Macroeconomia

Em defesa da meritocracia

7 jun 2018

Tem ganhado força na imprensa e nas redes sociais brasileiras um movimento contrário à meritocracia (ver exemplos aqui, aqui e aqui). Até o doutor Dráuzio Varella divulgou um vídeo recentemente criticando a possibilidade de adoção de práticas meritocráticas em nosso país (ver aqui).

O principal argumento dos críticos é que não se pode falar seriamente em meritocracia no caso brasileiro, dado que existe grande desigualdade de oportunidades em nosso país. Colocado dessa, forma o argumento parece bastante razoável. Por exemplo, parece injusto argumentar que o salário mais elevado de juízes reflete apenas o fato de estes indivíduos serem mais esforçados e capazes. Provavelmente, os salários mais elevados de juízes refletem principalmente as melhores oportunidades que esses indivíduos tiveram ao longo da vida, como: pais mais educados, acesso a melhores escolas e etc.

Então, devemos simplesmente abandonar o conceito de meritocracia? Ou será que existem contextos específicos em que a aplicação de práticas meritocráticas pode ser benéfica? Na verdade, uma reflexão bastante simples ajuda a deixar claro que existem contextos específicos em que a adoção de práticas meritocráticas pode ser benéfica. Mais precisamente, existem evidências favoráveis à utilização de práticas meritocráticas como forma de motivar funcionários do setor público, que realizam exatamente a mesma função, a exercer maior esforço no cumprimento de suas atividades (ver exemplos aqui e aqui).

Note que as evidências mencionadas acima não estão suscetíveis às críticas que têm surgido na imprensa brasileira, visto que tratam de casos em que as práticas meritocráticas foram aplicadas para motivar indivíduos apenas quando estes exercem exatamente a mesma função. Um exemplo ajuda a ilustrar o argumento. Imagine que existem dois juízes em uma determinada Vara. O primeiro, lida de forma efetiva com inúmeros processos por dia. O segundo, lida de forma atabalhoada com um número bem pequeno de processos ao dia.

É difícil de acreditar que os dois indivíduos ilustrados no exemplo acima tenham usufruído de oportunidades bastante distintas ao longo da vida, dado que ambos são juízes. Portanto, a crítica tradicional, de que a meritocracia não deve ser aplicada a pessoas com oportunidades distintas, não faz muito sentido nests caso específico dos juízes. Além disso, a implementação de um sistema de premiação por desempenho, uma prática meritocrática, poderia ajudar a incentivar o juiz que lida com um número menor de processos ao dia a melhorar seu desempenho.

Assim, o presente texto deixa claro que não devemos criar uma visão preconceituosa e contrária à aplicação da meritocracia em todo e qualquer contexto. Na verdade, as práticas meritocráticas podem, em certos contextos específicos como aquele em que se procura motivar melhor desempenho de funcionários do governo que exercem exatamente a mesma função, produzir resultados benéficos para a sociedade, como: incentivar maior esforço por parte dos professores de escolas públicas, motivar enfermeiras a prestarem um serviço de melhor qualidade nos hospitais públicos, melhorar o desempenho de agentes responsáveis pela entrega de serviços públicos diretamente nos domicílios das famílias e muitos outros contextos.

As opiniões expressas neste artigo são de responsabilidade exclusiva do autor, não refletindo necessariamente a opinião institucional da FG

Comentários

Carlos Santana
Rafael Ihara
Anônimo
Anônimo
Haroldo Monteir...
Escrevi recentemente o livro Por a Meritocracia é Justa e a Igualdade Injusta, dessa forma gostaria de trocar uma ideia com o Bruno Ottoni sobre o tema, acredito que o livro trás bons insights para essa discussão Abraços

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