Moro e o histrionismo populista
Mesmo não sendo histriônico como os populistas de direita Jânio, Collor e Bolsonaro, Moro também une discurso anticorrupção, hostilidade ao sistema político, posicionamento fortemente à direita e vinculação a partidos inexpressivos, o que não augura bem para governabilidade.
Recentemente assistiu-se ao lançamento da candidatura de Sergio Moro, filiado ao pequeno PODEMOS, à presidência da República. Em pouco tempo, o ex-ministro da Justiça de Jair Bolsonaro se tornou o terceiro colocado na corrida pelo Palácio do Planalto. Se a situação econômica do país se deteriorar mais ainda em 2022, Moro tem chances de chegar ao segundo turno no lugar do ex-capitão, disputando o grande prêmio da política brasileira provavelmente com Lula.
Moro tem estado muito ativo na busca de apoio eleitoral e na formação da sua estrutura de campanha. Já acenou para evangélicos, militares, partidos conservadores, liberais e o mercado – todos peças-chave da eleição e do governo de Bolsonaro.
À luz da história brasileira, o que representa a candidatura de Moro?
Moro ascendeu politicamente como o juiz da Operação Lava Jato. Esta acabou sendo um dos fatores mais disruptivos da política nacional desde 1985. Começou bem ao desenvolver novos e eficazes métodos de combate à corrupção, mas, rapidamente, passou a reivindicar para si o mandato de sanear o sistema político. Daí para valer-se de formas heterodoxas de ação foi um pulo (formas reveladas sobejamente pela Vaza Jato). Daí para interferir diretamente na campanha eleitoral de 2018 foi outro.
Finalmente, Sergio Moro aceitou ser o primeiro ministro da Justiça de Bolsonaro, antigo deputado de extrema-direita que – no rastro da desmoralização da classe política causada pela Lava Jato e por diversos escândalos de corrupção, uma longa crise econômica e graves problemas de segurança pública – logrou se apresentar ao eleitorado como o salvador da pátria.
Nota bene: aquele que queria sanear o sistema político juntou-se a um deputado que sempre defendera ditaduras. A opção política e ideológica de Moro ficou muito clara nesse instante. Hoje, candidato à presidência, o ex-juiz da Lava Jato volta ao seu tema político original – “Contra o Sistema da Corrupção” – título do livro que vem de publicar.
Combate à corrupção, hostilidade ao sistema político, posicionamento ideológico marcadamente à direita e vinculação a partidos políticos inexpressivos são também atributos essenciais de Jânio Quadros, Fernando Collor e Jair Bolsonaro, os grandes próceres da direita populista brasileira. Essa é a tradição política à qual se filia Sergio Moro, como já destacou Maria Hermínia Tavares de Almeida[1].
Há, porém, uma importante diferença entre, por um lado, Moro e, por outro, aquela trinca: Moro não é histriônico. Pelo contrário, sua oratória é claudicante e destituída de graça. Todavia, o fato de não ser histriônico tem dificultado o diagnóstico da real natureza política de Moro por muita gente inteligente e com título de doutor.
Fica aqui, portanto, o aviso aos navegantes, sobretudo aqueles que se querem liberais ou adeptos de uma orientação econômica ortodoxa. A ausência de histrionismo certamente será um ativo de Moro quando confrontado com Bolsonaro em 2022. Porém, a combinação dos quatro atributos acima referidos torna muito difícil o êxito de qualquer presidente, pois, ao fim e ao cabo, lhe faltará o lastro partidário e organizacional para navegar os encapelados mares políticos que sempre caracterizaram a República. Vide o desempenho da trinca.
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As opiniões expressas neste artigo são de responsabilidade exclusiva do autor, não refletindo necessariamente a opinião institucional da FGV.
[1] Ver Maria Hermínia Tavares de Almeida, “O candidato Sergio Quadros de Mello vem aí”, Folha de São Paulo, 17/11/2021, disponível em https://www1.folha.uol.com.br/colunas/maria-herminia-tavares/2021/11/o-candidato-sergio-quadros-de-mello-vem-ai.shtml.
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