O desempenho da produtividade em 2020 e as perspectivas para 2021
Em 2020, a pandemia da Covid-19 teve grande impacto sobre a atividade econômica, o mercado de trabalho e, consequentemente, sobre a produtividade. Nos últimos meses, analisei o comportamento de vários indicadores de produtividade no Brasil e em outros países. Neste último artigo do ano, farei um balanço das principais evidências e uma análise das perspectivas para o desempenho da produtividade no Brasil em 2021.
Vários fatores relacionados à pandemia podem ter efeitos negativos sobre a produtividade. Dentre eles, vale destacar a disrupção das cadeias globais de valor, que propiciaram ganhos significativos de eficiência nas últimas décadas. A acumulação de capital humano também foi prejudicada pelo fechamento das escolas. Além disso, as dificuldades no combate à crise sanitária e a elevação do endividamento público devido ao aumento de despesas para o combate à pandemia elevaram significativamente o grau de incerteza dos agentes econômicos, com efeitos negativos sobre o investimento e a produtividade.
Por outro lado, alguns fatores podem ter efeitos positivos sobre a produtividade no pós-Covid-19. Em particular, tecnologias que foram disseminadas durante o período da pandemia podem aumentar de forma permanente a eficiência em diversas empresas ou setores. Além disso, diante dos desafios colocados à retomada do crescimento, é possível que a pandemia tenha o efeito de estimular reformas do ambiente de negócios.
O fato de que diferentes mecanismos podem ter efeitos divergentes sobre a produtividade torna a análise desafiadora. Mas a complexidade desta discussão aumentou consideravelmente devido aos efeitos significativos que a pandemia teve na composição da população ocupada e na estrutura setorial da atividade produtiva.
Em particular, os efeitos negativos da pandemia no Brasil foram mais pronunciados em setores e categorias de trabalhadores de produtividade mais baixa, particularmente os informais de menor escolaridade ocupados nos segmentos de serviços domésticos e pessoais.
Além disso, foram implementadas várias políticas de preservação do emprego formal e da renda do trabalhador informal. No primeiro caso, foi implantado o programa de proteção ao emprego, que possibilitou a manutenção do emprego com redução de jornada ou suspensão do contrato de trabalho. Para o segundo grupo, foi criado o auxílio emergencial, que foi posteriormente estendido com valor menor do benefício até o final do ano.
Essas políticas resultaram em fortes discrepâncias entre diferentes medidas do fator trabalho, especialmente no segundo trimestre, com queda muito maior das horas efetivamente trabalhadas em comparação com as horas habituais e a população ocupada. No terceiro trimestre essas diferenças persistiram, mas em magnitude menor. Consequentemente, enquanto até o final de 2019 os indicadores de produtividade não variavam muito em função da medida do fator trabalho, ao longo de 2020 ocorreram diferenças significativas.
Segundo dados divulgados pelo Observatório da Produtividade Regis Bonelli do IBRE/FGV, no segundo trimestre de 2020 houve uma elevação da produtividade por pessoal ocupado e por hora habitualmente trabalhada de 0,4% e 0,2%, respectivamente, e um forte crescimento de 23,9% da produtividade por hora efetivamente trabalhada, em relação ao mesmo trimestre de 2019.
No terceiro trimestre, todas as medidas apontaram para uma elevação da produtividade do trabalho em relação ao mesmo trimestre do ano passado, com crescimento mais acentuado da medida que considera as horas efetivamente trabalhadas (15,3%), quando comparado com o aumento da produtividade por hora habitualmente trabalhada (9,4%) e da produtividade por pessoal ocupado (9,5%).
Outra medida muito utilizada, a produtividade total dos fatores (PTF), registrou no segundo trimestre de 2020 um crescimento de 3,4% e 3,2% nas medidas que consideram o pessoal ocupado e as horas habitualmente trabalhadas, respectivamente. Por sua vez, a métrica que considera as horas efetivamente trabalhadas indicou um aumento de 17,3%.
Já no terceiro trimestre houve elevação de 3,6% e 3,5%, respectivamente, das medidas de PTF que consideram o número de pessoas ocupadas e horas habitualmente trabalhadas. Considerando o total de horas efetivamente trabalhadas como medida do fator trabalho, o crescimento da PTF foi de 6,8% em comparação com o mesmo trimestre de 2019.
Diante deste quadro, o que esperar do comportamento da produtividade em 2021? Um fato que ressaltei algumas vezes neste espaço é que, depois de forte queda durante a recessão de 2014-2016, a produtividade voltou a crescer em 2017, mas essa recuperação perdeu fôlego em 2018, culminando com uma queda em 2019, tanto nas métricas de produtividade do trabalho como PTF.
Um fator que contribuiu bastante para este desempenho pífio da produtividade foi o elevado grau de incerteza desde 2015, captado pelo Indicador de Incerteza da Economia Brasil (IIE-Br) do IBRE. Com a eclosão da pandemia, o IIE-Br atingiu em abril o maior nível já registrado. Depois de seis meses de quedas consecutivas, o IIE-Br voltou a subir em novembro, permanecendo acima do patamar anterior à pandemia.
Quando não existe clareza sobre a direção da política econômica, os empresários postergam investimentos e contratações formais, com impacto negativo sobre a produtividade.
Neste sentido, minha avaliação é que, caso não seja retomada a agenda de ajuste fiscal e de melhoria do ambiente de negócios, o cenário mais provável é um retorno em 2021 ao padrão de baixo crescimento da produtividade que prevalecia antes da pandemia.
As opiniões expressas neste artigo são de responsabilidade exclusiva do autor, não refletindo necessariamente a opinião institucional da FGV.
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