Auxílio Emergencial faz pobreza cair em plena pandemia
Esse artigo estima os impactos do Auxílio Emergencial sobre a Pobreza usando os microdados da PNAD Covid.
O Auxílio Emergencial foi uma política de transferência de renda em grande volume para contrapor os efeitos da pandemia no mercado de trabalho. Proposta por iniciativa do Congresso em março de 2020, o programa garante R$ 600 por três meses para trabalhadores informais e desempregados, com o benefício chegando a R$ 1200 para mães solteiras.
Até recentemente, ainda não era possível estimar o impacto de tal política sobre o país, uma vez que ainda não havia pesquisas domiciliares que captassem todos os rendimentos. No entanto, a PNAD Covid teve seus microdados divulgados no dia 24/06/2020, permitindo realizar análises para todo mês de maio com a inclusão da pergunta sobre o recebimento do Auxílio Emergencial.
Primeiramente, a PNAD Covid mostra uma grande cobertura do programa, que cresce ao longo do mês. No final de maio, 42% dos domicílios e impressionantes 49% da população tinham acesso a este. A título de comparação, o Bolsa Família, até então programa de maior cobertura no país, chegava a 19% dos domicílios e 25% da população.
O programa também foi capaz de recompor grande parte daqueles que, devido à crise da pandemia, perderam suas demais fontes de renda. O Gráfico abaixo mostra que, ordenando a população por decil de rendimento excluindo o Auxílio Emergencial, aqueles que estariam em pior situação teriam uma renda domiciliar per capita próxima de zero, sendo que o programa elevou para quase R$ 240 reais mensais em média. Apesar de não ser possível comparar perfeitamente a PNAD Covid com a PNAD Contínua, em 2019 essa última mostrava os 10% mais pobres do país com uma renda familiar per capita de R$ 109 em média. Se fossem comparáveis, isso significaria um crescimento de cerca de 200% da renda do decil mais pobre do país.
O Gráfico acima mostra também que, sendo em média responsável por cerca de 9% de toda renda domiciliar per capita do país, o benefício chega mais aqueles que estariam em pior situação em o programa, com valor de renda adicional caindo a cada decil. Enquanto entre o terço mais pobre do país, o benefício é responsável por mais de 55% de sua renda, entre o terço mais rico tal proporção fica em torno de apenas 1,5%.
Adicionalmente à sua alta cobertura, o Auxílio Emergencial, como visto anteriormente, teve um valor do benefício extremamente potente, de R$ 600 ou R$ 1200, enquanto a mediana do rendimento domiciliar per capita no Brasil em 2019 era de R$ 860 mensais. O Gráfico abaixo mostra que, ainda que haja uma maior parcela da população maior abaixo da linha da pobreza do Banco Mundial (US$ 5,50 por dia, R$ 447 por mês), o que significa que o programa chega aos de menores rendimentos, a proporção daqueles abaixo da linha pobreza extrema, da ONU (US$ 1,90 por dia, R$ 154 por mês), é menor entre aqueles que recebem o Auxílio Emergencial, devido justamente ao alto valor do benefício.
Com sua grande cobertura e um alto valor do benefício, não seria se surpreender que o Auxílio Emergencial tivesse significativo impacto sobre a Taxa de Pobreza agregada no país. O Gráfico abaixo mostra que, entre a primeira e a última semana de maio, tivemos uma redução da pobreza de 25 para cerca de 22%, e da pobreza extrema de 5 para 3,5%. Mais uma vez comparando com a PNAD Contínua, o que deve ser feito com cautela, entre 2017 e 2019 as Taxas de Pobreza e Pobreza Extrema do Brasil ficaram praticamente estacionadas próximos de 25 e 6,5%, respectivamente – ou seja, o Auxílio Emergencial conseguiu fazer ao longo de quatro semanas (reduzir a pobreza) o que o país não tinha conseguido realizar em três anos.
Nem tudo, no entanto, são flores. O Auxílio Emergencial, tal como visto, por sua própria ambição, é um programa extremamente caro. Tendo sido responsável por uma renda domiciliar per capita 10% maior em maio, ao mesmo tempo a cada mês custa R$ 50 bilhões por mês (o Bolsa Família, por exemplo, custa R$ 30 bilhões por ano).
Ainda que seja um programa extremamente meritoso e necessário para o atual momento de pandemia, caso se tornasse permanente, ocuparia mais de 40% de toda arrecadação federal em 2019, e 17% da arrecadação de todo setor público. Tendo em vista ainda a grande redução de receita dos governos federal, estaduais e municipais devido à crise atual, o programa ficaria portanto fiscalmente insustentável, tendo em vista ainda toda gama de serviços públicos que ainda precisam ser sustentados pelo Estado.
Desse modo, defende-se que, como os efeitos da pandemia ainda se farão sentir nos próximos meses, o Auxílio Emergencial deve ser renovado por pelo menos mais dois meses. Em seguida, é possível aprovar rapidamente a proposta de quatro pesquisadores do IPEA de um programa transitório de renda, que daria aos Governos a capacidade de construírem uma nova e abrangente política social, a ser implementada gradualmente conforme o setor público reorganiza suas contas públicas. Seu desenho pode se assemelhar a uma renda básica ou mínima, tal como minha proposta defendida recentemente nesse espaço, incluindo estágios (condicionais a metas fiscais e reformas) de expansão de cobertura e valor do benefício.
As opiniões expressas neste artigo são de responsabilidade exclusiva dos autores, não refletindo necessariamente a opinião institucional da FGV.
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