Repartição Versus Capitalização
A previdência brasileira funciona em um sistema de repartição, no qual os trabalhadores contribuem para o pagamento dos aposentados. Devido ao envelhecimento populacional, o atual sistema não se sustenta e demanda reformas urgentes, como a proposta pelo governo. Entretanto, a reforma não solucionará todos os problemas. Primeiramente, como é praxe nos processos democráticos, a reforma proposta sofrerá alterações, reduzindo as “correções” propostas e, desta forma, diminuindo seu alcance. Em segundo lugar, assim como ocorre no resto do mundo, o processo de envelhecimento populacional demandará outros ajustes no futuro: elevações de idade mínima, redução de benefícios e aumento de contribuições. Este é somente o primeiro passo.
Com a proximidade da avaliação da proposta de reforma, mais tem se debatido a alternativa (não prevista na reforma) de uma mudança do sistema de repartição pura para um sistema parcial de capitalização, no qual cada trabalhador possui sua própria conta. O novo sistema combinaria contas individuais, uma parte de repartição e uma outra de transferência incondicional de renda. Este sistema resolveria problemas futuros relativos ao envelhecimento populacional, ligando o benefício diretamente à contribuição realizada. A grande maioria dos economistas apoia este sistema que liga contribuição ao benefício, protege os mais pobres e garante a solvência futura. Por que não foi proposto algo similar na atual reforma?
Como diz o ditado, o diabo mora nos detalhes. A transição do sistema atual para o descrito acima é muito custosa. O Estado teria que pagar integralmente o pagamento dos benefícios previdenciários dos atuais aposentados e daqueles próximos à aposentadoria, pois ambos não possuem contas individuais. Com uma transição de pelo menos 20 anos, teríamos uma conta de cerca de 12% do PIB ao ano (custo atual dos benefícios,) gerando um custo total de mais de dois PIBs. Na atual situação fiscal do país, isto não parece possível.
Para piorar, a Previdência hoje é um paciente com uma doença crônica que está em cirurgia de urgência. A aprovação de pontos como a idade mínima é tão polêmica quanto urgente. O aparecimento de outras propostas será utilizado por muitos como uma cortina de fumaça com o objetivo de não se aprovar nada. A proposta efetivamente na mesa garante a solvência do sistema por mais algumas décadas e reduz o passivo a ser pago em caso de uma transição para o sistema de capitalização. Primeiro, portanto, vamos estabilizar o paciente e depois decidir o melhor tratamento de longo prazo. Antecipar a discussão pode matar o paciente.
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