Trabalho

Recuperação do mercado de trabalho das regiões brasileiras perde fôlego no início de 2023

25 jul 2023

O 1º tri de 2023 mostra reversão da trajetória do desemprego e taxa de participação abaixo do nível pré-pandemia nas regiões. Já em maio, emprego fica estável e a taxa de participação brasileira não apresenta sinais de melhora.

A eclosão da pandemia de Covid-19 gerou uma série de efeitos adversos sobre as economias mundiais. No Brasil, o mercado de trabalho foi um dos segmentos mais impactados, pois a crise sanitária piorou o desempenho dos seus principais indicadores – tais como taxa de participação, nível de emprego e taxa de desemprego. No ápice da pandemia houve forte redução do emprego e da taxa de participação, reflexo dos rebatimentos da crise sobre todas as regiões brasileiras.

Ao longo de 2021, os sinais de recuperação do mercado de trabalho brasileiro começaram a aparecer, mas ainda existiam muitas incertezas sobre os desdobramentos no médio e longo prazo, além do ritmo da recuperação. Foi apenas em 2022 que ocorreu uma melhora mais expressiva, com o emprego não só recuperando o nível pré-pandemia, como      atingindo níveis recordes no final do ano passado. Além disso, a taxa de desemprego, que atingiu 13,8% em 2020 e 13,2% em 2021, baixou para 7,9% no final de 2022. Contudo, a taxa de participação, obtida a partir da razão entre a força de trabalho e o número de pessoas em idade para trabalhar, ainda não se recuperou, estando abaixo do nível e da tendência pré-pandemia.

Os microdados recentes da Pnad Contínua revelam que a recuperação observada em 2022 perdeu fôlego no primeiro trimestre deste ano, tanto em âmbito nacional quanto regional. Um dos sinais desse arrefecimento é a volta do aumento da taxa de desemprego na margem, ou seja, em relação ao trimestre imediatamente anterior. O Gráfico 1 apresenta a taxa de desemprego para o Brasil e regiões nos primeiros trimestres de 2020 a 2023, além do quarto trimestre de 2022.

O Gráfico 1 mostra que a dinâmica da taxa de desemprego ao longo dos últimos três anos apresentou padrões semelhantes entre as regiões brasileiras, embora com a permanência das diferenças de nível, já bem conhecidas: tendência ascendente entre os primeiros trimestres de 2020 e 2021, seguido de uma expressiva queda ao longo de 2022.

Gráfico 1: Taxa de desemprego (em %)
Brasil e regiões

Fonte: elaboração FGV IBRE com dados da PNAD Contínua (IBGE)

No entanto, os dados apontam para uma piora no início de 2023, com a taxa passando de 8,1% para 9,1% na região Norte, de 10,9% para 12,2% na região Nordeste, de 7,9% para 8,6% no Sudeste, de 4,5% para 5,0% no Sul e de 6,2% para 7,0% no Centro-Oeste. No Brasil, a taxa de desemprego no primeiro trimestre de 2023 subiu para 8,8%. Nota-se que as maiores elevações foram reportadas no Nordeste, com 1,4 ponto percentual (p.p.), Norte (1,0 p.p.) e as menores no Sul (0,5 p.p.), Sudeste (0,7 p.p.) e Centro Oeste (0.8 p.p.). Vale ressaltar que, embora haja queda na margem, as taxas do 1º tri de 2023 permanecem abaixo dos valores do 1º tri de 2022. O desempenho recente da taxa de desemprego está intrinsecamente relacionado à dinâmica de geração de emprego.

A fim de compreender o mercado de trabalho sob outros ângulos, o Gráfico 2 mostra a trajetória do número de pessoas ocupadas no Brasil e nas regiões no período que vai do quarto trimestre (q4) de 2019 a primeiro trimestre (q1) de 2023, e o Gráfico 3 apresenta a evolução da taxa de participação. Observa-se que, após a forte redução de 12,6% no emprego, registrada entre o quarto      trimestre de 2019 e terceiro trimestre de 2020, o emprego começou a se recuperar consistentemente em todas as regiões brasileiras, atingindo máximos históricos no quatro trimestre de 2022. Vale citar que foi a partir do controle da crise sanitária e da normalização da atividade econômica no período 2021-2022 que o mercado de trabalho começou a reagir e a consolidar sua recuperação.[1]

Gráfico 2: Evolução do número de pessoas ocupadas (em milhões)
Brasil e regiões

Fonte: Elaboração FGV IBRE com dados da Pnad Contínua (IBGE)

Contudo, os dados sinalizam uma interrupção dessa dinâmica no primeiro trimestre de 2023. Ou seja, após cinco trimestres consecutivos de evolução contínua, o incremento marginal foi negativo. Com exceção da região Centro-Oeste, onde o emprego permaneceu relativamente estável, entre o quarto trimestre de 2022 e o primeiro trimestre de 2023 houve recuo expressivo no emprego. Em particular, o número de pessoas ocupadas passou de 8,2 milhões para 7,9 milhões no Norte, de 22,5 milhões para 21,8 milhões no Nordeste, de 44,4 milhões para 44,1 milhões no Sudeste e de 15,8 milhões para 15,6 milhões no Sul.  Em relação à magnitude dessa redução, a população ocupada caiu 1,6% no Brasil no primeiro trimestre deste ano devido à queda observada no Norte (-3,4%), Nordeste (-3,2%) e Sul (-1,3%). As reduções no Sudeste e Centro-Oeste foram menos intensas, -0,7% e -0,2%, respectivamente.

Outro ponto que merece atenção e tem preocupado muitos economistas é o fato de a taxa de participação[2] ainda estar      abaixo do observado no período pré-pandemia. A recuperação da queda registrada no segundo trimestre de 2020 não ocorreu de forma efetiva/plena, pois a taxa de participação ainda está em 61,6%, conforme dados do primeiro trimestre de 2023, cerca de 2,0 p.p. abaixo do observado no quarto trimestre de 2019 e 1,1 p.p. abaixo do observado no terceiro trimestre de 2022. Enquanto os demais indicadores de mercado de trabalho conseguiram, em meados de 2022, alcançar e até mesmo ultrapassar os patamares pré-pandêmicos, a taxa de participação permanece, há dois trimestres consecutivos, registrando queda, conforme mostra o Gráfico 3.

Gráfico 3: Evolução da taxa de participação 
Brasil e regiões[3]

Fonte: Elaboração FGV IBRE com dados da Pnad Contínua (IBGE).

A Tabela 1, a seguir, mostra a contribuição de cada uma das regiões para a queda da taxa de participação brasileira. Os resultados apresentados levam em consideração o peso relativo de cada região na população em idade ativa do Brasil e a dinâmica da taxa de participação de cada uma das regiões no período analisado. Como já mencionado, entre o quarto trimestre de 2019 e o primeiro trimestre de 2023 houve uma redução de 2,0 pontos percentuais na taxa de participação brasileira. Dentre as regiões que mais contribuíram para a queda destacam-se a região Nordeste e Sudeste, com redução de 0,7 p.p. e 1,1 p.p., respectivamente. A região Sul também teve uma pequena contribuição negativa, de 0,3 p.p. Já nas regiões Norte e Centro Oeste, os movimentos na taxa de participação não tiveram impacto sobre a queda registrada no Brasil.

As regiões Nordeste e Sudeste continuam a ser as que mais contribuíram para a queda desde o terceiro trimestre do ano passado, conforme mostra a Tabela 1. Ambas as regiões contribuíram com 0,4 p.p. para a redução de 1,1 p.p. da taxa de participação brasileira entre o terceiro trimestre de 2022 e o primeiro de 2023. As regiões Sul e Norte também contribuíram negativamente com 0,2 p.p. e 0,1 p.p., respectivamente, enquanto no Centro-Oeste os movimentos na taxa de participação não tiveram impacto sobre a queda observada no Brasil.

Tabela 1: Decomposição da queda da taxa de participação brasileira
(em pontos percentuais)

Fonte: Elaboração FGV IBRE com dados da Pnad Contínua (IBGE).

 

Outro exercício realizado nesta análise é a decomposição do crescimento da massa de rendimento mensal real da população ocupada em movimentos no valor do rendimento médio real e na quantidade de pessoas ocupadas. Essa decomposição é realizada utilizando o conceito de massa de rendimento mensal real: produto entre o rendimento médio real e a população ocupada[4]. De acordo com a Tabela 2, as magnitudes das variações na massa de rendimento mensal real foram heterogêneas entre as regiões, tanto no período entre o quarto trimestre de 2019 e primeiro de 2023 quanto no período entre o terceiro trimestre de 2022 e o primeiro de 2023.

Com exceção da região Nordeste, todas as outras regiões e o Brasil já superaram o nível da massa de rendimento real observada no período pré-pandemia. Na região Nordeste a massa de rendimento real ainda está 0,4% abaixo dos níveis do quarto trimestre de 2019, mas nas regiões Norte, Sudeste, Sul e Centro-Oeste a massa de rendimento está 10,9%, 1,3%, 1,4% e 13,7%, respectivamente, acima do período pré-pandemia. De acordo com a decomposição, no Nordeste, além do rendimento médio estar abaixo do pré-pandemia, o emprego também não cresceu como nas demais regiões (apenas 0,9% acima). Nas regiões Sudeste e Sul, apesar do rendimento médio estar abaixo do observado no quarto trimestre de 2019, o crescimento do emprego acabou compensando e gerando crescimento da massa de rendimento. Já nas regiões Norte e Centro-Oeste o forte crescimento da massa de rendimento real está relacionado a uma combinação de forte crescimento tanto da renda quanto do emprego.

Tabela 2: Decomposição da variação da massa de rendimento real da população ocupada
Brasil e regiões

Fonte: Elaboração FGV IBRE com dados da Pnad Contínua (IBGE)

No período mais recente, que compreende o terceiro trimestre de 2022 e o primeiro trimestre de 2023, os dados sinalizam que a perda de fôlego do emprego acabou inibindo o desempenho da massa de rendimento real e, no caso do Norte e do Sul, contribuiu fortemente para a queda. Também se observa a redução do emprego em todas as regiões. Em particular, a queda do emprego nas regiões Norte e Sul foram maiores do que as elevações no rendimento médio, gerando queda da massa de rendimento real no período mais recente. Já nas demais regiões, onde o crescimento recente do rendimento médio superou a queda no emprego, foi possível observar aumento da massa de rendimento real.

Por fim, os dados do primeiro trimestre de 2023 mostram a reversão da trajetória de queda da taxa de desemprego e a permanência da taxa de participação abaixo dos níveis pré-pandêmicos em todas as regiões.  Os dados recentemente divulgados para o trimestre móvel encerrado em maio de 2023 já apontam recuo da taxa de desemprego do Brasil para 8,3%, influenciada pela forte queda de pessoas em busca de trabalho. Além disso, a população ocupada ficou estável frente ao trimestre móvel imediatamente anterior, mas a taxa de participação continuou sem dar sinais de melhora. O cenário para as regiões poderá seguir padrão semelhante, resguardando as já conhecidas heterogeneidades.

Esta é a seção Em Foco do Boletim Macro Ibre de Julho de 2023.

As opiniões expressas neste artigo são de responsabilidade exclusiva dos autores, não refletindo necessariamente a opinião institucional da FGV. 

 

[1] Na edição de dezembro do boletim apresentamos em detalhes os determinantes para ess     a melhora do emprego em 2022. Mostramos que parte relevante dess     e aumento no número de pessoas ocupada     s ocorreu em função da volta do emprego em atividades presenciais. Para mais detalhes, acesse: https://portalibre.fgv.br/sites/default/files/2022-12/2022-12-boletim-macro.pdf

[2] A taxa de participação, que corresponde à razão entre o número de pessoas na força de trabalho, que engloba tanto os ocupados quanto os desocupados, e o número de pessoas em idade para trabalhar, mostra o quanto as pessoas estão ofertando de trabalho

 

[3] Um análise mais detalhada para o Nordeste pode ser encontrada na edição de abril da Carta do IBRE, disponível no link: https://ibre.fgv.br/sites/ibre.fgv.br/files/arquivos/u65/04ce2023_carta_do_ibre.pdf

[4] Nesta decomposição, consideramos as pessoas ocupadas que declaram ter recebido algum tipo de rendimento do trabalho.

Comentários

Renato
Muito informativo e bom!

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