Macroeconomia

Pandemia cede, mas recuperação mais expressiva da atividade segue desafiante

27 jul 2021

No Boletim Macro Ibre de julho/2021, mantemos para o 2º trimestre a previsão de crescimento de 0,1% ante ao 1º tri. Apesar disso, revisamos a previsão de crescimento para 2021, de 4,8% para 5,2%. Fatores que merecem atenção são crise hídrica e aceleração inflacionária.

Há algum tempo enfatizamos a importância de se controlar a pandemia para que a economia possa se recuperar do enorme choque trazido pela COVID-19. A segunda onda da pandemia, foi, nesse sentido, uma ducha de água fria no relativo otimismo que chegou a emergir na virada do ano, em algum grau refletido no bom resultado do PIB no primeiro trimestre de 2021. Retornamos neste início de segundo semestre a um novo ciclo de moderado otimismo, temperado por dúvidas sobre a extensão da recuperação em curso da atividade e a velocidade com que os gargalos pré-pandemia voltarão a se apresentar. E, claro, preocupados com novos riscos que se apresentam, de um recrudescimento da pandemia aos impactos da normalização da política monetária nos países ricos, em especial nos EUA.

As últimas semanas confirmaram um quadro mais benigno da pandemia do coronavírus no Brasil. O número de novos casos e de mortes diárias segue em queda, com as médias móveis de sete dias desses dois indicadores recuando para 41 mil e 1,2 mil por dia, respectivamente, de acordo com os dados do Worldometer. Há um mês, essas cifras estavam em 72 mil e 2 mil, respectivamente. Ao mesmo tempo, o ritmo de vacinação se intensificou, para uma média superior a 1 milhão de doses por dia. Os estoques de vacinas disponíveis continuam em patamares elevados e se prevê aumento nas entregas de vacinas neste terceiro trimestre. Recentemente, Butantan e Fiocruz receberam IFA (Ingrediente Farmacêutico Ativo) suficiente para a produção de 20 milhões e 10 milhões de doses, respectivamente.

No entanto, é importante mencionar que a pandemia no Brasil tem sido um destaque negativo na comparação internacional. O elevado número de casos no mundo é explicado, principalmente, por Indonésia, Brasil e Reino Unido. Além disso, desde junho, o Brasil assumiu a décima posição em termos de número de mortes per capita no mundo, e, recentemente, superou a marca de 2.500 óbitos por milhão de habitantes.

Com relação à pandemia no mundo, apesar de um cenário mais favorável, há preocupações no horizonte. Em primeiro lugar, a variante Delta têm se espalhado pelo planeta, elevando o número de infecções. Na Europa, Reino Unido e Espanha são os países mais atingidos até momento. A boa notícia é que o aumento no número de casos não tem elevado a taxa de internação e o número de mortes; ou seja, os impactos sobre a atividade econômica devem ser limitados. A elevada taxa de imunização nesses países é o fator determinante para um cenário de baixa letalidade da variante Delta. Um segundo alerta é que a grande maioria dos países mais pobres está muito vulnerável a essa nova variante, devido à baixa taxa de vacinação. O risco de aumento expressivo na mortalidade nesses países é elevado.

No Brasil, à medida que a pandemia seja controlada, é esperada uma abertura mais ampla da economia, com as medidas de restrições de algumas atividades sendo gradualmente retiradas. De fato, recentemente o indicador de mobilidade do Google Mobility Report atingiu o maior valor no pós-pandemia, com aumento em todas as categorias divulgadas,  com destaque para o componente relacionado a “Mercados e Varejo”. Segundo esses dados, já estamos muito próximos de voltar aos níveis pré-pandemia. 

Em relação aos indicadores de atividade, o IBC-Br de maio veio em linha com as previsões do FGV IBRE, mas frustrou as expectativas de mercado. Parte da surpresa é explicada por revisões das séries, algo já antecipado pelo Indicador da Atividade Econômica do FGV IBRE. De fato, as revisões das séries têm ocorrido com muita frequência, pois o impacto da pandemia na economia foi tão expressivo que também tem afetado os modelos de ajuste sazonal, aumentando a volatilidade dos dados mensais e dificultando a análise do dado na ponta. Além disso, o processo de recuperação não está ocorrendo de forma homogênea entre os setores, um problema especialmente grave pelo fato de as pesquisas mensais do IBGE contemplarem apenas o setor formal da economia e não cobrirem atividades como saúde e educação, que não são pesquisadas mensalmente. Entretanto, essas atividades são relevantes para o cálculo do PIB e foram muito afetadas pela pandemia.

Dado esse quadro, mantemos para o segundo trimestre nossa previsão de crescimento de 0,1% em relação ao primeiro trimestre. Apesar disso, revisamos nossa previsão de crescimento para o ano, de 4,8% para 5,2%. O melhor desempenho de algumas atividades do setor de serviços, como transporte, comércio e serviços de informação, elevou o crescimento projetado para esses grupos no ano. Porém, o pior desempenho dos serviços públicos nos fez manter as previsões para o segundo trimestre. Em linha com as previsões do Boletim Macro, o setor industrial e a agropecuária devem contribuir negativamente para o PIB no trimestre. De fato, a indústria de transformação tem sido impactada pela falta de insumos e pelo aumento nos custos de produção. Consequentemente, apesar do cenário mais benigno da economia como um todo, esperamos piora no desempenho de alguns setores.

Outros fatores que merecem atenção são a crise hídrica e a aceleração inflacionária. Com relação à primeira, a forte queda do nível dos reservatórios tem gerado aumento expressivo nos preços das tarifas, prejudicando os setores intensivos em energia, além de reduzir o poder de compra das famílias. O aumento dos preços de energia, em um contexto de pressão inflacionária em outros grupos de bens e serviços, torna o cenário ainda mais desafiador. Com a abertura gradual da economia, é esperado um aumento da inflação de serviços, que segue ainda em patamares muito baixos. A medida de núcleo de inflação deve permanecer em nível mais elevado também, sinalizando que os choques inflacionários podem estar se espalhando para outros preços da economia.  De acordo com a última ata do Copom, o Banco Central está analisando atentamente o comportamento dos preços de serviços. Tudo indica que a normalização dos juros continue, possivelmente para além do nível neutro, piorando as condições de crédito para famílias e empresas.

Algum alento virá, por outro lado, da recuperação do mercado de trabalho, que foi muito afetado pela pandemia. A retomada do emprego e da renda se intensificará com a abertura mais ampla da economia. Entretanto, os efeitos devastadores da crise, inclusive o aumento do endividamento, devem estar ainda presentes, limitando a aceleração do consumo das famílias.

Leia aqui o artigo completo na versão digital do Boletim Macro.


As opiniões expressas neste artigo são de responsabilidade exclusiva do autor, não refletindo necessariamente a opinião institucional da FGV.  

Deixar Comentário

To prevent automated spam submissions leave this field empty.