Resoluções conjuntas BCB/CMN avançam na Prevenção à Lavagem de Dinheiro (PLD)

Este ano tem havido vários progressos regulatórios do Banco Central, especialmente em Prevenção à Lavagem de Dinheiro. Ainda resta muito a ser feito, mas há que se reconhecer os passos bastante positivos tomados pela Autoridade Monetária.
Foram divulgadas as Resoluções Conjuntas BCB/CMN 16, 17 e 18 de 28/11/2025. Foram importantes avanços principalmente na Prevenção à Lavagem de Dinheiro, mas também do ponto de vista prudencial. Este ano, em dois artigos na minha coluna mensal no Broadcast discuti aspectos correlatos. Os problemas do Banco Master haviam ficado bem explícitos depois do anúncio de uma reunião de Gabriel Galípolo com representantes de grandes bancos em um sábado, dia 5 de abril deste ano. Por esta razão escrevi o primeiro artigo sobre o assunto em abril. Aliás, em 21/11 o Bacen decretou a liquidação do Banco Master. Neste texto de abril, comento sobre uma série de medidas necessárias para o aprimoramento do ambiente regulatório prudencial e de PLD do sistema financeiro nacional. Abaixo segue a citação ao pé-da-letra de parte do artigo:
“A segunda grande revolução veio com as IP’s e SCD’s, e outras “fintechs” que começaram com um arcabouço regulatório em que o princípio de KYC (conheça seu cliente), essencial para a PLD (Prevenção à Lavagem de Dinheiro), era menos rigoroso que as regras bancárias tradicionais existentes. Isto pode ser plenamente justificado para fomentar ideias novas de competição, como nos “sandboxes”. Na esteira do sucesso da introdução destas entidades e do grande aumento da competição financeira, muita inventividade foi sendo posta em prática. Foi-se criando uma cadeia de empresas que proveem parte dos serviços outrora fornecidos pelos bancos tradicionais. Alguns exemplos são os serviços de BaaS (banking as a service), as fintechs que são subcredenciadoras (muitas vezes não reguladas pelo Bacen), as “exchanges” de criptomoedas, empresas que prestam serviços totalmente acessórios ao setor financeiro oferecendo contas “ônibus” (contas em que diversas subcontas recebem ou pagam e apenas a conta ônibus registra o saldo), e outras instituições não reguladas pela autoridade monetária que usam a palavra “banco”, “bank”, “banc”, “banca” ou afins no nome. Por sinal este último caso é muitíssimo preocupante e causa uma enorme confusão no público. Alguns problemas são simples de serem identificados: será que o processo de aquisição remota de clientes de todas as instituições está robusto do ponto de vista de verificações de fraude e KYC? Também é óbvio que o pix tem que ter o mesmo tratamento para efeito do COAF que qualquer transação financeira de saque e depósito em conta-corrente. A solução óbvia (e custosa, mas inevitável) é que o Bacen tenha a supervisão de todas as etapas da cadeia. Uma observação: uma corrente arrebenta sempre no elo mais fraco. Desta maneira, introduzir algo que dificulte a PLD em uma transação que foi dividida em mini-serviços que formam uma cadeia é sempre mais fácil pelo elo fraco da cadeia. Dessa maneira, o Bacen tem que impor a todos os elos da cadeia de serviços financeiros o mesmo padrão tradicional de KYC e PLD.”
De abril para cá muita evolução ocorreu. O pix já é tratado pela receita e COAF da mesma forma que os depósitos bancários. Já em setembro discuti, no segundo artigo sobre o tema no Broadcast, alguns aperfeiçoamentos. Estes começaram a tratar da inserção/reinserção das empresas deste ecossistema financeiro estendido no âmbito regulatório do Banco Central. A propósito da importância disto, é interessante observar que a maior corretora de criptomoedas do mundo teve problemas de compliance que foram amplamente divulgados em 2024. Ou seja, é fundamental enquadrar nas regras brasileiras todas as entidades que estejam negociando ativos no país e façam parte neste novo sistema financeiro que é muito fracionado, inclusive as “exchanges” de criptomoedas. Não se pode partir do princípio que a regulação internacional dê conta do recado. Estas três resoluções conjuntas são mais um passo nesta direção.
A Resolução Conjunta 16/2025 regulamenta o BaaS (“banking as a service”). Somente uma instituição financeira poderá ser provedora para uma que tome os serviços de BaaS. Esta terá que ter responsabilidade por todo o controle das atividades, inclusive em PLD, da instituição tomadora. E as “contas-bolsão” (ou contas-ônibus”, como eram referidas no artigo de abril deste ano) ficam proibidas, isto é, todas conta tem que ter a identificação final do cliente. Excelente medida. A Resolução Conjunta 17/2025 basicamente proíbe o uso de termos como “bank”, “banco” e afins em instituições que não tenham licença bancária. Uma grande avanço para evitar que o público seja confundido pelo nome de uma empresa que atue neste ecossistema financeiro. A respeito disto, no dia 3/12 o Nubank, a maior instituição financeira não bancária brasileira, anunciou, segundo o Broadcast, que “pretende buscar licença bancária no Brasil no ano que vem”. De novo, mostrando o acerto da medida conjunta. Já a Resolução Conjunta 18/2025 cuida da responsabilização pela prestação de informações pelas instituições que são autorizadas pelo Bacen.
Em suma, este ano tem havido vários progressos regulatórios do Banco Central, especialmente em PLD. Ainda resta muito a ser feito, mas há que se reconhecer os passos bastante positivos tomados pela Autoridade Monetária. No âmbito prudencial há ainda a necesssidade de reintrodução do Conef para, adicionalmente ao conglomerado financeiro, ser utilizado como base para cáculo dos coeficientes de suficiência de capital. Urge que o Bacen reavalie o uso deste instrumento tão útil para garantir a qualidade da base de cálculo do patrimônio de referência (aliás, este instrumento muitíssimo brasileiro, desenvolvido pelo próprio Banco Central do Brasil nos anos 1999/2000).
Há ainda um grande número de ações que precisam ser tomadas para que haja aperfeiçoamentos do Fundo Garantidor de Crédito (FGC), permitindo que este limite o total de seguro oferecido às instituições levando em conta o risco das mesmas. Assim como esclarecer mais a relação do FGC com a Autoridade Monetária. Artigo de Malu Gaspar no jornal O Globo de 20/11/2025 menciona que o FGC enviou 38 alertas ao Bacen sobre o Banco Master. Tomando como base esta informação, sugere-se que haja um mecanismo formal que exija uma resposta da Autoridade Monetária com planos de ação, ou com contestação explícita, sobre os eventuais alertas do FGC.
Por fim, não deve ser esquecido que o Banco Central precisará de mais recursos financeiros e humanos para controlar este sistema financeiro altamente descentralizado, que tende a ficar ainda mais competitivo e complexo com o advento do Open Finance. Para isso, é fundamental a aprovação da PEC 65/2023, que trata da autonomia administrativa do Bacen.
Este artigo foi publicado originalmente pelo Broadcast da Agência Estado, em 09/12/2025, terça-feira.
As opiniões expressas neste artigo são de responsabilidade exclusiva do autor, não refletindo necessariamente a opinião institucional da FGV.










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