Nível de incerteza se mostra resiliente à queda
Indicador de Incerteza desde 2015 tem se mantido alto, por fatores econômicos, políticos e institucionais. Tantos anos girando em nível elevado levam à indagação sobre “novo normal”, dado o equilíbrio dos fatores mencionados.
O Indicador de Incerteza da Economia da FGV tem apresentado resistência em recuar de forma sustentável para níveis inferiores aos 110 pontos desde a crise de 2015-2016. Pela métrica histórica, indicadores acima dos 110 pontos expressariam incerteza econômica elevada no país, por estarem mais de um desvio padrão acima do nível neutro de 100 pontos.
Em fevereiro passado, o IIE-Br bateu em 111,7 pontos chegando a flertar com a proximidade de um nível confortável de incerteza, mas logo voltou a disparar em março, para 116,7 pontos, a reboque das incertezas domésticas relacionadas ao debate entre o governo e o Banco Central, e das incertezas externas atribuídas à crise bancária nos EUA e na Europa. A última vez que o indicador marcou nível inferior a 110 pontos foi em novembro de 2019 (105,1 pts.).
O período de alta incerteza já dura tanto tempo que suscita dúvidas se este não seria um “novo normal” dadas as condições possíveis de equilíbrio político, econômico e institucionais do país. Este artigo pretende investigar por que o retorno e a manutenção de patamares confortáveis de incerteza econômica, como na maior parte do período anterior à 2015, tem sido tão difícil nos últimos anos.
Fonte e Elaboração: FGV
Após o pior momento da pandemia, a lenta queda do indicador e sua manutenção em patamares elevados podem ser explicadas por quatro fatores, aqui expostos: (i) diálogo precário entre as esferas do governo no combate à pandemia; (ii) choques políticos em meses específicos; (iii) piora do quadro macroeconômico; (iv) debate sobre a trajetória da dívida pública brasileira.
Após alcançar mais de 200 pontos em abril de 2020, o IIE-Br registrou lenta queda do nível de incerteza no biênio 2020-2021, influenciado pelo cenário de crise sanitária mundial, mas também pelo diálogo precário e ambíguo entre as esferas do governo brasileiro no combate à pandemia. Esta análise foi feita em artigo divulgado neste Blog em maio de 2021. Durante esse período o Indicador de Incerteza registrou uma média de 143,6 pts.
A partir de 2022, a pandemia foi perdendo protagonismo, mas a piora do quadro macroeconômico, tanto doméstico quanto internacional, ajudou a manter o nível de incerteza elevado e em recuo gradual. Desbalanceamento das cadeias de suprimento globais, guerra no Leste Europeu e eleições presidenciais ao final de 2022 também influenciaram esse cenário, contribuindo para a manter a elevada média de 115,7 pontos do IIE-Br entre janeiro de 2022 até março de 2023, última informação disponível.
O IIE-Br disparou ainda em alguns momentos devido a ruídos políticos específicos, como em setembro de 2021 e janeiro de 2023, quando ocorreram as manifestações de apoiadores do governo Bolsonaro contra o STF e o Congresso e atos antidemocráticos em Brasília, respectivamente; um ruído de incerteza não tão facilmente revertido e que contribui para criar um ambiente de insegurança pouco propício a investimentos. Com tantos fatores, não é de se surpreender que o indicador tenha se mantido elevado e em recuo gradual.
Com relação ao cenário fiscal, as incertezas sempre estiveram no radar desde meados de 2015, mas com o início da pandemia, esse quadro se deteriorou ainda mais. Este também pode ser considerado um fator a contribuir para os níveis insatisfatórios do indicador e tem sido uma das fontes principais para o aumento e manutenção da incerteza no País nos últimos meses.
Resultados Recentes
Desde setembro passado, o IIE-Br vinha registrando níveis inferiores aos 115 pontos, algo que não acontecia por pelo menos três meses seguidos desde o momento anterior à pandemia. O IIE-Br, contudo, não cedeu para baixo dos 110 pontos. O debate recente sobre as contas públicas e o desenrolar das políticas econômicas do governo têm influenciado esse resultado, impulsionado pela piora do Indicador de Incerteza Fiscal que, desde novembro do ano passado, é superior ao Indicador de Incerteza Política. A diferença entre ambos os indicadores atingiu 12,7 pontos em dezembro de 2022, maior amplitude desde dezembro de 2020 (15,3 pontos).
Fonte e Elaboração: FGV
Com a troca de governo, o debate em torno do novo arcabouço fiscal alinhado às responsabilidades fiscais e às necessidades sociais tem tomado o noticiário econômico e influenciado na manutenção em nível elevado da incerteza recente no Brasil.
No fim de março, o governo encaminhou o projeto de ancoragem fiscal que combina curva da dívida, superávit e controle dos gastos públicos. Através do Prisma Fiscal, um sistema de coleta de expectativas de mercado disponibilizado pelo Ministério da Economia, é possível acompanhar a evolução das principais variáveis fiscais brasileiras sob a ótica do setor privado.
As previsões de março indicaram queda do resultado primário do Governo Central de R$ 109,6 para R$ 99,0 bilhões em 2023, redução de 10% que ocorre após uma queda de 13% das previsões coletadas em fevereiro.
Fonte: Prisma Fiscal, Ministério da Economia. Elaboração: FGV
O resultado reflete uma melhora consecutiva das previsões de mercado para o primário, consequência da sinalização do Ministério da Fazenda ao apresentar a nova regra fiscal do País. Até meados de março, o Indicador de Incerteza em frequência diária chegou a sinalizar um recuo mais promissor, inclusive para níveis inferiores a 110 pontos, motivado pela amenização dessas incertezas fiscais e por níveis de incerteza política mais confortáveis. Mas o nível inferior a 110 pontos não se concretizou no fim do mês, como já mencionado anteriormente no texto.
Diante disso, o nível de resiliência do indicador de incerteza em níveis desconfortáveis passa a depender da conjectura de um cenário de maior estabilidade política e retomada econômica, com foco nas questões sociais concomitantes à responsabilidade fiscal, criando assim um quadro mais favorável para a redução sustentável do indicador ao longo de 2023. Parece um passo muito largo para o indicador – que apresenta níveis elevados por muitos anos –, mas não impossível.
As opiniões expressas neste artigo são de responsabilidade exclusiva da autora, não refletindo necessariamente a opinião institucional da FGV.
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