Alimentação, que são hotéis, pousadas, bares e restaurantes, sendo o grupo com maior relação com o Carnaval, cuja fonte dos dados é Secretaria de Fazenda do Estado do Rio de Janeiro (SEFAZ-RJ). Como cerca de metade do PIB fluminense é da capital do Estado, e cerca de 40% da arrecadação de ICMS no Estado é oriunda da cidade do Rio, essa análise pode ser uma boa proxy para o Município do Rio. Ao se verificar as taxas de crescimento do setor de alojamento e alimentação, sempre na comparação com o Carnaval do ano anterior, observamos que, em média, entre 2012 e 2020, a arrecadação de ICMS de alojamento e alimentação no Estado do Rio de Janeiro apresentou uma alta de 4,2%, contra a queda de 28,5% em 2021, devido à crise do coronavírus, que impediu a realização do Carnaval 2021.

Em uma estimativa[4] da arrecadação de ICMS de alojamento e alimentação no Município do Rio de Janeiro no Carnaval de cada ano, observamos que, em média, entre 2012 e 2020, a arrecadação estimada de ICMS de alojamento e alimentação no Município do Rio de Janeiro no Carnaval cresceu 1,0%, sempre em comparação com o Carnaval do ano anterior. Já em 2021, sem o Carnaval, a queda foi de 26,1%, devido à crise sanitária que não permitiu a realização do evento.

Ao se olhar para os trabalhos do Carnaval, segundo dados da RIOTUR, há 20 mil trabalhadores do Carnaval em apenas um dia de desfile do Sambódromo. Vale frisar que se trata de uma estimativa conservadora, visto que foram considerados como fonte primária somente as credenciais concedidas pela RIOTUR para os trabalhadores. Além destes, há por exemplo o pessoal que trabalha nos “meeting points” dos camarotes, em diversos hotéis e clubes da cidade; os motoristas de ônibus e van que fazem diversas vezes o percurso entre esses pontos de encontro e o Sambódromo durante a noite e a madrugada; os trabalhadores informais, ambulantes, entre diversos outros exemplo. E os desfilantes, que somente em 2020 no Grupo Especial foram 41,1 mil nos desfiles das treze Escolas de Samba que passaram pelo Sambódromo. Isso representa, em média, 3,2 mil desfilantes, por escola. Ou seja, com seis desfiles por dia, são quase 20 mil desfilantes, que também podem ser considerados trabalhadores artistas do Carnaval.

Desses 20 mil trabalhadores do Carnaval no Sambódromo, 65,2% são prestadores de serviços de alimentação, buffet, produção de eventos, organização dos camarotes, empresas de turismo receptivo, agência de viagens, segurança, segurança contra incêndio, limpeza, transportadoras e outras empresas prestadoras serviços. Em segundo lugar, com 22,1%, os órgãos públicos dos três níveis de Governo (Municipal, Estadual e Federal), incluindo a RIOTUR, empresa de Turismo do Município do Rio. E, por fim, a imprensa é responsável por 12,7% dos trabalhadores do Carnaval no Sambódromo.

Além destes, há mais de 18 mil servidores da Prefeitura do Rio trabalhando na cidade durante o evento, sendo a maior parte (42,7%) da Comlurb, e 1/3 da Guarda Municipal. Há, também, 10 mil ambulantes licenciados pela Prefeitura, para trabalharem exclusivamente nos blocos de rua. Sobre esses trabalhadores, que não vão poder trabalhar nos blocos de rua em 2022, em função da pandemia, em especial da variante Ômicron, e do consequente cancelamento dos blocos, a SMDEIS elaborou a política pública “Auxílio Ambulante Carnaval de Rua”, com um auxílio de R$ 500 para esses milhares de trabalhadores, para minimizar os impactos na renda deles, decorrentes do cancelamento do Carnaval dos blocos. 

Ou seja, considerando todas as fontes de dados (GTT “Carnaval de Dados” para os servidores da Administração Municipal envolvidos no Carnaval e para os ambulantes licenciados pela Prefeitura, e as credenciais da RIOTUR para os trabalhadores no Sambódromo), são 45 mil trabalhadores envolvidos diretamente no evento Carnaval. E ficam de fora os demais trabalhadores do Carnaval que não estão no Sambódromo, mas estão prestando serviços relacionados ao desfile.

Em algumas comparações entre as pessoas envolvidas com o Carnaval, seja público, artistas desfilantes ou trabalhadores, em comparação com a população das cidades brasileiras, temos que há ao menos 100 mil pessoas presentes - entre artistas, trabalhadores e público - em um único dia de desfile das Escolas de Samba, o que supera a quantidade de habitantes de 94% das cidades brasileiras. O total de desfilantes nas quatro noites de desfiles das Escolas de Samba (Grupo Especial e Grupo de Acesso- Série Ouro) é superior a população de 92% das cidades do Brasil. O público de um dia de desfile das Escolas de Samba é maior do que a população de 90% das cidades brasileiras. Todos os trabalhadores do “evento Carnaval” (trabalhadores no Sambódromo, servidores municipais e ambulantes licenciados) formam um contingente maior do que a população de 86% dos municípios brasileiros. O total de trabalhadores de um dia de desfile das Escolas de Samba é maior do que a população de 68% das cidades brasileiras. O total de desfilantes de um dia de desfile das Escolas de Samba é superior a população de 66% dos municípios do Brasil. O contingente de servidores públicos municipais envolvidos com o Carnaval é maior do que a população de 65% das cidades do Brasil. O total de ambulantes licenciados pela Prefeitura para trabalharem nos blocos de rua é maior do que a população de 44% das cidades brasileiras. E o contingente de garis da COMLURB que trabalham no Carnaval do Rio é superior a população de 36% dos municípios brasileiros.

Ainda no binômico Carnaval e Desenvolvimento Econômico, e mais especificamente, Carnaval e Desenvolvimento Econômico Sustentável, no seminário “Carnaval de Dados”, no Palácio da Cidade no dia 18 de fevereiro de 2022, também foi anunciado que os desfiles das Escolas de Samba do Rio terão um inventário de emissões de Gases de Efeito Estufa. Ou seja, foi feito o anúncio de uma contabilização do total de geração de gases com potencial de aquecer o planeta, emitidos pelos desfiles das Escolas de Samba (Grupo Especial e Grupo de Acesso-Série A) do Carnaval 2020, sendo esse o primeiro passo para, no futuro, os desfiles poderem ser carbono zero. O inventário será entregue em abril de 2022, na semana da realização dos desfiles das Escolas de Samba.

Essa iniciativa é mais uma do projeto da Bolsa Verde Rio, coordenado pela Secretaria Municipal de Fazenda e Planejamento, e com atuação ativa da SMDEIS, Invest.Rio, e outros órgãos da Administração Municipal, com o objetivo de tornar o Rio a capital de investimentos verdes no Brasil, melhorando o ambiente de negócios de finanças sustentáveis na capital fluminense. O inventário será feito pela BlockC, empresa coligada da AirCarbon Exchange, plataforma de transação de créditos de carbono de Singapura que recentemente abriu sua filial brasileira no Rio.

Em resumo, esses dados do impacto econômico, arrecadação de impostos municipais e estaduais e postos de trabalhos são importantes para reafirmarmos a importância do Carnaval para a economia carioca. Os méritos em termos de cultura e história são amplamente conhecidos e documentados. Mas vale frisar também que o Carnaval do Rio movimenta a economia carioca em R$ 4 bilhões; que a arrecadação do imposto municipal de ISS de serviços relacionados ao Carnaval foi 23,0% maior em fevereiro do que nos demais meses do ano, na média do período 2011-19; E, segundo dados da RIOTUR, há 20 mil trabalhadores do Carnaval em apenas um dia de desfile do Sambódromo, entre prestadores de serviços, funcionários de órgãos públicos dos três níveis de Governo, das Escolas de Samba e das ligas, além da imprensa. E no total há, também, 45 mil trabalhadores (servidores públicos, trabalhadores no Sambódromo e ambulantes licenciados) trabalhando na parte operacional do evento, além dos 70 mil artistas desfilantes. Esses dados todos mostram que “Carnaval também é desenvolvimento econômico!!”.

As opiniões expressas neste artigo são de responsabilidade exclusiva do autor, não refletindo necessariamente a opinião institucional da FGV.


[2] Ver as referências do artigo “Relações entre o Carnaval e a Economia do Rio”, de Balassiano (2021). Disponível em: https://observatorioeconomico.rio/wp-content/uploads/sites/5/2022/01/Artigo_Relacoes-entre-o-Carnaval-e-a-Economia-do-Rio_dez21.pdf

[3] Segundo o artigo “Este ano não vai ser igual àquele que passou”, publicado no Blog do IBRE em fevereiro do ano passado, o Carnaval 2021 poderia ter um impacto de até R$ 5,5 bilhões na economia carioca, caso não tivesse pandemia e houvesse condições sanitárias de acontecer o evento.

[4] O peso da arrecadação do Município do Rio na arrecadação total do Estado do RJ no Carnaval de cada ano foi utilizado como hipótese para estimar os valores da arrecadação de ICMS de alojamento e alimentação na cidade do Rio.

Deixar Comentário

To prevent automated spam submissions leave this field empty.