Impactos setoriais da redução da jornada de trabalho

As simulações mostram que uma redução da jornada de trabalho de 44 horas para 36 horas trabalhadas poderia gerar perdas significativas no nível de produto da economia brasileira, com grande heterogeneidade setorial.
1 - Introdução
A discussão sobre a modificação da escala de trabalho 6x1 e a consequente redução da jornada de trabalho máxima para 36 horas semanais têm ocupado cada vez mais espaço na mídia desde que a proposta de emenda constitucional da deputada Erika Hilton (PSOL- SP) foi feita no ano passado.
Embora a legislação vigente já garanta ao menos um dia de descanso por semana e muitas empresas ofereçam folgas adicionais, a proposta recebeu amplo apoio popular, com mais de 2 milhões de assinaturas. O apoio popular era esperado visto que a proposta contém a redução da jornada de trabalho com a manutenção da remuneração, o que por si só eleva o custo do trabalho para as empresas ao elevar o salário por hora trabalhada para o empregado.
Diversos analistas falam das vantagens da adoção de um sistema com mais folgas, indicando experiências adotadas em países europeus que teriam sido bem-sucedidas.[1] Entretanto, os custos da adoção da proposta podem ser significativos. A redução da jornada de trabalho com manutenção do trabalho pode ocasionar em perda de valor adicionado, redução de renda per capita, fechamento de empresas e até mesmo perda de emprego.
Barbosa Filho (2025) mostra que a redução da jornada de trabalho para um máximo de 36 horas pode ter impactos importantes sobre o valor adicionado da economia brasileira[2]. Em uma simulação do impacto da redução da jornada, em um modelo no qual considera-se apenas o trabalho como fator de produção, poderia haver redução do valor adicionado de pelo menos 3,9%, em seu cenário mais otimista (com ganhos de produtividade de 2,5%, o que parece ser muito difícil, dado o histórico recente de estagnação da produtividade). Além disso, os resultados também mostram que se o aumento do custo do trabalho, resultado da redução da jornada sem alteração dos rendimentos, diminuir a demanda por mão de obra e a produtividade não crescer o bastante para compensar os impactos negativos, o valor adicionado da economia poderá cair mais de 10%.
Apesar das perdas agregadas serem potencialmente elevadas, seus efeitos variam muito devido a heterogeneidade setorial existente no país e sobre os diferentes grupos que participam no mercado de trabalho doméstico. O objetivo deste artigo é contribuir para o debate analisando o impacto setorial da redução da jornada de trabalho sobre os setores, em especial sobre o valor adicionado.
Neste sentido, o artigo estará organizado em cinco seções iniciada por esta introdução. Na segunda seção definimos o conceito de produtividade e apresentamos as fontes dos dados utilizados no artigo. Na terceira seção realizamos algumas simulações do impacto da redução da jornada de trabalho sobre o valor adicionado, na quarta seção apresentamos alguns fatos estilizados sobre a relação entre jornada de trabalho e nível de escolaridade e por fim na quinta seção apresentamos as principais conclusões do artigo.
2 – Metodologia e Dados
2.1 – Cálculo da Produtividade
A produtividade do trabalhador é definida como a razão entre o valor adicionado (Y) e o pessoal ocupado (PO), conforme a equação (1), abaixo:
A produtividade por hora trabalhada é definida pela razão entre o valor adicionado (Y) e o total de horas trabalhadas (Horas) conforme a equação (2), abaixo:
Por último podemos relacionar as duas equações conforme a equação (3), abaixo:
Na equação (3), a produtividade por pessoal ocupado é igual à produtividade por hora trabalhada (PHT) multiplicada pela jornada média de trabalho semanal da economia (JT), que é definida como a razão entre o total de horas trabalhadas e o pessoal ocupado dividido pelas 52 semanas do ano.
2.2 - Dados
Os dados de produtividade do trabalho utilizados ao longo do estudo foram calculados pelo Observatório da Produtividade Regis Bonelli do FGV IBRE.[3] Os insumos utilizados para calcular estes indicadores possuem fontes distintas. Em particular, o dado do valor adicionado (em termos reais) foi retirado das Contas Nacionais do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). Os dados de população ocupada e horas trabalhadas foram calculados a partir da compatibilização das duas principais pesquisas de emprego do país, a PNAD e a PNAD Contínua, divulgadas pelo IBGE.
2.3 - Simulações
Para simular o impacto da redução da jornada de trabalho, vamos utilizar os dados de valor adicionado (Y), de população ocupada (PO) e do total de horas trabalhadas (Horas) no agregado e para cada um dos setores analisados. Com isso, podemos decompor o valor adicionado nos seguintes componentes:
Conforme pode ser visto na equação (4) acima, o valor adicionado pode ser escrito através de componentes distintos. O valor adicionado pode ser obtido pelo produto da produtividade por hora trabalhada da economia (PHT) com o total de horas (Horas) ou pelo produto da produtividade por hora trabalhada (PHT) com o pessoal ocupado (PO) e com a jornada média de trabalho (JT) vezes as 52 semanas do ano.
A simulação modificará somente a jornada média agregada de trabalho da economia. Para tanto, faremos com que a jornada agregada média da economia seja reduzida para as 36 horas máximas de trabalho semanal, em tese, a “proposta na nova legislação”. Com base na equação (4) faremos uma simulação alterando a jornada de trabalho agregada média de cada setor em horas semanais para 36 horas semanais. Desta forma, utilizamos a equação (5) abaixo.
A redução da jornada de trabalho possui impacto direto sobre o total de horas trabalhadas supondo que a nova jornada será efetivamente cumprida. Esta é uma análise de equilíbrio parcial, e que supõe adicionalmente que a redução da jornada de trabalho (com a manutenção dos salários) não reduz a demanda por trabalho, mantendo-se o pessoal ocupado constante.
3 – Redução da Jornada de Trabalho de forma setorial
Os impactos da redução da jornada agregada foram resumidos em Barbosa Filho (2025)[4]. Considerando um modelo similar ao utilizado neste artigo, a redução para uma jornada semanal de 36 horas reduziria as horas trabalhadas em 6,2% e consequentemente o valor adicionado na mesma ordem (6,2%). No entanto, existe bastante disparidade entre os diversos setores da economia brasileira no que tange a jornada média de trabalho. Em particular, setores com maior jornada teriam um custo de adaptação a nova jornada de 36 horas maior do que setores com jornadas de trabalho mais baixas.
Neste sentido, esta seção utiliza as equações 4 e 5 para simular as perdas potenciais de valor adicionado para cada um dos diferentes setores da economia. A análise setorial somente pode ser realizada com base no modelo sem capital físico pois não possuímos o estoque de capital para cada um dos setores da economia. Para tanto, utilizamos dados setoriais de valor adicionado real a preços de 2021 (VA), pessoal ocupado (PO), total de horas trabalhadas (Horas), produtividade por hora trabalhada (PHT), produtividade por pessoal ocupado (PT) e de jornada (JT) para o ano de 2024. Os dados setoriais são apresentados na Tabela 1, abaixo.
A Tabela 1 mostra que os setores de transporte, extrativa, e comércio possuem as jornadas de trabalho mais elevadas com 42,0, 41,2 e 41,0 horas, respectivamente. A alta jornada no setor de comércio acende o alerta para os comerciários que recebem uma parte significativa da sua renda em virtude da sua produtividade (comissão por vendas). A redução da jornada deve afetar o VA do setor e a parte variável dos salários. Por outro lado, os setores com menores jornadas de trabalho são os “outros serviços” e APU. O setor de “outros serviços” é o setor com maior nível de pessoal ocupado. Desta forma, uma redução da JT deve reduzir relativamente o produto neste setor e potencialmente beneficiar muitos trabalhadores.
As maiores produtividades encontram-se nos serviços imobiliários, extrativa, SIUP e intermediação financeira. A produtividade destes setores é elevada por serem setores intensivos em capital. No entanto, a participação destes setores no emprego é baixa.
Tabela 1: Dados Setoriais
Fonte: Elaboração própria com dados do IBGE e da FGV
Importante ressaltar que devido à utilização de deflatores setoriais distintos, a soma dos setores não reproduz exatamente o valor adicionado do Brasil. A Análise da PHT mostra que setores mais intensivos em capitais possuem produtividades do trabalhador e por hora trabalhada mais elevadas. Isso é o caso dos serviços imobiliários, da indústria extrativa, SIUP e intermediação financeira.
Na Tabela 2 apresentamos o crescimento médio da produtividade por hora trabalhada para cada um dos setores da economia para períodos selecionados desde 2012.
Tabela 2: Taxa de crescimento da produtividade hora do trabalho. (Em %a.a.)
Fonte: Elaboração própria com dados do IBGE
Os dados da Tabela 2 mostram que o crescimento da produtividade no país nestes períodos foi muito heterogêneo. Adicionalmente, podemos perceber que a produtividade por hora trabalhada (PHT) agregada teve um comportamento medíocre no período, com crescimento de 0,0% ao ano entre 2012 e 2024. Avaliando os diferentes períodos analisados, podemos notar que o melhor desempenho ocorreu no período entre 2016 e 2018, no qual a produtividade agregada apresentou uma expansão de 1,3% ao ano. A agropecuária, a indústria extrativa, a SIUP e os serviços de informação e comunicação foram os únicos setores que mostraram crescimento da produtividade entre 2012 e 2024. Podemos notar ainda que somente a agropecuária e a SIUP tiveram expansão da produtividade em todos os subperíodos. O destaque negativo fica por conta do setor de transportes que teve uma queda de 2,1% ao ano entre 2012 e 2024.
A análise da jornada de trabalho entre 2012 e 2024 mostra uma redução de 0,2% ao ano na jornada de trabalho agregada. Na agropecuária, observa-se uma elevação anual de 0,1% da JT entre 2012 e 2024. A APU e a intermediação financeira mostram a maior expansão anual da JT, com aumento de 0,3% ao ano. No entanto, setores de transporte, construção, comércio, extrativa e outros serviços mostram redução anual próxima de 0,3%.
Tabela 3: Taxa de crescimento da Jornada de Trabalho. (Em %a .a.)
Fonte: Elaboração própria com dados do IBGE.
A redução da jornada de trabalho agregada é fato bastante conhecido na economia brasileira, com a redução tendo ocorrido de forma sistemática até a saída da pandemia, quando a JT agregada se estabilizou. No entanto, como pode-se observar na Tabela 2, a redução não é homogênea entre os diversos setores. Desta forma, a mudança legal que deve reduzir a jornada de trabalho terá impacto distinto entre os diversos setores, dependendo do tamanho da jornada atual e se a mesma está sendo reduzida ao longo do tempo.
Para avaliar o impacto sobre o valor adicionado de cada setor e da economia como um todo, utilizamos a equação (5) com os dados de cada setor para o ano de 2024. Por último, comparamos este valor agregado contrafactual com o que de fato foi realizado. Os resultados são apresentados na Tabela 4.
A Tabela 4 mostra que a redução da jornada de trabalho reduzirá o valor agregado do país em 6,2%, sendo proporcional a redução da jornada. No entanto, os impactos variam significativamente entre os setores, sendo maior naqueles com maior jornada de trabalho média em 2024.
A análise setorial mostra que, como esperado, os setores mais afetados pela mudança seriam aqueles que possuem uma jornada de trabalho mais elevada. A redução da jornada de trabalho para 36 horas geraria maior perda de horas trabalhadas para aqueles setores com maiores jornadas de trabalho em 2024.
Os setores com menor perda de valor agregado são os outros serviços e a APU com perdas de 1,4% e 1,7%, respectivamente, por possuírem jornadas de trabalho na casa das 36 horas semanais. Esta baixa perda indica que a redução da jornada nestes setores não acarreta em perdas importantes de VA. Logo, seriam setores em que a mudança da jornada afetaria pouco o PIB[1]. A agropecuária com uma jornada média de 37,3 horas apresentaria uma perda de 3,5%.
Tabela 4: Impacto da redução da Jornada de Trabalho para 36 horas
Fonte: Elaboração própria com dados do IBGE.
Na outra ponta, os setores com maiores perdas são o setor de transportes, a extrativa mineral e o setor de comércio, com perdas de 14,2%, 12,6% e 12,2%, respectivamente. A forte redução do VA no setor de comércio reforça as preocupações acerca da remuneração de seus trabalhadores em parte atrelada à existência de comissões. A menor jornada acarreta em perda de VA e de vendas, podendo reduzir os salários dos trabalhadores desta área. A forte queda no setor de extrativa é menos preocupante por ser um setor intensivo em capital (pouco emprego) e que provavelmente fará o ajuste com adoção de mais capital/tecnologia.
Por último, realizamos na Tabela 4 um exercício adicional no qual ocorrem ganhos de produtividade em relação ao ano base (2024) para compensar a redução da jornada de trabalho. Com isso, simulamos três cenários de ganhos de produtividade distintos. O ganho de produtividade igual a evolução histórica da produtividade hora do trabalho (PHT) setorial entre 2012 e 2024. Um ganho da produtividade hora do trabalho de 1% e elevação da PHT de 2%. Importante ressaltar que somente a agropecuária (5,2% a.a.), SIUP (3,7% a.a.) e extrativa mineral (1,3% a.a.) possuem ganhos de produtividade relevantes entre 2012 e 2024.
A Tabela 5 mostra que mesmo uma elevação da produtividade por hora trabalhada de 2%, em relação ao nível observado em 2024, não é capaz de reduzir as perdas de valor agregado por conta da redução da jornada de trabalho. A perda agregada seria de 4,2%, superior ao pior ano da crise de 2015/2016, mesmo com um ganho de produtividade de 2%, muito superior ao ganho de produtividade observado no período entre 2012 e 2024 que foi de 0,0% a.a..
Tomando como base a taxa de crescimento histórica da PHT, somente a agropecuária conseguiria compensar em um ano a redução do valor agregado da redução da jornada de trabalho. Mesmo um crescimento de 2% ao ano, somente seria capaz de compensar a perda de valor agregado na APU e nos outros serviços.
Tabela 5: Impacto da redução da Jornada de Trabalho com Ganhos de Produtividade
Fonte: Elaboração própria com dados do IBGE
Os dados da Tabela 5 mostram que as perdas de valor agregado devido a mudança da jornada variam de forma substancial entre os setores, variando entre perdas de 1,4% e 14,2%, sem ganhos de produtividade. Mesmo com ganhos de produtividade da ordem de 2%, as perdas somente seriam compensadas nos setores de outros serviços e APU e a perda dos demais setores oscilaria entre 1,5% e 12,2%.
4 – Jornada de Trabalho Por Nível de Escolaridade
A análise da jornada de trabalho por nível de escolaridade também mostra que os diferentes grupos serão afetados de forma diversa. Para fazer a análise separamos a amostra em 4 grupos distintos de escolaridade: sem instrução e ensino fundamental incompleto, ensino fundamental completo e médio incompleto, ensino médio completo e superior incompleto, ensino superior completo.
A análise da jornada de trabalho destes quatro diferentes grupos é apresentada na Tabela 6, abaixo. Na tabela 6, apresenta-se a jornada de trabalho para os quatro diferentes níveis educacionais e a agregada. Pode-se perceber que os dois grupos com menor jornada de trabalho são os grupos dos trabalhadores com os dois níveis de instrução mais baixos: sem instrução e ensino fundamental incompleto; trabalhadores com ensino fundamental completo e médio incompleto.
A jornada média destes dois grupos em 2024 foi de 36,2 e 37,8 horas semanais, respectivamente. Em seguida, observamos que o grupo com maior jornada de trabalho é composto por trabalhadores com o ensino médio completo e o ensino superior incompleto, com uma jornada de 39,3 horas de trabalho. Por último, observamos que trabalhadores com o ensino superior completo possuem uma jornada de 38,9 horas semanais.
A participação dos dois grupos com menor nível de escolaridade está caindo ao longo do tempo, com contrapartida o aumento da participação no mercado de trabalho dos trabalhadores com maior nível de escolaridade formal. A jornada de trabalho agregada na economia brasileira encontra-se em 38,4 horas semanais.
Tabela 6: Jornada de Trabalho Efetiva por Nível de Escolaridade
Fonte: Elaboração própria com dados do IBGE.
Um ponto que chama a atenção na Tabela 6 é que os grupos com jornadas de trabalho mais longas não são os trabalhadores com menos escolaridade e que recebem os menores salários. Desta forma, a adoção da nova jornada de trabalho de 36 horas beneficiaria mais os trabalhadores com mais anos de escolaridade, elevando ainda mais os seus salários reais em relação aos trabalhadores com menor qualificação formal.
Em seguida, calculamos o salário real por hora efetiva de trabalho para cada grupo educacional e, por último, a elevação do salário real caso ocorra a redução da jornada de trabalho com a manutenção do salário pago aos trabalhadores. A Tabela 7 mostra o salário por hora efetiva de trabalho[1] em 2024, o salário hora contrafactual supondo a redução da jornada de trabalho para 36 horas e com a manutenção do salário real total efetivamente pago, e na terceira linha mostra-se a variação esperada do salário por hora com a redução da jornada de trabalho.
Os resultados indicam que caso se adote uma jornada de 36 horas semanais sem a redução proporcional do salário total pago, os trabalhadores com maior elevação dos rendimentos reais por hora trabalhada seriam os dois grupos com maior escolaridade: trabalhadores com ensino médio completo e superior incompleto e trabalhadores com ensino superior completo que teriam aumento real de salários de 9,0% e 8,0%, respectivamente.
Os trabalhadores sem instrução e com ensino fundamental incompleto teriam uma elevação da renda real de somente 0,7% , enquanto trabalhadores com o ensino fundamental completo e médio incompleto teriam ganhos de 5,0%.
Tabela 7: Salário Real por hora: Efetivo e Contrafactual
Fonte: Elaboração própria com dados do IBGE.
Obviamente, estes resultados não levam em consideração a provável reação dos empregadores em relação a redução da jornada de trabalho que eleva o custo unitário das empresas[1].
Defensores da redução da jornada de trabalho, advogam que ganhos de produtividade poderiam compensar a elevação do custo do trabalho ocasionada pela redução da jornada de trabalho. No entanto, não calculamos a produtividade dos trabalhadores por grupo educacional uma vez que não conseguimos separar o valor adicionado produzido pelos diferentes grupos educacionais.
Desta forma, utilizamos a evolução do salário por hora efetiva de trabalho como uma proxy para a elevação da produtividade do trabalhador no período. Em mercado competitivos, os salários deveriam acompanhar a evolução da produtividade marginal do trabalho. Desta forma, a variação do salário por hora efetivamente trabalhada seria uma estimativa da evolução da produtividade do trabalho para cada grupo de escolaridade.
A Tabela 8 mostra a taxa de crescimento do salário por hora efetiva por grupo de escolaridade entre 2012 e 2024 e por subperíodos de tempo. Os resultados da Tabela 8 mostram que o grupo escolar com maior ganho salarial foi o dos trabalhadores sem instrução e com fundamental incompleto que tiveram ganho do salário hora de 0,9% a.a. entre 2012 e 2024. Os trabalhadores com ensino fundamental completo e médio incompleto tiveram ganho de 0,5% a.a. Trabalhadores com o ensino médio completo e superior incompleto e trabalhadores com ensino superior completo tiveram perdas no mesmo período de 0,3% a.a. e 1,1% a.a., respectivamente.
Nos períodos de 2012-2016 e 2018-2024, os grupos com mais ganhos continuaram sendo os de renda mais baixa. O único período em que trabalhadores com ensino superior tiveram ganho salarial positivo foi entre 2016 e 2018, com aumento salarial de 0,8% a.a., ficando atrás dos trabalhadores sem instrução ou com ensino fundamental completo que tiveram ganho de 1,3% no período.
A elevação salarial agregada na economia brasileira ocorre em função de um efeito composição do nível de escolaridade no Brasil. A redução relativa de trabalhadores com pouca escolaridade formal e a elevação do percentual de trabalhadores com maior nível de escolaridade explica a elevação do salário agregado na economia. Desta forma, mesmo em períodos de perda salarial para alguns grupos (2012-2024, 2012-2016 e 2018-2024) ocorre elevação do salário real por hora efetiva devido ao aumento do percentual de trabalhadores escolarizados. No período entre 2016 e 2018, em que todos os grupos educacionais tiveram ganhos salariais, a elevação da renda foi mais forte porque somou-se ao ganho salarial por nível educacional, a transferência de trabalhadores em direção aos grupos de salários mais elevados.
Tabela 8: Taxa de crescimento do Salário Real por hora Efetiva de Trabalho (Em % a.a.)
Fonte: Elaboração própria com dados do IBGE.
Desta forma, se consideramos os ganhos salariais como proxy para ganhos de produtividade, somente os trabalhadores com menos nível de qualificação tiveram elevação de produtividade período. Desta forma, não deve se esperar que ganhos de produtividade sejam capazes de compensar a elevação do salário por hora trabalhada dos trabalhadores por conta da redução da jornada de trabalho.
5 – Conclusão
Com base nas simulações realizadas na seção 3, pode-se concluir que uma redução da jornada de trabalho máxima de 44 horas para somente 36 horas poderia gerar perdas significativos no nível de produto da economia brasileira, com impactos setoriais bastante distintos.
A simulação mostra que a perda agregada seria de 6,2%[1]. Entretanto, os impactos setoriais seriam bastante distintos com as perdas oscilando entre 1,4% (outros serviços) e 14,2% (transporte). O setor de “outros serviços” já possui uma jornada de trabalho próxima das 36 horas semanais. Com isso, a modificação não deve gerar grandes perdas de VA no setor e pode beneficiar o seu enorme contingente de trabalhadores. A questão neste caso passa pela reorganização das jornadas de trabalho.
Nota-se também que somente para a agropecuária o crescimento histórico da produtividade por hora trabalhada seria capaz de compensar a perda de valor agregado da queda inicial. Mesmo uma elevação da produtividade hora do trabalho de 2% não seria suficiente para compensar as perdas para a grande maioria dos setores. Desta forma, a redução do valor agregado seria significativa para diversos setores.
Por último, fizemos uma análise do impacto da redução da jornada de trabalho sobre os salários dos trabalhadores com diferentes grupos educacionais. Os resultados da seção 4 mostram que caso ocorresse uma redução da jornada de trabalho para 36 horas semanais e a remuneração total fosse mantida, trabalhadores com maior nível de escolaridade seriam mais beneficiados. Isso ocorre porque a jornada média de trabalho já é mais baixa para os trabalhadores com menor nível de escolaridade. Desta forma, a redução da jornada de trabalho não beneficiaria tanto os trabalhadores com menos anos de escolaridade que teriam ganhos de 0,7% (trabalhadores sem instrução e com ensino fundamental incompleto) e 5% (trabalhadores com o ensino fundamental completo e médio incompleto). Trabalhadores com ensino médio completo e superior incompleto e trabalhadores com ensino superior completo teriam aumento real de salários de 9,0% e 8,0%, respectivamente.
[1] Gomes (2022), com o livro “Sexta-feira é o novo sábado: como uma semana de trabalho de quatro dias poderá salvar a economia”, defende a visão de que a redução da jornada de trabalho pode ser compensada com ganhos de produtividade.
[2] Acesse o artigo completo no Observatório da Produtividade Regis Bonelli através do link: https://ibre.fgv.br/sites/ibre.fgv.br/files/arquivos/u65/potenciais_cust...
[3] Os dados de produtividade do trabalho e PTF podem ser acessados no Observatório da Produtividade Regis Bonelli, através do link: https://ibre.fgv.br/observatorio-produtividade
[4] Potenciais Custos do fim da Jornada 6X1, que pode ser obtido no link: https://ibre.fgv.br/sites/ibre.fgv.br/files/arquivos/u65/potenciais_cust... .
[5] A questão neste caso, deixaria de ser o total de horas trabalhadas e passaria a focar em como organizar a nova jornada de trabalho.
[6] Divide-se o salário efetivo pela jornada de trabalho efetiva ao longo de quatro semanas.
[7] No caso de uma elevação do custo unitário do trabalho seria de se esperar que as empresas reduzissem a contratação, fazendo com que uma parte dos trabalhadores perdessem a sua ocupação.
[8] Para mais detalhes ver Barbosa Filho (2025) no link a seguir: https://blogdoibre.fgv.br/posts/potenciais-custos-do-fim-da-jornada-6x1
Deixar Comentário