Política Monetária

A importância do voto aberto no Copom

14 dez 2023

Sabermos que Guillen é mais conservador que Galípolo ajuda na análise de discursos divergentes dos diretores, sobre ritmo da política monetária. Votos abertos no Copom adicionam enorme transparência e facilitam interpretação.  

Nestas duas últimas semanas tivemos uma excelente demonstração da importância do voto aberto dos integrantes do Copom.  Na quinta-feira, dia 30 de novembro, em um evento do JP Morgam em São Paulo, Gabriel Galípolo, diretor do Banco Central, analisou a ideia de o Copom tirar do comunicado e da ata o plural “próximas reuniões”, sobre o ritmo de corte da Selic pelo Copom em 0,5% a cada reunião.  O argumento dele é que esta retirada tem duas interpretações possíveis, e que traria muita incerteza no comportamento dos mercados de juros.  Poderia haver uma interpretação de que isto abria a porta para um ritmo maior de corte de 0,75% ou poderia ter o efeito contrário, isto é, de diminuir os cortes para 0,25% por medo dos juros nos EUA.  Portanto, traria mais ruído aos preços.  Adicionalmente a isso, Galípolo mencionou: “agora, no cenário mais benigno, venho sentindo nas interlocuções uma pressão do sentimento de que há espaço para eventualmente acelerar”.  Ou seja, a Autoridade Monetária passar a reduzir os juros 0,75% por reunião.

Como o voto é aberto no Copom, Galípolo faz parte da maioria, juntamente com Roberto Campos Neto, que votou pelo ritmo de 0,5% na reunião que deu início ao ciclo de queda da Selic, em 8 de agosto deste ano. 

Já no dia seguinte à fala de Galípolo, sexta-feira, dia 1º de dezembro, Diogo Guillen, também diretor do Bacen, numa apresentação em evento promovido pelo Barclay’s, fez declarações que foram bem mais conservadoras.  Segundo artigo de Alex Ribeiro no Valor Econômico de 4/12, Guillen afirmou o seguinte, referindo-se ao fato de que a política monetária tem que continuar contracionista por algum tempo: “dissemos que depende dos dados e que é contracionista.  Por que você precisa ter uma taxa terminal contracionista?  Porque você tem expectativas de inflação acima da meta.  E, finalmente, vai ser o ciclo necessário para trazer a inflação de volta para a meta”.  Como é sabido, Guillen fez parte do grupo que foi voto vencido na reunião que iniciou o ciclo de cortes da Selic.  Ele votou por 0,25%.  Além disso, conforme mencionei no artigo que escrevi para o Broadcast no mês que passou, existe ala de pensamento econômico ultraconservador, que considera que somente depois que houvesse a convergência das expectativas para a meta para a inflação é que a Autoridade Monetária poderia iniciar o corte dos juros. Ora, sabemos da dificuldade de países com fragilidade fiscal, como é o caso do Brasil, terem metas muito agressivas.  E que estudos de Aloisio Araújo e seus coautores mostram (usando simulações baseadas em crises passadas) que o valor ideal para a meta é superior a 3% ao ano.  No caso brasileiro, então, temos uma meta muito baixa e que implica excessivo aperto monetário.  Também já apontamos diversas vezes que a mudança de meta só deve acontecer com razoável estabilidade na situação fiscal do país, aspecto este que ainda requer algum esforço do ministro Haddad.  Pela sua fala, Guillen deixa bem claro que a política monetária tem que ficar contracionista enquanto não houver convergência das expectativas para a meta.  Ou seja, pode até haver redução dos juros, mas não atingirá o campo do juro neutro, até que sta convergência tenha ocorrido.   

O fato de sabermos que Guillen é mais conservador e que Galípolo é menos ajuda-nos sobremaneira na análise dos discursos dos diretores, claramente divergentes, sobre o ritmo da política monetária.  Galípolo mostra simpatia por um aumento de ritmo em algum ponto do futuro.  Guillen já acha que 0,5% é ritmo de corte suficiente e que a taxa terminal terá que ser acima da taxa neutra, até que as expectativas convirjam para a meta.  Saber qual é a visão econômica do diretor que fala é relevante, pois ao invés de achar as duas falas estranhas por serem tão divergentes, simplesmente as posições originais foram incorporadas na interpretação.  E como que para colocar um ponto final nesta discussão pública de posições, no dia 5/12 o presidente do Bacen, Roberto Campos Neto, de acordo com reportagem do Broadcast às 14:43 deste dia, em evento da Frente Parlamentar do Empreendedorismo, afirmou que o ritmo de 0,5% é adequado para as próximas reuniões. 

"O Banco Central tem adotado postura prudente e entendemos que seguir o ritmo é adequado. Entendemos que a batalha não está ganha e precisamos perseverar".

Aqui temos uma mensagem que deixa claro que sua posição é que não deve haver redução do ritmo e Campos Neto não frisou a convergência de expectativas como essencial e sim o processo desinflacionário.

Os votos abertos no Copom adicionam enorme transparência e facilidade de interpretação.  Agora as atenções estão todas sobre os dois diretores novos aprovados que assumirão suas cadeiras a partir do início do ano que vem.  Estes são Paulo Picchetti e Rodrigo Teixeira.  Os dois novos integrantes do Copom substituirão Fernanda Guardado e Maurício Moura, ambos da ala conservadora.  São duas pessoas com posições mais agnósticas em relação ao processo de controle inflacionário.  Será que a visão que Galípolo externou terá vez?  Com certeza, a probabilidade é maior com a nova composição da diretoria da Autoridade Monetária. 


As opiniões expressas neste artigo são de responsabilidade exclusiva do autor, não refletindo necessariamente a opinião institucional da FGV. 

Este artigo foi originalmente publicado pelo Broadcast da Agência Estado em 12/12/2023, terça-feira.

Comentários

Felipe Lopes
Bom dia, tudo bem? Eu gostaria de ter o conteúdo dos estudos sobre a meta de inflação, feitos pelo Prof. Aloisio Pessoa de Araujo, como fora mencionado anteriormente neste artigo. Grato.

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