Macroeconomia

Preço do petróleo: alternativa menos danosa parece ser acionar o “botão da calamidade pública”

10 mar 2022

A resposta do governo à escalada do preço do petróleo não deveria trazer distorções permanentes e custos fiscais em troca de um alívio incerto de curto prazo. A transferência dos dividendos da Petrobras para os mais pobres mantém o de bem-estar de quem mais precisa.

A resposta do governo à escalada do preço do petróleo não deveria trazer distorções permanentes e custos fiscais em troca de um alívio incerto de curto prazo. A transferência dos dividendos da Petrobras para os mais pobres mantém o de bem-estar de quem mais precisa.

O preço do petróleo (Brent) já escala para o nível de U$ 130 e a defasagem do preço da gasolina já se aproxima dos 45%, o que significa que o litro da gasolina já deveria estar chegando aos R$ 9, se a atual política de preços da Petrobras fosse respeitada.

Antes da invasão da Rússia à Ucrânia, com o Real apreciando, a fim de atenuar impactos econômicos advindos do aumento do preço dos combustíveis, as medidas pareciam restringir-se à implantação de monofasia e ad rem ao ICMS e desoneração do Diesel e do GLP (gás de cozinha).

De fato, o governo parecia haver afastado a possibilidade de implantação de fundo de estabilização dos preços dos combustíveis ou interferir na atual política de preços da Petrobras.  Nos dias recentes, porém, o noticiário mostra que não apenas essas alternativas voltaram a ser consideradas, mas também a possibilidade de se implementar um subsídio para reduzir o preço dos combustíveis, a exemplo do que foi feito em 2018, em decorrência da greve dos caminhoneiros.

Este texto busca explicar por que essas três alternativas ao choque do petróleo são danosas do ponto de vista da eficiência e distorções alocativas. Acreditamos que estas deveriam ser afastadas, tanto em decorrência da experiência recente quanto à grande probabilidade de serem ineficazes do ponto de vista de diminuir o impacto sobre o bem-estar da sociedade.

Ademais, defende-se que uma alternativa que, embora também danosa em termos fiscais, é superior a essas (em termos de eficiência e eficácia) que é disparar o “botão da calamidade pública (Art. 167-B da Emenda Constitucional 109, de 2021)” por 3 meses, transferindo para as famílias inscritas no Cadastro Único (que ganham até 3 salários mínimos de renda mensal) os R$ 37,3 bilhões que o Governo Federal recebeu em dividendos da Petrobras, decorrente do desempenho operacional  da empresa ano passado.

Dito isso, em primeiro lugar, destaca-se que o Fundo de estabilização é uma política fadada ao fracasso no Brasil. O histórico de políticas parecidas no Brasil (como a conta-petróleo) mostram que essas estabilizações não funcionam quando o preço cai. Ademais, é sempre complicado implantar uma política dessas, quando o preço está escalando, e não se sabe avaliar se haverá recursos suficientes no caixa para frear o possível impacto adicional dos próximos meses.

Em segundo, ressalta-se que interferir na atual política de preços da Petrobras afeta não apenas aos milhares de acionistas privados, mas também o principal acionista que é o Governo Federal, diminuindo os recursos para Saúde e Educação, assim como a possibilidade de transferência de recursos para os mais pobres, como proposto neste texto.

Além disso, é preciso lembrar que o setor de óleo está em processo de abertura desde 2016, com refinarias em processo de privatização. Neste caso, se houver interferência nos preços praticados pela Petrobras, haverá não apenas ineficiência e distorções no setor de Etanol, produto substituto da gasolina, mas também afetará as outras refinarias privadas e as que potencialmente desejam entrar nesse mercado, diminuindo substancialmente suas respectivas atratividades.

 Terceiro, a fim de afastar a possibilidade de subsídio financeiro para a Petrobras, produtores e importadores, assim como visar manter o preço em algum patamar, como em 2018, ressaltamos o potencial de “distorção de preços, destruição de valor, má alocação de recursos, criação de custos operacionais e de transação, judicialização e criação de esqueletos fiscais”, como destacado por Marcos Mendes em texto sobre a experiência de congelamento do preço do Diesel no governo Temer.

Por conseguinte, destinar os R$ 37,3 bilhões que o Governo Federal recebeu em dividendos da Petrobras ano passado para as pessoas que estão inscritas no Cadastro Único – aquelas que estão em famílias que ganham até três salários-mínimos, presentes nas classes D e E, parece-nos ser a solução mais assertiva. Protege os mais pobres em termos de perda de bem-estar, decorrente do encarecimento dos preços dos combustíveis e /ou dos alimentos, não dá subsídios aos relativamente ricos que possuem carro e não causam distorções nas atividades econômicas.

Em adição a esses ganhos, evitam-se reajustes na despesa com pessoal, em virtude das vedações previstas no art. 167-A da Constituição. Isso levará o governo Bolsonaro, ao longo de sua gestão, a promover ajuste fiscal nas duas principais rubricas orçamentárias (pelo lado da despesa) do governo federal: benefícios previdenciários (consequência da reforma feita em 2019 e da ausência de variação real do salário-mínimo) e despesa com pessoal.

Em suma, o atual conflito representa mais um choque de oferta, entre tantos outros vividos atualmente. A resposta do governo, por sua vez, não deve trazer distorções permanentes para o mercado de óleo brasileiro e custos às contas públicas em troca de um alívio incerto de curto prazo. A transferência dos dividendos da Petrobras apresenta-se como uma solução não distorciva e, de fato, mantém o nível de bem-estar de quem mais precisa.

As opiniões expressas neste artigo são de responsabilidade exclusiva do autor, não refletindo necessariamente a opinião institucional da FGV. 

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