Macroeconomia

As principais reações à crise do Covid-19

20 mar 2020

A crise do Covid-19 se espalhou no mundo. Uma pesquisa realizada pelo IGM Forum Survey mostra que entre os economistas europeus, 82% acreditam que a economia entrará em recessão. Entre os economistas norte-americanos, 62% acreditam nessa possibilidade. A cooperação federativa foi apontada como um ponto de vulnerabilidade importante sobre a capacidade de resposta europeia, um resquício da crise do Euro. A reação inicial consiste em dar liquidez imediata aos mercados, empresas e famílias.

Um fenômeno comum em crises é a fuga para a qualidade. Os capitais saem de países emergentes para os países desenvolvidos e de ativos mais arriscados para ativos seguros. Isso faz com que, nos países emergentes, a bolsa caia e as taxas de juros mais longas sobre títulos públicos se elevem ao passo que nos países desenvolvidos tanto bolsa quanto as taxas de juros mais longas caiam, denotando que todos os investidores buscam proteção em títulos públicos nos países desenvolvidos.

Na última semana, a lógica se inverteu e as taxas de juros de países desenvolvidos também subiram denotando um movimento de venda generalizada de ativos para garantir a liquidez dos agentes econômicos que preveem dias muito difíceis e necessidade de reforçar o caixa.

Os principais Bancos Centrais do mundo entraram no jogo oferecendo liquidez aos mercados. O FED cortou a taxa de juros para zero, injetou U$S 1,5 trilhão na economia em três dias e anunciou um programa de relaxamento quantitativo de US$ 700 bilhões. O Banco da Inglaterra reduziu as taxas de juros para 0,25% e anunciou um programa de expansão de crédito próximo a £100 bilhões com incentivos para operações de crédito para médias e pequenas empresas.

O Banco Central Europeu anunciou operações de refinanciamento em termos favoráveis, liberou o limite de capital dos bancos e anunciou que irá comprar €120 bilhões de ativos até o fim do ano. Apesar de todo esse esforço, o mercado reagiu mal ao anúncio, pois a presidente do BCE, Christine Lagarde, afirmou não haver disposição de fechar os spreads de juros. O anúncio colocou em dúvida a disposição do BCE em oferecer suporte aos mercados e os prêmios de risco dos países com maior nível de endividamento, como Itália, Espanha e Portugal, disparou. Os bancos centrais se coordenaram para oferecer swaps.

Da mesma forma, as ações de política fiscal focam quase que exclusivamente em oferecer recursos para ampliação dos sistemas de saúde e para enfrentar os problemas de liquidez que não são cobertos via política monetária.

O Tesouro Britânico anunciou um pacote temporário de £12 bilhões para ampliar gastos com saúde e manter o funcionamento de serviços públicos em nível local. As pequenas e médias empresas serão compensadas pelos funcionários doentes, terão descontos sobre os impostos e receberão garantias para empréstimos decorrentes de interrupção das atividades.

O Ministro da Economia alemão afirmou que oferecerá recursos ilimitados para evitar o estrangulamento financeiros das empresas por meio do KFW (equivalente alemão do BNDES). Nesse primeiro estágio há disponibilidade de € 460 bilhões que podem ser elevados em € 93 bilhões no curto prazo. Além disso, anunciou subsídios aos trabalhadores que reduzirem a jornada de trabalho e que o pagamento de impostos será adiado.

Nos EUA, o CBO estima que a crise elevará os gastos públicos em US$ 7,8 bilhões pelo aumento na demanda por serviços públicos. Trump proporá a postergação de impostos e oferecerá R$ 50 bilhões para pequenas e médias empresas por meio da SBA, uma agência federal de crédito para empresas desse porte. Os elevados custos médicos podem falir várias famílias e dificultar o gerenciamento da crise impedindo a retomada da economia. Por conta disso, em um exemplo de cooperação bipartidária, a Presidente da Câmara, filiada ao Partido Democrata, Nancy Pelosi tem coordenado esforços para aprovar uma nova lei que ajude as pessoas mais necessitadas ampliando os fundos públicos em US$ 8,3 bilhões. O senador Mitt Romney propõe a distribuição US$ 1.000 por mês a cada adulto durante a crise.

Existem várias implicações para a gestão da crise no Brasil. Em primeiro lugar, os esforços para disponibilização de mais liquidez precisam ser ainda maiores. Essa crise atinge a economia de forma muito heterogênea e é preciso apresentar ações para vários problemas. Em segundo lugar, a questão federativa está esquecida. Alguns estados e municípios encontram-se com finanças muito frágeis e poderá faltar profissionais, equipamentos, atrasos salariais e as unidades de atendimento estão sucateadas. Esse tema é um fator desfavorável e uma solução precisa ser desenhada imediatamente. Em terceiro lugar, é necessário promover maior coordenação política. O governo terá que aprovar leis com tempestividade e o Congresso deve ser parceiro, evitando pautas despropositadas.

Há importante discussão sobre investimentos públicos e mudanças de regras fiscais que abram espaço para isso, pois falta infraestrutura no país, inclusive para ampliação dos serviços de saúde. Esse debate irá crescer, pois a crise deve perdurar por tempo suficiente para o estrago econômico ser expressivo. Por enquanto, viveremos alguns meses em um cenário que se assemelha à guerra.


Este artigo foi originalmente publicado pelo Broadcast da Agência Estado em 18/03/2020.

As opiniões expressas neste artigo são de responsabilidade exclusiva do autor, não refletindo necessariamente a opinião institucional da FGV. 

 

 

 

 

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