Macroeconomia

O que vai acontecer com a poupança precaucional?

16 dez 2020

Quesitos especiais da Sondagem do Consumidor do FGV IBRE de outubro haviam indicado que cerca de 60% dos consumidores vêm postergando a compra de bens e serviços no país[1].

Essa postura cautelosa dos consumidores parece estar relacionada ao aumento da incerteza associada à pandemia de covid-19 e seus efeitos sobre a economia e a vida financeira das famílias, seja pelas dificuldades encontradas no mercado de trabalho seja pela redução da renda familiar.  Com a proximidade do fim dos benefícios, a preocupação termina por amplificar a tendência de postergação de consumo e de formação de poupança precaucional.

Em um quesito inédito da mesma Sondagem, em novembro 38% dos consumidores afirmaram que estão poupando de maneira preventiva devido à pandemia e seus efeitos na economia. Como seria de se esperar, a proporção de consumidores poupando de forma precaucional cresce conforme o nível da renda, ou seja, ela ocorre com maior frequência entre os mais ricos. Os recursos de poupança líquida aumentaram em 21% no período entre março e outubro, atingindo R$ 176 bilhões no acumulado até outubro. As perguntas que muitos economistas e analistas se fazem no momento é:  quando esses recursos serão utilizados? Será que eles conseguirão compensar o fim do período de concessão de auxílios emergenciais?

Realização de poupança precaucional devido à pandemia (em %)

A enquete mostra que 73% dos consumidores que conseguiram poupar até o momento pretendem manter estes recursos de reserva nos próximos meses, percentual que chega a 81,2% dos consumidores com menor poder aquisitivo. Cerca de 25% pretendem gastar parcialmente e apenas 1,4% pretende gastar totalmente esses recursos.

Intenção de gastos dos recursos de poupança (em %)

Na cabeça de 27% dos consumidores que pretendem gastar mais, os recursos serão utilizados no primeiro semestre de 2021. Com o fim dos benefícios emergenciais a partir do ano que vem, mais de 40% dos consumidores de renda mais baixa acreditam que o recurso terá que ser usado para cobrir gastos correntes. Diante de uma nova onda do vírus, as empresas temem em contratar e tornam ainda mais difícil para os consumidores voltarem ao mercado de trabalho. Dessa forma, além dos gastos correntes, boa parte dos (poucos) recursos poupados pelas famílias de renda baixa será utilizada em itens como a reforma de imóvel. Dado que esses consumidores são os que menos conseguiram poupar, o impacto no consumo será reduzido por esse lado.

Destino dos recursos poupados (em %)

De março ao início de novembro foram pagos R$ 248,3 bilhões para 67,8 milhões de brasileiros pelo governo na forma de benefícios emergenciais. Ainda que 27% dos recursos de poupança fossem usados para consumo, isso seria o equivalente a R$ 47 bilhões. Se fossem gastos conforme as respostas do quesito especial, cerca de 65% seria realizado nos próximos seis meses (R$ 31 bi) e cerca de R$ 14 bilhões seriam utilizados para despesas correntes, quitação de dívidas e pagamentos de imposto. O montante gasto nos seis primeiros meses seria inferior ao de um mês em média do benefício emergencial liberado às famílias em 2020, o que seria insuficiente para evitar a queda do consumo no primeiro semestre do ano. Os consumidores de baixa renda que têm recursos guardados possivelmente gastariam no início do ano suas reservas ao pagar despesas correntes. O prazo para gasto de suas reservas também é mais curto: dos 25,7% que possuem recursos guardados, 4,8% gastariam esses recursos e mais da metade gastaria nos próximos 3 meses com pagamento de despesas correntes, quitação de dívidas e impostos.

Período provável dos gastos (em %)

Para as famílias com maior poder aquisitivo, os recursos também podem ser direcionados para uma viagem de férias (24,6%), um alento para o segmento de serviços de alojamento e hospedagem que mais sofreu com a pandemia.

As opiniões expressas neste artigo são de responsabilidade exclusiva da autora, não refletindo necessariamente a opinião institucional da FGV.


[1] Com base em dados de uma prévia divulgada em 25 de outubro.

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