Momento de mudança na política monetária
Aproxima-se um momento de virada na política monetária mundo afora, ainda que de diferentes naturezas nos diversos países. No Brasil, BC pode colher frutos do aperto monetário, com gradual recuo da inflação e das expectativas.
A última semana foi marcada por decisões de política monetária de parte dos bancos centrais das principais economias. No Brasil, a decisão de política monetária será o destaque desta semana, com a reunião do Copom em 20 e 21 de junho. No todo, a expectativa é de que, mundo afora, estejamos nos aproximando de um momento de virada, ainda que de diferentes naturezas, conforme o estágio do ciclo de ajuste vivido por cada economia.
Nos EUA, a despeito da resiliência dos dados relativos à inflação, ao mercado de trabalho e à atividade econômica, o Fed (Banco Central americano) decidiu manter a taxa básica de juros inalterada entre 5,00% e 5,25%. O comunicado pós-reunião foi duro, sinalizando que a instituição poderá retomar o ciclo de altas no futuro, de resto sinalizadas nas projeções dos membros do Fomc, que em sua maioria preveem mais duas subidas de juros este ano.
A principal justificativa para a pausa é a necessidade de melhor avaliar o quanto o aperto já realizado irá impactar a atividade e os preços. Isto é, ter tempo para ver a evolução dos dados. Se o cenário projetado pela instituição prevalecer, a taxa de juros subirá mais um pouco à frente, pois há expectativa de crescimento mais elevado do PIB, com o núcleo do PCE (Personal Consumption Expenditure) ainda mais pressionado, fechando em 3,9% este ano, ante uma previsão anterior de 3,6%. Em suma: levará mais tempo para a inflação convergir para a meta, e tudo indica que o aperto monetário se manterá firme, ainda que, na margem, menos por fortes altas e mais pela manutenção de uma taxa um pouco acima da atual, inclusive em boa parte do ano que vem, ao contrário do que o mercado vinha precificando até pouco tempo atrás.
Em linha com o esperado, o Banco Central Europeu (BCE) elevou a taxa de juros para 3,50%, sinalizando nova alta em julho, pois as taxas e as expectativas de inflação seguem muito pressionadas. Não é claro que uma segunda nova alta dos juros não ocorra à frente, elevando a taxa para 4,0%, até porque o BCE está mais atrás na curva do que a maioria dos outros BCs. Também na Área do Euro, porém, o momento de pausa na escalada dos juros se aproxima.
Na China, também se viram mudanças na política monetária, ainda que na direção oposta, com o Banco Popular da China (PBoC) anunciando um corte de 0,1 p.p. em uma das taxas básicas de juros. Também aumentou a probabilidade de estímulos adicionais, inclusive de natureza fiscal, dada a perda de dinamismo da economia chinesa, depois de um robusto primeiro trimestre. De fato, os indicadores de atividade de alta frequência de maio vieram em linha com o esperado pelo Boletim Macro, de uma atividade menos pujante após a reabertura completa da economia.
Segundo estudos do pesquisador Lívio Ribeiro, a economia chinesa enfrenta carência de demanda (interna e externa), além de desorganizações relevantes em setores-chave da economia, como imobiliário, finanças públicas subnacionais e crédito. Mesmo com a redução recente dos juros referenciais chineses, e indicações de novas políticas de estímulo ao mercado imobiliário, o cenário é desafiador, pois, até o momento, as políticas pouco afetaram o problema central chinês, que é a carência de demanda.
E, por fim, temos a decisão de juros do Copom. Após muitos meses de política monetária apertada, com o juro real em terreno restritivo desde o final de 2021, o BC começa a colher os frutos: a inflação corrente e as expectativas inflacionárias estão cedendo, mesmo que de forma gradual. Como esperado, os mecanismos de transmissão da política monetária vêm atuando sobre a demanda doméstica (consumo das famílias e investimento) e, consequentemente, sobre setores cujas atividades dependem em grande medida desta demanda.
Como já ressaltamos antes, no Brasil em torno de 65% do valor adicionado na economia é composto por essas atividades mais sensíveis à política monetária; denominamos esse grupo de PIB cíclico. O restante dos setores, como agropecuária, indústria extrativa, serviços públicos e atividades imobiliárias[1], são agrupados no que denominamos de PIB “éxógeno”. E, de fato, desde o terceiro trimestre do ano passado, o PIB cíclico tem permanecido próximo da estagnação, após expressivo crescimento no primeiro semestre de 2022. Em particular, em torno de 1,7 p.p. do surpreendente crescimento do primeiro trimestre de 1,9% (TsT) com ajuste sazonal resultou da contribuição das atividades menos sensíveis à política monetária; ou seja, do PIB exógeno.
(Continua...)
[1] Pela metodologia do IBGE, o valor adicionado das atividades imobiliárias é predominantemente relacionado ao aluguel imputado, com elevada persistência no resultado do setor.
Leia aqui o artigo completo na versão digital do Boletim Macro de junho/2023.
As opiniões expressas neste artigo são de responsabilidade exclusiva dos autores, não refletindo necessariamente a opinião institucional da FGV.
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