Macroeconomia

PIB do 3º tri e atualização do cenário IBRE: desaceleração no radar

4 dez 2020

O PIB do terceiro trimestre, divulgado nesta quinta-feira pelo IBGE, registrou avanço de 7,7% em relação ao segundo trimestre, permanecendo 3,9% abaixo do mesmo período do ano passado. O resultado surpreendeu negativamente as expectativas de mercado, cuja mediana se situava em torno de 8,7% TsT, mas veio em linha com as projeções do IBRE, divulgadas no Boletim Macro de novembro.

Os dados confirmaram a forte retomada do setor de bens, após o vale registrado no segundo trimestre. A indústria de transformação e o comércio já retomaram o patamar do início do ano, indicando que o robusto aumento de gastos do governo no combate à pandemia foi eficaz na sustentação da renda das famílias, impulsionando a demanda ao longo do terceiro trimestre. De acordo com nossos cálculos, a massa ampliada de rendimentos deve crescer 3,2% este ano, mas cairia 6% na ausência das intervenções do governo. Isto é, os auxílios mais do que compensaram a queda da renda neste ano, o que também se refletiu na forte alta do consumo das famílias no terceiro trimestre.

O desempenho dos serviços também foi favorável, com surpresas positivas na categoria de outros serviços e serviços da administração pública. A primeira inclui diversas atividades diretamente afetadas pela política de distanciamento social, como os serviços prestados às famílias, serviços prestados às empresas, saúde e educação privada, enquanto a segunda inclui saúde e educação pública, defesa e seguridade social.

O principal destaque negativo da divulgação ficou com a construção civil. Apesar do expressivo avanço retratado nos dados de venda e produção de materiais de construção, o resultado do PIB setorial veio abaixo das expectativas. De fato, a atividade informal das famílias e pequenos empreiteiros representa a maior parcela do consumo de materiais, enquanto o segmento empresarial responde por parcela mais expressiva do PIB setorial.  A recuperação mais tímida da construção civil se refletiu no resultado do investimento, que avançou 11% em relação ao segundo trimestre, ligeiramente abaixo de nossa expectativa. O resultado foi impulsionado pela forte retomada da produção doméstica de bens de capital.

Vale lembrar que todo terceiro trimestre ocorrem revisões nas séries históricas das CNT, quando os dados das contas anuais são incorporados. Com as atualizações, o PIB de 2019 foi revisto de 1,1% para 1,4%, com destaque para a revisão altista nos serviços, em especial nos serviços de informação e na categoria de outros serviços. Essas atualizações também impactaram os resultados deste ano. A queda do PIB do segundo trimestre foi um pouco menor do que anteriormente divulgado, passando de -11,4% AsA para -10,9% AsA.

Diante desses resultados, nossa projeção para o crescimento do PIB deste ano foi revista para -4,7%. A visão de copo meio vazio ficou com a indústria no quarto trimestre. Os dados divulgados nesta semana, referentes ao mês de outubro, ilustraram desaceleração generalizada entre as categorias da PIM-PF, com destaque para a freada brusca na produção de bens de consumo e bens intermediários. Atualizamos também o cenário para a construção civil, menos favorável nos próximos meses.

A redução do auxílio emergencial no quarto trimestre, em conjunto com a aceleração da inflação e as incertezas relacionadas ao aumento do número de casos de Covid-19 e à recuperação do mercado de trabalho, já provoca redução do ritmo de crescimento econômico. Esses fatores devem impactar diretamente o consumo de bens no final do ano, induzindo revisões baixistas em nosso cenário para a indústria e comércio. Por outro lado, o desempenho dos serviços deve ser um pouco melhor no quarto trimestre, dado o resultado mais positivo das categorias de outros serviços e serviços da administração pública, que juntas respondem por quase 50% dos serviços no PIB.

Para 2021, projetamos crescimento do PIB de 3,6%, diante do alto carregamento estatístico deste ano para o próximo. Estimamos significativa desaceleração do crescimento ao longo do primeiro semestre de 2021, com crescimento médio trimestral em torno de 0%, devido aos indícios de recrudescimento da pandemia no Brasil e a ausência das políticas de estímulo implementadas este ano. Portanto, as incertezas persistem e os riscos são de baixa. Afinal, as condições financeiras permanecem em patamar contracionista, e devem permanecer assim até a dissolução do impasse fiscal, dificultando a recuperação econômica ao longo dos próximos anos.


As opiniões expressas neste artigo são de responsabilidade exclusiva da autora, não refletindo necessariamente a opinião institucional da FGV 

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