MCMV e PAC: a percepção das empresas
Quesitos especiais da Sondagem da Construção realizada em janeiro procuraram captar a percepção das empresas em relação ao programa Minha Casa Minha Vida e o Programa de Aceleração do Crescimento, ambos reeditados em 2023.
Programa Minha Casa Minha Vida - A reedição do programa habitacional Minha Casa Minha Vida (MCMV) em 2023 aconteceu em um contexto bastante desafiador para o mercado imobiliário.
A oferta do crédito habitacional para a média e alta renda concedido com os recursos da poupança, além das taxas que alcançavam dois dígitos - giraram em torno de 12% - vinha diminuindo significativamente. A política habitacional por meio do Casa Verde Amarela (CVA) também havia reduzido sua possibilidade de atendimento ao não direcionar recursos para a faixa de menor renda. O programa também se mostrava pouco atrativo para muitas empresas desde a forte alta dos custos setoriais registrados a partir da pandemia.
O novo MCMV direcionou recursos do Orçamento Geral da União para novas contratações na faixa 1 (renda bruta familiar mensal até R$ 2.640,00), manteve o limite máximo da faixa 3 em R$ 8.000,00[1] e ampliou as linhas de atendimento. Uma importante alteração veio com elevação do valor máximo do imóvel, reajustado para R$ 350 mil, tornando o programa atrativo novamente para as empresas.
No entanto, a demora na divulgação dos normativos e portarias referentes ao programa contribuiu para postergar a reação das empresas. Assim, criou-se uma expectativa de que em 2024, o mercado voltado para o público do programa seja alavancador da retomada dos negócios.
A sondagem realizada em janeiro mostrou que 40% das construtoras que atuam no segmento residencial e 37% das incorporadoras indicaram que já operam com o MCMV. Nos dois grupos, 6% das empresas ainda não trabalham, mas pretendem operar. Isso significa que 55% das construtoras da área residencial e 58% das incorporadoras não operam nem pretendem operar com o programa, seja porque não estão voltadas para o mercado de baixa renda ou por dificuldades diversas.
O resultado surpreende, sugerindo que nessa nova edição, a atuação do programa deverá estar concentrada em um menor número de empresas. De todo modo, a decisão de operar ou não ainda pode ser revista ao longo do tempo, o que será acompanhado nas próximas sondagens.
Em relação à faixa de renda de atuação, nota-se que há um maior percentual de construtoras operando na faixa 1, enquanto entre as incorporadoras, a faixa 3 registra mais assinalações.
Sondagem da construção, janeiro de 2024
Fonte: FGV IBRE
Em relação às dificuldades com o programa, as construtoras apontaram principalmente a burocracia. Uma questão que deve afetar principalmente àquelas que operam com a faixa 1. Entre as incorporadoras, destacou-se o custo da mão de obra. Vale lembrar que a falta de mão de obra qualificada tem sido um item assinalado como uma das principais limitações à melhoria dos negócios das empesas do setor. Assim, um aumento da demanda poderá gerar ainda mais pressão sobre o mercado, elevando os custos.
Há também um percentual expressivo de assinalações no item “Sem dificuldades”, indicando que a nova versão do programa é resultado de um aprendizado de muitos anos e que atendeu, em grande medida, às demandas das empresas.
Principais dificuldades em relação ao programa MCMV
Fonte: FGV IBRE
Por fim fez-se uma comparação da percepção das empresas que operam com o MCMV em relação à situação dos negócios com a percepção média do setor: em janeiro as empresas do MCMV estavam mais otimistas com a tendência dos negócios nos próximos três meses.
Tendência dos Negócios, janeiro de 2024
Fonte: FGV IBRE
Programa de Aceleração do Crescimento - Ao contrário do MCMV, a reedição do PAC deu-se em um cenário de crescimento dos investimentos em infraestrutura no país, refletindo o forte aumento do orçamento da União, o ciclo de eleições municipais e os últimos leilões de concessões realizados. Ainda distante de suprir as necessidades do país, os investimentos em infraestrutura cresceram em 2023 e as projeções são de mais investimentos em 2024: de acordo com a InterB. Consultoria, as novas inversões deverão representar um alta real de cerca de 7% em 2024.
As sondagens da construção foram mostrando ao longo de 2023 um nível de confiança das empresas de infraestrutura superior à média do setor. Em janeiro de 2024 o ICST do setor alcançou 96,5 pontos, enquanto para as empresas de Obras Viárias e de Obras de Artes Especiais o indicador registrou 104,4 e 98,2 pontos, respectivamente.
Nesse contexto, um percentual mais reduzido de empresas apontou que pretende operar com o PAC: 29,6% das empresas de Obras Viárias e 28,3% as empresas de Obras de Artes. Vale destacar que um percentual relevante de 25,9% e 10,3%, respectivamente, ainda não decidiu.
Quando indagadas sobre os motivos de não participarem, empreses de Obras Viárias fizeram referência às incertezas em relação ao pagamento das obras (21% de assinalações) e as empresas de Obras de Artes apontaram principalmente a modalidade de licitação (30%).
O elevado percentual no item outros refere-se principalmente a empresas que disseram não trabalhar com o setor público.
Quais os motivos de não participar do PAC
Fonte: FGV IBRE
Assim como no caso do MCMV, pode haver mudanças à medida em que o setor sinta mais segurança em relação a questões como financiamento e pagamento. De todo modo, a sondagem mostra que a despeito de ter sido bem recebido pelas entidades setoriais, o novo PAC ainda enfrenta alguma resistência por parte das empresas.
De um modo geral, há ainda uma desconfiança das empresas de construção em relação a sustentabilidade dos programas de governo, considerando o contexto de restrição fiscal, de disputa de recursos com o legislativo (ano eleitoral). Especialmente em relação ao PAC, a participação bastante significativa do funding de origem pública (orçamento) traz mais insegurança. No MCMV, vale observar que há um percentual grande de empresas operando com a faixa 1 que também depende de recursos público.
Por fim, é importante destacar que a sondagem de janeiro passa a ser uma referência, um ponto de partida, para se acompanhar a percepção do setor em relação aos programas e, principalmente, a avaliação das empresas que operam com eles, indicando suas dificuldades. Outro ponto importante será avaliar se há uma percepção mais ou menos otimista da situação das empresas que operam com os programas vis a vis à média das empresas.
A sondagem tem abrangência nacional e é realizada com empresas de todos os portes e segmentos da construção.
As opiniões expressas neste artigo são de responsabilidade exclusiva dos autores, não refletindo necessariamente a opinião institucional da FGV.
[1] Faixas de renda nas áreas urbanas:
Faixa 1: renda mensal de até R$ 2.640
Faixa 2: renda mensal de R$ 2.640,01 a R$ 4.400
Faixa 3: renda mensal de R$ 4.400,01 a R$ 8.000
Nas áreas rurais:
Faixa 1: renda anual de até R$ 31.680
Faixa 2: renda anual de R$ 31.608,01 a R$ 52.800
Faixa 3: renda anual de R$ 52.800,01 a R$ 96.000
Comentários
Deixar Comentário