Macroeconomia

Riscos fiscais se avolumam

14 out 2021

Com impasse no orçamento, riscos fiscais continuam crescendo e ultrapassam R$ 70 bilhões. Bola da vez é discussão sobre preço dos combustíveis. Emenda Emergencial não contribuiu para esforço fiscal e há dúvidas sobre como a política fiscal será conduzida depois das eleições.

O orçamento entrou em uma fase de definições. Os índices de inflação irão superar as estimativas do Governo, elevando as despesas vinculadas ao salário mínimo em R$ 18,5 bilhões. A renovação da desoneração da Folha gera uma compensação ao INSS que deve custar R$ 6 bilhões. A ampliação do público do Bolsa Família e o valor médio do benefício pode custar pelo menos R$ 18 bilhões. O projeto do imposto de renda deve reduzir as receitas em R$ 25 bilhões (até o momento). Acrescentado a derrubada do veto ao Fundo Eleitoral, os riscos fiscais conhecidos somam aproximadamente R$ 70 bilhões.

O governo precisa encontrar espaço no orçamento para acomodar essas demandas. A solução que ganhou mais apoio político parece ser a que posterga o pagamento de precatórios que gera outro risco fiscal por criar uma bola de neve para os próximos anos.

Um novo risco fiscal, que é nosso velho conhecido, bateu na porta. Com a depreciação cambial e recuperação do preço do petróleo, o preço dos combustíveis disparou.

No caso dos combustíveis já se tentou de tudo um pouco. Adotou-se uma política de suavização de preços pela Petrobrás afetando o retorno de seus acionistas. O outro extremo, de liberalização total, adotado pelo Governo Temer, parou o país por quase um mês e trouxe um importante passivo fiscal. A solução da época foi subsidiar os combustíveis reduzindo impostos e subvencionando os preços com recursos do orçamento.

A ideia do momento é criar um fundo de suavização. A vantagem do fundo é que não cria apenas impacto negativo sobre as contas públicas, como adotado pelo Governo Temer, pois seria possível compensar a perda recuperando o fundo quando o preço dos combustíveis voltar a cair. Existe experiência internacional favorável à prática, mas é possível que a economia política desvie o fundo de sua finalidade. No caso, uma boa governança é importante.

Além dos riscos orçamentários para 2022, existe o risco de médio prazo para as finanças públicas que consiste em saber como o equilíbrio fiscal será construído ao longo dos próximos anos. Nas últimas semanas, os assessores econômicos dos candidatos se pronunciaram sobre o tema.

No caso do PT, candidatura que lidera as intenções de voto, a proposta seria estipular uma regra fiscal em que a despesa possa crescer junto com o PIB a ser renovada a cada quatro anos. A proposta expressa pelo assessor econômico do candidato do PDT, Deputado Mauro Benevides, é a de retirar os gastos com investimentos do teto.

A pré-candidatura Eduardo Leite do PSDB defendeu a manutenção do teto com expansão de gastos sociais e ampliação da proteção ambiental, mas não explicou como vai conseguir fazer isso. Talvez ainda falte um pouco de conhecimento do que está acontecendo.

Por fim, temos o plano Bolsonaro-Guedes que consiste em empurrar o teto com a barriga até que as pessoas percebam que o teto não existe mais. Essa estratégia está criando crises orçamentárias anuais. A incerteza nesse horizonte mais longo parece inevitável.

Sem crescimento econômico, o ajuste fiscal termina logo ali, no infinito. Apesar da reforma da previdência, uma política austera de pessoal e cortes em gastos produtivos como em ciência e educação, os riscos se avolumam. Emendas parlamentares de relator, a antirreforma do imposto de renda e o crescimento dos precatórios eliminam o espaço para a ampliação da proteção social em um país que empobrece.

A Emenda Constitucional da Emergência Fiscal se mostrou uma grande perda de tempo. Não ofereceu instrumento de gestão fiscal relevante para lidar com as emergências do presente momento. O fiscalismo de resultados que empilha regras e mais regras e que prefere discutir a forma ao invés do conteúdo só tem gerado frustração de expectativas.

Enquanto problemas antigos esperam por soluções, os desafios da pandemia pressionam. Em um mundo de expansão fiscal e previsível aperto monetário, a taxa de câmbio dos países desenvolvidos se fortalece, causando depreciação nos emergentes. Assim, a correlação histórica entre termos de troca e taxa de câmbio desaparece, no curto prazo, e pressiona a inflação. Em resposta, as taxas de juros sobem, elevando ainda mais o risco fiscal.

A eleição está muito distante para o país ficar à mercê da maré. Podemos dar sorte, mas normalmente ela acompanha quem trabalha com bom diagnóstico, mantém algum sentido de direção e apresenta um caminho objetivo com menos ideologia do que assistimos nos últimos anos. Nossos desafios estão cada vez mais velhos.


Este artigo foi publicado pelo Broadcast da Agência Estado em 13/10/2021, quarta-feira.

As opiniões expressas neste artigo são de responsabilidade exclusiva dos autores, não refletindo necessariamente a opinião institucional da FGV. 

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