À espera do novo arcabouço fiscal
Definição de novo arcabouço fiscal sólido e aprovação de reforma tributária bem desenhada são cruciais para obter taxas de crescimento mais altas no Brasil. No mundo, extensão dos apertos monetários é a grande interrogação.
Tudo indica que podemos estar em meio a um momento de redirecionamento da trajetória da economia, aqui e lá fora. No âmbito doméstico, o foco na segunda metade de março será a definição do tão aguardado “novo arcabouço fiscal”, tema do momento na discussão sobre conjuntura doméstica, pelo peso que deve ter no desempenho da economia no restante do atual mandato presidencial. Lá fora, a dificuldade de adaptação à realidade de políticas monetárias menos expansionistas, depois de década e meia de juros reais negativos, colocou em xeque o tamanho das apostas em altas adicionais de juros, com a taxa futura do Fed funds para dezembro deste ano caindo 0,85 ponto percentual em um mês.
Os detalhes sobre as propostas para as regras que irão substituir o teto de gastos como âncora fiscal serão divulgados em breve, mas no momento em que escrevemos este Sumário ainda pouco se sabe sobre elas. Há, porém, princípios básicos que se espera que essas venham a cumprir, como simplicidade e previsibilidade, além de serem factíveis e terem seu cumprimento aferível pela sociedade de forma rápida e simples. Também há bastante expectativa quanto ao seu grau de ambição; isto é, aos resultados que esse novo arcabouço espera gerar nos próximos anos, em termos de retomada dos superávits primários e da sustentabilidade da dívida pública.
Há outras dimensões que também serão foco de atenção. Um elemento que poderia contribuir para maior aceitação da nova regra, por exemplo, é a adoção de uma revisão contínua dos gastos públicos (spending review), o que poderia ao longo do tempo elevar sua eficiência. E, não menos importante é saber se elas contam com forte apoio político, elemento crucial para que elas terem credibilidade e serem capazes de ancorar as expectativas.
Lá fora, o tema que ganhou protagonismo nas últimas semanas foi a turbulência no mercado financeiro internacional. Nos EUA, constatou-se uma redução da liquidez do sistema, especialmente para bancos menores, e a dificuldade de algumas instituições adaptarem seus balanços à nova política monetária, com a quebra de alguns bancos regionais e outras instituições menores sofrendo para manter suas atividades. Caso esta crise não seja sanada, o cenário de credit crunch pode ocorrer, e o FED poderá ter que adiar seus planos para conter a inflação, para priorizar a estabilidade financeira. Mas, por enquanto, são apenas riscos a serem monitorados pelas autoridades monetárias. A atividade nos EUA continua mostrando um desempenho favorável e a inflação segue persistente.
Na Zona do Euro, o quadro não é muito diferente, como sugere a recente crise de confiança dos investidores em relação ao banco Credit Suisse. A notícia de que o banco central da Suíça vai injetar até 54 bilhões de francos suíços no Credit Suisse aliviou a tensão sobre o setor bancário europeu, trazendo um momento de alívio para o mercado; porém, a questão que está na mente dos investidores é se há mais bancos em situação problemática. A ver.
Mesmo assim, o Banco Central Europeu (BCE) decidiu subir a taxa de juros em 0,5 pp. Na região há melhora na perspectiva de crescimento, diante da diminuição do risco de crise de energia, e os dados de atividade estão mais fortes do que o esperado. Concomitantemente, o núcleo da inflação segue pressionado. De acordo com os comentários da presidente do BCE, Christine Lagarde, a inflação vai seguir muito elevada por um bom tempo, há um longo caminho a ser percorrido até trazê-la de volta para a meta, mas as próximas decisões de política monetária serão dependentes de para onde os dados caminharem. O tom mais dovish do comunicado do BCE, abandonando a sinalização de novas altas nas próximas reuniões, mostra que a instituição está sensível às dificuldades por que passam os bancos da região, com o custo crescente de levantar depósitos e as perdas com a carteira de títulos públicos.
E, por fim, na China, os dados que estão sendo divulgados confirmam a retomada da economia em velocidade compatível com um crescimento em torno de 5% em 2023 (ver seção Em Foco).
Já na América Latina, em diversos países o crescimento econômico ficará abaixo do potencial em 2023. É esperada uma forte contração na Argentina, devido à terrível seca que assola o país e também afeta a região Sul do Brasil. Mas outros países também devem ter desempenho negativo. De fato, a desaceleração é generalizada na região. E, ao mesmo tempo, as expectativas de inflação permanecem elevadas, sem muito espaço para estímulos monetários.
O Brasil segue a mesma tendência. Em média, o PIB ficou estagnado no segundo semestre do ano passado e o carregamento estatístico para 2023 é próximo de zero. Como esperado pelo Boletim Macro, essa desaceleração da atividade deve continuar em 2023, com as sondagens do IBRE confirmando um quadro de enfraquecimento da atividade. No entanto, devido ao excelente desempenho da agropecuária, a projeção para o crescimento do PIB no primeiro trimestre é de 1,0% (TsT) em relação ao último trimestre de 2022. Porém, se o crescimento interanual da agro fosse zero, ou seja, mantendo o mesmo nível do primeiro trimestre anterior, haveria uma contração de 0,2% (TsT) no período.
Leia aqui o artigo completo na versão digital do Boletim Macro de março/2023.
As opiniões expressas neste artigo são de responsabilidade exclusiva dos autores, não refletindo necessariamente a opinião institucional da FGV.
Deixar Comentário