Macroeconomia

Ano novo, velhos e novos desafios

22 dez 2021

Retomada foi forte no 1º semestre mas depois veio a frustração. Surpresa inflacionária, com câmbio depreciado, choque de oferta na indústria e alta do petróleo, levou à alta dos juros, à corrosão da renda real e à desaceleração. Em 2022 projetamos crescimento de 0,7%.

Na análise de conjuntura, o fim de ano é sempre uma oportunidade para revermos o que ocorreu no ano que se encerra e alinharmos expectativas para aquele que começa.

Olhando para trás, vemos que o desempenho da economia foi marcado por dois traços principais em 2021. Primeiro, uma recuperação que se mostrou forte no primeiro trimestre, mas que frustrou bastante depois disso, em especial com uma reação menor que a esperada à vacinação e ao parcial controle da pandemia. Segundo, a inflação que surpreendeu sistematicamente para cima, como já fizera ao final de 2020, deixando o Banco Central bem "atrás da curva", o que terá implicações importantes para o cenário econômico de 2022.

O início de 2021, em especial o segundo trimestre, foi marcado por uma segunda onda de Covid, mas, ao longo dos meses, houve melhora nas perspectivas de desempenho da economia. Em junho, o título do Boletim foi “Atividade melhora no curto prazo, mas a aceleração inflacionária antecipa o fim dos estímulos monetários”. Naquele período revisamos a projeção de crescimento para 2021 de 4,2% para 4,8% e, no mês seguinte, revimos novamente, dessa vez para 5,2%. Porém, as expectativas já contemplavam baixo crescimento para o segundo e terceiro trimestres e maior aceleração do PIB no último trimestre do ano.  

O avanço da vacinação permitiria certa normalização da economia, principalmente dos setores que foram mais afetados pela pandemia, como os serviços prestados às famílias, mas haveria desaceleração no consumo de bens. Além disso, já alertávamos para uma desaceleração do crescimento em 2022, para 1,7%, como também para o risco de flexibilização do regime fiscal. Em especial, antevíamos que a desaceleração da economia, no contexto de disputa polarizada eleitoral, poderia levar à adoção de uma política fiscal mais expansionista. Já então, o risco fiscal  era visto como um dos principais fatores negativos para a recuperação da economia brasileira, uma vez passado o efeito positivo do controle da pandemia. 

No início do segundo semestre, a atividade se comportou conforme esperado, mas a pressão inflacionária foi mais intensa que o previsto: a crise hídrica, a taxa de câmbio bastante depreciada, o prolongamento do choque de oferta de insumos industriais e os preços elevados do petróleo contribuíram, em grande medida, para este resultado.  

Por sua vez, a inflação alta e persistente reduziu as perspectivas de crescimento, pois, além de corroer o poder de compra das famílias, trouxe a necessidade de forte aperto monetário para conter o processo de aceleração inflacionária. Com isso, houve piora nas condições de crédito e do mercado de trabalho, que intensificaram a desaceleração.

Como esperado, a fragilidade das condições sociais, acirrada pela pandemia, em um momento de disputa eleitoral, aumentou a pressão política por mais gastos. A forma como esse estímulo fiscal foi engendrado acabou, porém, por ter impacto negativo sobre a economia. Isso porque não trouxe apenas o efeito fiscal do aumento de gastos, mas também alterações das regras fiscais, por motivos mais políticos que econômicos, o que elevou significativamente a incerteza, em um contexto que os juros mais altos e a pressão por reajustes nas despesas públicas já vão causar piora nos resultados fiscais.

Com isso, chegamos a esta virada de ano com um cenário ainda mais negativo. Nossas projeções  contemplam um crescimento de 0,6% (TsT) no quarto trimestre ante o terceiro, com forte protagonismo do setor de serviços e recuo da indústria. Isso significa terminar o ano com o PIB apenas 0,5% acima do patamar atingido no último trimestre de 2019.

Para 2022, mantemos nossa previsão de crescimento de 0,7%. Porém, conforme destacado na edição do Boletim de novembro e em texto do Blog do IBRE (“Contração mais intensa do PIB cíclico em 2022”), o cenário atual, de expressivo aumento da taxa de juros, indica para o ano que vem menores projeções do PIB cíclico, que considera apenas os setores mais diretamente relacionados ao ciclo econômico, excluindo atividades como agropecuária, indústria extrativa, atividades imobiliárias e serviços públicos.[1]

No todo, esses resultados revelam que ainda estamos – e permaneceremos ano que vem – distantes da tendência de crescimento do período pré pandemia. Confirmadas nossas previsões, ao final de 2022 estaremos quase 3% abaixo do ponto em que estaríamos se essa tendência tivesse sido mantida. E isso apesar de a média de crescimento entre 2017 e 2019 ter sido de apenas 1,4% ao ano, em si já um resultado medíocre. O que chama atenção é que, mesmo sendo um crescimento tendencial muito baixo, não conseguiremos retornar à tendência anterior no próximo ano.

No front externo, as notícias para 2022 tampouco são favoráveis. Preocupa, em especial, a recente virada na política monetária nos EUA, em direção à retirada mais rápida dos estímulos monetários, devido às crescentes pressões inflacionárias, que deixaram de ser avaliadas como apenas "transitórias". Isso trará um cenário externo bem mais desafiador para emergentes no próximo ano, com pressões sobre o câmbio e a taxa de juros. A ver se o patamar já elevado em que ambos se encontram no Brasil será suficiente para acomodar essas pressões.

No que tange à pandemia, os receios com relação à nova variante do coronavírus, a ômicron, persistem, devido aos estudos que mostram a perda de eficácia das vacinas contra essa cepa. A torcer para que se confirmem as notícias que se tem até aqui, de que, apesar de ser altamente transmissível, ela tem um grau de letalidade menor do que as cepas anteriores. É essa a premissa que está por trás das projeções e dos preços de ativos. Se ela não se confirmar, o cenário econômico será certamente mais desfavorável.

Tudo indica, portanto, que o ano que vem será um ano muito difícil, tanto do ponto de vista econômico, como também social e político.

Leia aqui o artigo completo na versão digital do Boletim Macro.


[1] Ver atualização do texto em X e a versão anterior em  http://des.sefa.fgv.br/posts/contracao-do-pib-ciclico-em-2022.

As opiniões expressas neste artigo são de responsabilidade exclusiva dos autores, não refletindo necessariamente a opinião institucional da FGV. 

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