Macroeconomia

A natureza passageira dos atuais desequilíbrios no mercado de trabalho dos EUA

24 jun 2021

Processo avançado de vacinação e fim programado para setembro do seguro-desemprego vinculado à pandemia oferecido pelo governo federal devem eliminar importantes forças inibidoras da oferta de trabalho nos Estados Unidos, com reflexo positivo no controle da inflação.

Nos países avançados, os dirigentes dos bancos centrais têm argumentado que o observado aumento da inflação corrente tem caráter temporário. O debate em torno desse assunto tem especial relevância no caso dos Estados Unidos, em razão do recente aparecimento de pressões salariais, algo que, pelo menos em tese, poderá contribuir para tornar mais duradouro o processo de alta dos preços de serviços e bens finais.

Diante disso, vale a pena examinar o quadro atual do mercado de trabalho nos EUA e procurar entender se os prognósticos passíveis de serem extraídos desse exame concorrem, ou não, para aliviar as preocupações com a possibilidade de as atuais pressões inflacionárias não serem passageiras. Essa é a questão a que nos dedicamos na presente seção.

Em toda parte, a pandemia derrubou a demanda e a oferta de trabalho. Nos Estados Unidos, a demanda por mão de obra já se recompôs, na esteira da expressiva retomada da procura por bens e serviços. Todavia, o mesmo não ocorreu com a oferta. Isso se constata quando se examina, por exemplo, o comportamento recente da taxa de participação na força de trabalho e da relação emprego/população.

No primeiro caso, pouco antes da pandemia, a taxa de participação estava em 63,4%. No pior momento, chegou a 60,2%. A recuperação foi apenas parcial, atingindo 61,6% em maio último. Quanto à relação emprego/população total, os percentuais correspondentes são 61,1%, 51,3% e 58,0%, respectivamente, nos mesmos pontos do tempo acima considerados.

Que fatores estariam inibindo a oferta de trabalho? Aparentemente, há três forças importantes. Primeiro, o medo de contrair a infecção. Preocupados em evitar a contaminação por Covid, muitos preferem não se expor, deixando de trabalhar. A segunda força tem a ver com on-line learning, ou seja, com o fato de o trabalho de pais e responsáveis ser prejudicado devido ao apoio que precisam dar às crianças que têm tido aulas on-line. Por fim, o generoso apoio federal aos mais atingidos pela crise, sob a forma de seguro-desemprego, funcionaria como elemento inibidor da oferta de trabalho. Evidência empírica a esse respeito, produzida no meio acadêmico, dá amplo respaldo a tal hipótese. As pessoas respondem a incentivos, diz um velho princípio da Economia.

O desequilíbrio a que aqui nos referimos, referente ao mercado de trabalho nos EUA, pode ser ilustrado com o auxílio da figura abaixo. O gráfico mostra como tem evoluído a relação entre o número total de desempregados e o número de vagas disponíveis. Como se pode constatar, tal relação experimenta queda acentuada nos últimos meses, tendo atingido patamar bem próximo do seu mais baixo ponto histórico.


Nota: dados mensais dessazonalizados. Últimos dados: abril/21. Fontes: BLS; Fed St. Louis.

Dado esse quadro, o que é possível esperar para o futuro próximo? A nosso ver, a chave da resposta está no processo de vacinação. Bem adiantado nos EUA, tal processo terá continuidade e acabará pondo fim (ou algo bem próximo disso) ao medo de contaminação. Além disso, permitirá a plena reabertura das escolas, liberando pais e responsáveis do apoio aos envolvidos no ensino on-line. Mas não será só isso. O seguro-desemprego oferecido pelo governo federal terminará em setembro, eliminando, assim, importante força inibidora da oferta de trabalho.        

Se a análise dessa seção estiver correta, as pressões salariais atualmente verificadas no mercado de trabalho americano tenderão a perder força, contribuindo para que o mesmo aconteça com a inflação de bens e serviços.


Este artigo é a reprodução da seção de Economia Internacional do Boletim Macro Ibre de junho/2021.

As opiniões expressas neste artigo são de responsabilidade exclusiva do autor, não refletindo necessariamente a opinião institucional da FGV.                                                                                                                  

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