Macroeconomia

Produtividade e bem-estar econômico

5 set 2022

Com evidências de forte associação entre alta da produtividade e bem-estar econômico  e fim do bônus demográfico –, acelerar produtividade é essencial para melhorar padrão de vida da população brasileira nas próximas décadas. 

Uma frase famosa de Paul Krugman diz que “Produtividade não é tudo, mas no longo prazo é quase tudo. A capacidade de um país de melhorar seu padrão de vida ao longo do tempo depende quase inteiramente da sua capacidade de aumentar o produto por trabalhador” (tradução livre).

No relatório que analisa a série de produtividade anual da economia brasileira, que se encontra disponível no Observatório da Produtividade Regis Bonelli do FGV IBRE, comparamos a trajetória entre a produtividade por hora trabalhada e uma medida de bem-estar econômico, dada pela renda per capita, entre 1981 e 2021.

Além da produtividade por hora trabalhada, a renda per capita depende da jornada média de trabalho, que equivale à média de horas por pessoal ocupado. Outro fator relevante é a taxa de ocupação, que corresponde à proporção de trabalhadores ocupados em relação à população economicamente ativa. Um terceiro determinante é a taxa de participação, caracterizada pela razão entre a população economicamente ativa e a população em idade ativa. Finalmente, a razão entre a população em idade ativa e a população total é uma medida da contribuição do bônus demográfico para o crescimento da renda per capita.

Com base na trajetória dessas variáveis nas últimas décadas, fizemos um exercício de decomposição do crescimento da renda per capita nos seus diversos componentes. Entre 1981 e 2021, enquanto a renda per capita cresceu 0,8% ao ano (a.a.), a produtividade por hora trabalhada avançou 0,6% a.a., evidenciando a relação estreita entre produtividade e bem-estar no longo prazo.

Além do modesto crescimento da produtividade, o crescimento da renda per capita foi beneficiado pela rápida expansão da população em idade ativa em relação à população (bônus demográfico), que aumentou 0,4% a.a. no período. Outra contribuição positiva para o crescimento da renda per capita foi o aumento da taxa de participação a uma taxa de 0,3% a.a., refletindo a incorporação de mais pessoas à atividade econômica. No entanto, a queda da jornada média de trabalho (-0,3% a.a.) e a redução da taxa de ocupação (-0,2% a.a.) atuaram no sentido de reduzir o crescimento da renda per capita.

Outra evidência da forte conexão entre produtividade e bem-estar é o fato de que períodos de aumento mais rápido da renda per capita estão associados a uma aceleração do crescimento da produtividade. Por exemplo, entre as décadas de 1990-2000 e 2000-2010 o crescimento da renda per capita aumentou de 1% a.a. para 2,3% a.a. (variação de 1,3 pontos percentuais). Entre essas duas décadas, o crescimento da produtividade por hora trabalhada acelerou de 0,7% a.a. para 1,6% a.a. (variação de 0,9 p.p.).

Embora a produtividade seja fortemente correlacionada com a renda média da economia, sua melhoria não beneficia necessariamente todas as faixas de renda na mesma proporção, devido à desigualdade na distribuição dos rendimentos.

Para captar esse efeito, um estudo recente para o Reino Unido, de autoria de Nicholas Oulton (“The Link Between the Standard of Living and Labour Productivity in the UK: A Decomposition”), fez uma decomposição similar à que fizemos para o Brasil, mas acrescentando um componente relacionado à desigualdade da renda disponível.

Para isso, o autor utilizou como medida de bem-estar a mediana da renda domiciliar disponível por adulto equivalente. A renda disponível inclui transferências do governo e deduz o pagamento de impostos. O ajuste por adulto equivalente considera o fato de que crianças consomem menos calorias que adultos. Finalmente, ao considerar a mediana e não a média, o indicador leva em conta o fato de que, em situações de elevada desigualdade, a renda média pode crescer sem beneficiar o indivíduo típico, que se encontra na mediana da distribuição de renda.

Os resultados mostram que o crescimento da produtividade por hora trabalhada explica cerca de 92% do crescimento do bem-estar no Reino Unido entre 1977 e 2019. Enquanto a queda das horas trabalhadas contribuiu negativamente, as demais variáveis relacionadas ao mercado de trabalho (taxa de participação, taxa de ocupação e bônus demográfico) tiveram contribuição positiva, embora pouco significativa. Já o aumento da desigualdade reduziu o impacto positivo da produtividade sobre o bem-estar.

Portanto, as evidências apontam claramente para uma forte associação entre crescimento da produtividade e bem-estar econômico. Diante do fim do bônus demográfico, acelerar o crescimento da produtividade será fundamental para melhorar o padrão de vida da população brasileira nas próximas décadas.


As opiniões expressas neste artigo são de responsabilidade exclusiva do autor, não refletindo necessariamente a opinião institucional da FGV. 

Este artigo foi originalmente publicado pelo Broadcast da Agência Estado em 02/09/2022.

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