Macroeconomia

Atividade surpreende positivamente no curto prazo, mas incerteza segue alta

24 mai 2021

No sumário do Boletim Macro Ibre de maio, nota-se que indicadores surpreenderam positivamente, sinalizando forte crescimento no 1º tri e início do 2º. Reabertura econômica e aumento da mobilidade andam mais rápido que o previsto. Mas risco de 3ª onda é ameaça ao cenário.

Na contramão dos indicadores antecedentes e coincidentes da atividade econômica, a queda registrada no mês de março pelos principais indicadores do IBGE foi bem menos intensa do que o previsto. Diante disso, se espera um forte crescimento do PIB no primeiro trimestre, de 1,6% em relação ao trimestre anterior e de 1,4% contra o mesmo período do ano passado. Essa previsão está em linha com os resultados apontados pelo Indicador de Atividade Econômica (IAE) e o pelo Monitor do PIB, ambos divulgados pelo FGV IBRE.[1]

Os indicadores  também sinalizam forte crescimento no início do segundo trimestre: em termos interanuais, alta do PIB de 11,1%. É uma taxa elevada que, no entanto, decorre, em grande medida, da reduzida base de comparação da atividade no mesmo período do ano passado. Assim, mesmo com esse resultado, ainda se prevê queda do PIB na margem, de 1,0%.

A surpresa quanto ao desempenho da atividade neste início de ano reflete o fato de o processo de reabertura e o aumento da mobilidade terem sido bem mais rápidos que o previsto. Entre os indicadores de mobilidade, destacam-se os segmentos “Locais de Trabalho” (que já voltou ao patamar pré-pandemia) e “Estações de Trânsito”, que são os mais correlacionados com a atividade econômica.

Em que pese o prognóstico mais positivo para o PIB, os riscos seguem elevados. Há uma chance considerável de novo recrudescimento da pandemia, com  o aumento nos números de infecções e de mortes diárias. De fato, de acordo com o Worldometers, o número de novos casos diários aumentou ligeiramente, e a média móvel semanal está próxima de 65 mil, ante 56 mil há três semanas. Mas, pelo menos por enquanto, o número de mortes está em declínio, girando em torno de 2 mil óbitos, ante o pico de 3 mil registrado há um mês.[2] A vacinação dos grupos de maior risco pode levar à queda da relação entre mortes e casos, mas ainda é cedo para dizer em que grau, como sugere a experiência do Chile.

É importante ressaltar que ambas as estatísticas, de casos e de mortes, permanecem em níveis desconfortavelmente elevados. Outra preocupação é que atrasos na chegada de insumos importados para a produção de vacinas podem diminuir a velocidade de imunização. Enquanto uma parcela significativa da população não for vacinada, o risco de novas ondas permanece no radar.

Caso este risco não se materialize, o processo de normalização da economia é antecipado e o crescimento no ano será bem mais elevado do que se previa antes, sendo estimado em 4,2%. Mas, sem dúvida, há ainda muitas incertezas com relação ao cenário. Além das dúvidas em relação à evolução da pandemia, o cenário internacional tem sido também muito volátil. Olhando à frente, preocupam tanto a evolução da política fiscal, pela questão da dívida, como da política monetária, dadas as pressões inflacionárias.

Com o controle da pandemia nos principais países desenvolvidos e na China, a atividade global já está próxima do  nível pré-pandemia. Adicionalmente, os riscos de novas ondas de infecção parecem contidos nesses países, o que permite antecipar um cenário de alguma normalização econômica. Em particular, na Área do Euro, após uma contração de 0,6% TsT no primeiro trimestre, os indicadores apontam um crescimento robusto neste trimestre. De fato, a crise da Covid-19 teve impacto maior nas economias mais frágeis e mais dependentes de turismo. No entanto, as respostas robustas e unificadas à crise têm reduzido o impacto contracionista da pandemia nesses países.

O outro lado da moeda é que, por conta do grande volume de recursos públicos desembolsados para minimizar o impacto da  pandemia, a dívida pública dos países teve forte alta no período. De acordo com os dados do FMI, a dívida pública bruta dos países avançados passou de 104% do PIB em 2019 para 120% no ano passado e deve continuar subindo, atingindo 122,5% do PIB este ano.

Devido à recuperação relativamente rápida da economia mundial, e às restrições que permanecem ao consumo de muitos serviços, houve forte alta na demanda mundial por bens. Como há restrições de oferta para alguns produtos, além de efeitos climáticos adversos, os preços de alimentos e de bens industriais estão muito pressionados. Apenas a inflação de serviços continua bem comportada. Prevemos que a  inflação global seguirá pressionada nos próximos meses, devido aos gargalos de oferta e à elevada demanda.

E, nesse contexto, aumentam as preocupações sobre como a perspectiva de maiores pressões inflacionárias nos países desenvolvidos pode se refletir em termos de política monetária e preços de ativos financeiros. Há, em especial, um receio de que a inflação mais alta leve à redução dos estímulos monetários nos EUA, movimento que no passado derrubou preços de ativos e trouxe volatilidade às economias emergentes.

Outro ponto a ser monitorado é a condução da política econômica chinesa. Recentemente, o governo chinês demonstrou preocupação com a disparada de preços do minério de ferro e do aço. A sinalização é na direção de medidas que promovam a redução desses preços no segundo semestre. A ver.

Resumindo, apesar dos sinais de que se caminha para sair da crise econômica causada pela COVID-19, com a aceleração do crescimento mundial, a incerteza segue alta e o caminho de volta à normalidade deve ser muito volátil. Isso é especialmente válido para os ventos ora favoráveis aos emergentes, que podem a qualquer momento mudar de direção.

No Brasil, as revisões no cenário de atividade também foram acompanhadas de elevações nas projeções de inflação, como maior pressão sobre os preços administrados e de bens industriais, levando a inflação projetada para o ano para 5,7%, acima do limite superior da banda com que trabalha o Banco Central, de 5,25%. Para 2022, a inflação prevista também já está um pouco acima da meta, em 3,7%.

Com relação ao quadro fiscal, os efeitos econômicos e sociais da pandemia elevaram o risco de flexibilização adicional do regime do teto de gastos. A economia está crescendo, mas o desempenho dos setores intensivos em trabalho está ainda muito aquém do patamar pré-crise, dificultando a recuperação do emprego e aumentando a pressão por mais gastos sociais. Enquanto a pandemia não for superada, a pressão por ajustes fiscais estruturais diminui. A disputa eleitoral também pode levar à adoção de uma política fiscal mais expansionista.

Entretanto, enquanto perdurar a onda mundial mais otimista, o senso de urgência para a aprovação de reformas fiscais se enfraquece.


Esse é o sumário do Boletim Macro Ibre de maio de 2021.

As opiniões expressas neste artigo são de responsabilidade exclusiva dos autores, não refletindo necessariamente a opinião institucional da FGV.

[1] O Monitor do PIB mostrou um crescimento de 1,7% TsT (1,6% AsA) no primeiro trimestre. A dispersão das previsões se ampliou significativamente. A mediana do Focus de 14/05/2021 está com contração de 0,1% AsA (0,5% TsT).

[2] Valores de 19/05/2021. Média móvel de 7 dias.

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