Quais são as consequências da decisão de Trump de elevar tarifas sob a égide da Seção 201?
Em artigo publicado na Revista Conjuntura Econômica de novembro de 2017, tratamos das investigações iniciadas no governo Trump que representavam os primeiros testes do viés protecionista do seu governo e estavam direcionadas principalmente para a China. A investigação sobre transferência de tecnologia (Seção 301) foi tratada aqui em post de 13/11/2017 e até o momento não foi concluída. As duas outras se referem à importação de painéis solares e máquinas de lavar sob a égide da Seção 201 e os resultados foram anunciados no dia 22/01/2018.
O que é a Seção 201? Se uma empresa e/ou setor acha que está sendo prejudicado pela entrada de importações, pode requer a abertura de uma investigação que é conduzida pela Comissão Internacional do Comércio (ITC, International Trade Commission). Se a ITC concluir que as importações causam sério dano à indústria doméstica e são a principal causa para este dano, poderá propor aumento na tarifa de importação, cotas, acordos de ordenação do mercado, medidas de ajustamento para o setor (financiamento) ou para os trabalhadores (treinamento para novas funções). É da competência exclusiva do Presidente decidir que medida irá adotar, sendo também possível fazer uma negociação com o parceiro comercial. Quaisquer medidas, no entanto, têm prazo de duração no máximo de quatro anos.
Trump optou por elevar as tarifas de importações. No caso das máquinas de lavar, foi estabelecida uma tarifa de importação que é de 50% em 2018 e cai até 45% em 2020, caso seja ultrapassada a cota de 1,2 milhão de unidades. Para importações dentro da cota, a tarifa começa em 20% e cai para 16%. No caso dos painéis solares, a tarifa para importações acima de 2,5 gigawatts inicia-se em 30% e chega em 2021 a 15%. A tarifa aplicada para máquinas de lavar foi acima da prevista e para os painéis solares foi menor, o que, segundo notícias veiculadas na imprensa dos Estados Unidos, desagradou às indústrias nos dois setores.
É importante enfatizar que as medidas não afetam apenas a China. Outros países, cujas exportações para os Estados Unidos foram entendidas como fatores de dano para a indústria, também foram penalizados. No caso das máquinas de lavar entraram o México, Coreia do Sul e Tailândia. No caso dos painéis solares, México, Canadá, Coreia do Sul, Tailândia e Filipinas.
Chamam atenção alguns pontos.
Primeiro, ter acordo de livre comércio com os Estados Unidos, como México, Canadá e a Coreia do Sul possuem, não garante fórum privilegiado na hora de imposição de penas no comércio. Os acordos possuem mecanismos de solução de controvérsias e veremos se os parceiros irão questionar os Estados Unidos.
Segundo, possivelmente os países menores, como a Tailândia e as Filipinas, serão mais prejudicados do que o principal alvo, a China. Esta pode desviar investimentos desses países e do seu próprio território para outros países ou mesmo para os Estados Unidos. O governo americano tem um comitê de monitoramento para entrada de investimento, mas proibir entrada de capital para abrir empresas que não ameaçam a segurança nacional e criam emprego poderá não ser uma decisão popular.
Terceiro, é condizente com Trump onerar o custo de energia renovável. Observa-se, porém, que haverá perda de empregos no setor de serviços, pois as instalações e a manutenção dos painéis são feitas por empresas estadunidenses. Além disso, o aumento nos preços dos painéis com o recuo das importações irá desestimular o uso das energias limpas e reforça a contribuição negativa dos Estados Unidos na questão ambiental.
Quarto, a decisão de Trump poderá incentivar uma onda de demandas de investigações da Seção 201. Dos 74 casos da Seção 201 já investigados desde a sua criação em 1974, 40 foram positivos, mas o presidente somente concedeu restrições às importações em 19 investigações. Isso mostra que o Executivo foi cauteloso para não ensejar uma onda protecionista, o que parece não ser o caso de Trump.
Por último, há rumores de que a indústria siderúrgica poderá acionar a Seção 201. Este é um setor com forte lobby político e tradicionalmente demandante de proteção. Nesse caso, o Brasil precisa ficar atento. Em 2017, os semimanufaturados de ferro e aço foram o terceiro principal produto exportado do Brasil para os Estados Unidos.
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