Desaceleração à vista
Crescimento brasileiro no 1º tri foi muito influenciado pelo quadro externo favorável, o qual não deve se manter nos próximos trimestres, pois a desaceleração esperada para a economia mundial também deve ser expressiva.
Após um primeiro trimestre que confirmou resultado positivo para o crescimento do PIB de 1% (TsT), em linha com a previsão do Boletim Macro FGV IBRE de 0,9%, esperamos desaceleração da atividade econômica ao longo dos próximos trimestres e em 2023. Ou seja, não compartilhamos do mesmo otimismo de alguns agentes de mercado, que têm revisto para cima de forma significativa suas projeções de crescimento do PIB em 2022.
É verdade que o primeiro semestre deste ano tem sido marcado por bom desempenho da atividade, mas isso se deve a fatores temporários, como a reabertura da economia, a normalização dos serviços públicos, os estímulos fiscais e a expressiva alta nos preços das commodities. De fato, ainda que já antes avaliássemos que não haveria recessão na economia brasileira este ano, reconhecemos que a resiliência da atividade no curto prazo tem surpreendido.
Ocorre, porém, que são impulsos bem transitórios. Na ausência de novos estímulos, o que irá predominar cada vez mais é a política monetária crescentemente restritiva, que, como sempre, deverá impactar a economia com alguma defasagem.
Também a dinâmica econômica no resto do mundo irá contribuir para essa desaceleração. O crescimento econômico brasileiro no primeiro trimestre foi significativamente influenciado pelo quadro externo favorável, o qual não deve se manter nos próximos trimestres, pois a desaceleração esperada para a economia mundial também deve ser expressiva. Recentemente, a OCDE reduziu as perspectivas de crescimento mundial para 3% em 2022, ante projeção anterior de 4,5%. Para 2023, a previsão agora é de 2,8%.
O que se observa lá fora é efetivamente um cenário que também tem sido bem desfavorável para o controle da inflação. De fato, as pressões inflacionárias globais têm desencadeado reações nos principais bancos centrais do mundo. Em particular, o Banco Central Europeu (BCE) não apenas anunciou o fim do programa de compras de ativos, mas também vai iniciar o aperto monetário em julho. Adicionalmente realizou reunião extraordinária para avaliar as formas de conter o aumento da taxa de juros nos países periféricos da região. Por sua vez, o Fed confirmou o aumento da taxa de juros de 75 b.p. Em resumo, o movimento de subida de juros está se generalizando, e as condições monetárias internacionais estão ficando bem mais restritivas que o previsto pelo mercado.
Lá fora, como aqui, o aperto monetário vai contribuir para uma expansão mais lenta da atividade. Projeções para a inflação indicam uma taxa de quase 9% nos países da OCDE este ano, o dobro do projetado alguns meses atrás. Para enfrentar esse quadro, a OCDE recomenda que, mesmo a política monetária não podendo enfrentar os choques de oferta, ela deveria enviar sinais de que não permitirá a inflação se elevar ou se espalhar ainda mais. Ou seja, na maior parte das economias a normalização da política monetária deverá prosseguir nos próximos 18 meses, de acordo com o relatório.
O quadro atual é bem desafiador para os bancos centrais, pois a perspectiva da queda de juros vai demorar muito tempo para ser vislumbrada, visto que a inflação não deve ceder rapidamente, mesmo com a atividade econômica mais fraca.
Porém, mesmo com maior risco de recessão mundial, no curto prazo o crescimento global tem se mostrado resiliente, principalmente nos EUA e Europa. E, na China, a reabertura da economia e os estímulos do governo deverão evitar desaceleração mais forte, em linha com afirmações do primeiro-ministro Li Keqiang indicando que medidas pró-crescimento devem ser tomadas para garantir “crescimento econômico razoável”.
Esse cenário já estava bem mapeado pelos Barômetros Globais que, apesar de fecharem relativamente estáveis em junho, registraram quedas expressivas nos dois meses anteriores. O Barômetro Coincidente subiu um pouco em junho e sustenta nível compatível com o crescimento moderado da economia mundial no segundo trimestre. Já́ a estabilidade do Barômetro Antecedente no mês continua a refletir perspectiva pessimista para o crescimento econômico global nos próximos meses.[1]
Tudo isso faz com que o cenário externo para os países emergentes esteja mudando rapidamente, sendo que apenas para os países produtores de commodities há certa atenuação do choque negativo. Não se pode descartar crises de financiamento externo em algum dos países mais vulneráveis à forte redução da liquidez internacional.
No Brasil, o quadro se complica com a aprovação de desonerações tributárias para conter, principalmente, os preços dos combustíveis, o que não apenas elevou os riscos fiscais, como também deteriorou as expectativas inflacionárias para o ano que vem e impactou as ações da Petrobras. Em meio ao fortalecimento internacional do dólar, o real sofreu bastante, terminando a semana acima de R$ 5,13/US$, patamar bem superior ao registrado no final do mês de abril (R$ 4,73/US$). E a deterioração do quadro recente levou a autoridade monetária a sinalizar novo ajuste na taxa de juros, de igual ou menor magnitude, na próxima reunião em agosto.
Com as informações relativas ao segundo trimestre, revisamos a projeção de crescimento do PIB em 2022 de 0,7% para 0,9%, pois nossa avaliação é que o primeiro semestre deve ter crescimento um pouco mais robusto do que se esperava anteriormente. Apesar disso, esperamos forte contração da atividade no segundo semestre, e as projeções para o ano se mantêm abaixo de 1%. O impulso negativo que vem da política monetária mais apertada deverá ser sentido com mais intensidade nos próximos meses, pois a taxa de juros real entrou em patamar contracionista apenas no final de 2021
Leia aqui o artigo completo na versão digital do Boletim Macro de junho/2022.
As opiniões expressas neste artigo são de responsabilidade exclusiva dos autores, não refletindo necessariamente a opinião institucional da FGV.
[1] Os Barômetros Econômicos Globais são um sistema de indicadores que permite análise tempestiva do desenvolvimento econômico global. Eles representam colaboração entre o Instituto Econômico Suíço KOF da ETH Zurique, na Suíça, e a Fundação Getulio Vargas (FGV). Ver https://portalibre.fgv.br/sites/default/files/2022-05/barometros-globais....
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