Diferenças estaduais do trabalho remoto no Brasil

9 dez 2021

Os estados com maior potencial de trabalho remoto foram Distrito Federal, São Paulo e Rio de Janeiro. Em particular, esses estados também foram os que apresentaram uma maior adoção efetiva do trabalho remoto no ano passado.  

1. Introdução

Os eventos associados à pandemia da Covid-19 tiveram impacto profundo sobre o mercado de trabalho brasileiro. Em particular, com o agravamento da pandemia, diversas medidas de distanciamento social foram adotadas. Algumas destas medidas englobavam lockdowns que possibilitavam o trabalho somente em atividades que pudessem ser realizadas de forma remota. Desta forma, os trabalhadores foram afetados de forma distinta dependendo de sua ocupação. 

Dada a relevância do tema e com o objetivo de melhor compreender o conjunto de trabalhadores que poderiam continuar a trabalhar de casa e a extensão que o trabalho remoto pode assumir, iremos analisar nesta nota as diferenças regionais de potencial de trabalho remoto e do trabalho remoto efetivamente adotado em cada um das regiões e estados do Brasil.

Nesta nota, adaptamos a metodologia de Dingel e Neiman (2020) a fim de considerarmos para o Brasil uma infraestrutura mínima doméstica necessária para a realização do trabalho remoto, caracterizada pelo acesso à internet, à energia elétrica e a existência de ao menos um microcomputador no domicilio.[1]

2. Dados e Metodologia

A análise é realizada a partir de duas bases de dados distintas: a Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios Contínua (PNAD Contínua) de 2019 e a Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios - COVID (PNAD-COVID) de 2020, que adaptou a metodologia da PNAD Contínua para o período de pandemia. A PNAD-COVID é utilizada para os meses de maio a novembro de 2020.

Os dados apresentados nesta nota foram obtidos a partir de uma adaptação da metodologia proposta por Dingel e Neiman (2020), denominado de DN de agora em diante, para o contexto de um país em desenvolvimento como o Brasil. Neste artigo, os autores analisaram quais características da ocupação são relevantes para que ela possa ser executada de forma remota.

Adicionamos à metodologia de Dingel e Neiman a necessidade de uma infraestrutura mínima para que um trabalhador possa executar as suas funções de casa, a saber: existência de energia elétrica de forma regular no domicílio, acesso domiciliar à internet e a presença de pelo menos um microcomputador para que o trabalhador possa executar as suas tarefas de casa. Essas informações foram obtidas a partir da PNAD Contínua de 2019. É importante observar que não estamos avaliando a necessidade de ter um espaço adequado para o trabalho em casa, mas somente o mínimo necessário para que o mesmo possa trabalhar a distância: acesso a energia, microcomputador (laptop, notebook, ultrabook ou netbook) e internet.

Para complementar a análise, utilizamos dados da PNAD-COVID, que possui uma pergunta específica sobre se o trabalhador encontra-se em trabalho remoto. Com isso, podemos avaliar não somente o potencial de trabalho remoto, mas também seu uso efetivo.

No entanto, o uso da PNAD-COVID nos coloca outras questões. Em particular, o nível de desagregação das ocupações é inferior na PNAD-COVID em comparação com a PNAD Contínua. Em função disso, com a finalidade de comparar a adoção do trabalho efetivo com o potencial na PNAD-COVID, precisamos reclassificar as ocupações da PNAD-COVID em somente 10 categorias, reduzindo o nível de desagregação. Adicionalmente, a PNAD-COVID não possui informações sobre o domicílio para podermos ajustar o potencial com base na infraestrutura. Desta forma, adotamos a hipótese de que a existência de infraestrutura na PNAD-COVID segue a mesma proporção da PNAD Contínua de 2019.

3. Trabalho Remoto Potencial

Brasil e Regiões

O Gráfico 1 mostra simultaneamente o potencial de trabalho remoto ajustando-se pela infraestrutura mínima (barra vermelha) e sem o ajuste (soma das barras vermelhas e azuis) para o Brasil e regiões. Com isso, o Gráfico 1 mostra na soma das barras vermelha e azul o potencial de trabalho remoto que seria estimado por DN. A barra vermelha mostra o potencial ajustado pela infraestrutura que, na nossa avaliação, é o melhor cálculo de potencial de trabalho remoto.

O potencial de trabalho remoto baseado em DN seria de 25,5% para o Brasil em 2019. A medida de potencial ajustada pela infraestrutura seria de somente 17,8%, mostrando o impacto da infraestrutura mínima necessária no potencial de trabalho remoto no Brasil.

O Gráfico 1 mostra ainda a diferença de possibilidade de trabalho remoto entre as regiões brasileiras. As regiões mais ricas do Brasil, Sudeste (28%) e Sul (26,2%), possuem o maior percentual de trabalhadores que podem migrar para o trabalho em casa. No entanto, nossa adaptação à medida de DN reduz de forma substancial o potencial de trabalho remoto. As regiões com menor potencial também possuem menos infraestrutura, reduzindo ainda mais a possibilidade do trabalho remoto. O potencial na região Norte cai para menos da metade, com redução de 21,2% para 10,3%. Já na região Nordeste, a redução é de 8,9 p.p., passando de 21,9% para somente 13%. A menor redução ocorre na região Sul, refletindo uma melhor infraestrutura mínima na região.

Fonte: Elaboração própria com base na PNAD Contínua.

Os resultados do Gráfico 1 mostram que, caso consideremos uma infraestrutura mínima, o potencial de teletrabalho estimado para o Brasil torna-se bem inferior ao reportado por Goés, Martins e Nascimento (2020), cujo estudo estima um percentual de teletrabalho de 22,7%.

Com o objetivo de entender melhor as diferenças regionais, calculamos o potencial de trabalho remoto com e sem infraestrutura para os diferentes estados do país (Gráfico 2). Mais uma vez fica clara a importância de se considerar uma infraestrutura mínima para o cálculo do potencial de trabalho remoto.


[1] Esta nota é baseada em Barbosa Filho, Veloso e Peruchetti (2021).

As opiniões expressas neste artigo são de responsabilidade exclusiva dos autores, não refletindo necessariamente a opinião institucional da FGV.

A análise completa contendo os resultados estaduais pode ser acessada no Observatório da Produtividade Regis Bonelli.

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