Produtividade do trabalho no Brasil: uma análise dos resultados setoriais no período 1995-2024

Com fim do bônus demográfico, única forma de aumentar a renda per capita e gerar crescimento sustentável no Brasil nas próximas décadas será pela elevação da produtividade. Discussões sobre o tema são cada vez mais importantes.
Diante da relevância do tema, e com o objetivo de contribuir ainda mais para a discussão, o FGV IBRE criou o Observatório da Produtividade Regis Bonelli, reunindo uma ampla base de dados sobre produtividade para a economia brasileira, além de estudos e análises, a fim de fornecer informações para uma maior compreensão do tema e contribuir para a formulação de políticas públicas que possam aumentar a produtividade e impulsionar o crescimento econômico do país.[1]
Além de indicadores de produtividade agregada calculados desde 1981, o Observatório da Produtividade Regis Bonelli disponibiliza indicadores de produtividade para os 12 setores das Contas Nacionais desde 1995. O Gráfico 1 mostra a evolução da produtividade por hora trabalhada no Brasil para o agregado da economia e para os três grandes setores (agropecuária, indústria e serviços).[2]
Gráfico 1: Evolução da produtividade por hora trabalhada para o agregado da economia e para os três grandes setores (agropecuária, indústria e serviços) – Brasil: 1995 até 2024 – Em R$ de 2021
Fonte: Observatório da Produtividade Regis Bonelli. Elaboração do FGV IBRE com base nos dados das Contas Nacionais, Pnad e Pnad Contínua.
O Gráfico 1 mostra que o único setor que apresentou crescimento robusto desde 1995 foi a agropecuária. Entre 1995 e 2024, o crescimento médio da produtividade por hora trabalhada deste setor foi de 5,8% a.a. (Tabela 1). Ao longo do período analisado, o maior crescimento da produtividade da agropecuária ocorreu entre 2007 e 2014 (7,5% a.a.). Desde 2014, tem havido uma desaceleração no crescimento médio da produtividade da agropecuária. Em 2014-2019 e 2019-2024, por exemplo, o crescimento médio da produtividade deste setor foi de 4,5% a.a. e 4,0% a.a., respectivamente. Em particular, esta elevação observada entre 2019 e 2024 foi sustentada pelo crescimento extraordinário da produtividade da agropecuária em 2023 (22,3%). Já em 2024, o crescimento da produtividade por hora trabalhada da agropecuária foi de 1,6%, bem inferior ao observado em 2023.
Tabela 1: Crescimento médio anual da produtividade setorial por hora trabalhada – Brasil – Períodos Selecionados[3]
Na indústria, o desempenho da produtividade por hora trabalhada desde 1995 foi negativo, com queda de 0,3% a.a. entre 1995 e 2024. Os dados também mostram que entre 1995 e 2003 houve uma redução de 2,1% a.a. na produtividade deste setor. Nota-se, ainda, um baixo crescimento da produtividade da indústria (0,8% a.a.) no período de recessão e lenta recuperação entre 2014 e 2019, inferior ao observado entre 2003 e 2007 (1,1% a.a.), porém acima do observado entre 2007 e 2014 (0,2% a.a.). A queda de 0,5% em 2024 contribuiu para o recuo da produtividade da indústria observada entre 2019 e 2024 (-0,2% a.a.).
A produtividade por hora trabalhada do setor de serviços, que concentra mais de 70% das horas trabalhadas e quase 69% do valor adicionado, também tem apresentado um fraco desempenho, com crescimento de apenas 0,2% a.a. entre 1995 e 2024. Analisando separadamente os subperíodos, notamos que entre 1995 e 2003 houve queda de 0,5% a.a. na produtividade deste setor. Após um período de expansão entre 2003 e 2014, a produtividade do setor de serviços voltou a apresentar um desempenho negativo e caiu 1,2% a.a. entre 2014 e 2019. No entanto, este quadro foi interrompido pela ligeira elevação de 0,1% a.a. observada entre 2019 e 2024. Os dados também mostram que em 2024 a produtividade do setor de serviços apresentou estabilidade quando comparada com o ano de 2023.
O crescimento modesto da produtividade do setor de serviços contribuiu para o baixo crescimento da produtividade agregada, de apenas 0,8% a.a. observado entre 1995 e 2024. Nos períodos 2003-2007 e 2007-2014 a produtividade agregada teve seu melhor desempenho, com crescimento de 2,6% a.a. e 1,7% a.a., respectivamente, coincidindo com o período de maior crescimento da produtividade do setor de serviços. Entre 2014 e 2019, que abrange o período de recessão e a lenta recuperação da economia, nota-se uma queda de 0,3% a.a. na produtividade agregada. Já no período mais recente, 2019-2024, que compreende os anos da pandemia, houve um ligeiro crescimento de 0,3% a.a. na produtividade agregada.
Também é importante destacar que, após a elevação de 2,3% em 2023, que ocorreu em grande medida devido ao desempenho extraordinário da produtividade da agropecuária, o crescimento da produtividade agregada desacelerou bastante em 2024. Em particular, o crescimento da produtividade agregada em 2024 foi de apenas 0,1%.
Esses resultados mostram que existe grande heterogeneidade na trajetória da produtividade do trabalho nos diferentes setores da economia. Diante disso, analisar de forma desagregada os principais setores da indústria e dos serviços nos ajuda a entender melhor a dinâmica da produtividade média nesses setores. [4]
O Gráfico 2 apresenta os dados de produtividade por hora trabalhada na indústria de transformação e na construção civil, que são os dois subsetores da indústria que mais empregam trabalhadores e que mais concentram horas trabalhadas.[5]
Gráfico 2: Evolução da produtividade por hora trabalhada para os principais setores da indústria (indústria de transformação e construção civil) – Brasil: 1995 até 2024 – Em R$ de 2021
Fonte: Observatório da Produtividade Regis Bonelli. Elaboração do FGV IBRE com base nos dados das Contas Nacionais, Pnad e Pnad Contínua.
O desempenho negativo da indústria de transformação e da construção civil ajuda a explicar a queda da produtividade da indústria agregada ao longo do período analisado. Entre 1995 e 2024, a produtividade da indústria de transformação recuou 0,9% a.a., enquanto a produtividade da construção civil diminuiu 0,4% a.a. (Tabela 1).
Entre 1995 e 2003, a produtividade da indústria de transformação recuou pouco mais de 3% a.a., e a da construção civil teve queda de 2,5% a.a. Entre 2003 e 2014 ambos os setores apresentaram elevação de produtividade. No entanto, desde 2014, o comportamento da produtividade nestes dois setores tem sido bem diferente. Em particular entre 2014 e 2019, enquanto a produtividade da construção civil apresentou queda de 2,2% a.a., na indústria de transformação ela apresentou ligeiro avanço de 0,3% a.a.. Já ao longo da pandemia, 2019-2024, este cenário mudou, tendo em vista que a produtividade na indústria de transformação apresentou queda de 1,6% a.a. e a da construção aumentou 1,9% a.a..
Em 2024, a produtividade da indústria de transformação avançou 0,3%, e a produtividade da construção apresentou estabilidade.
O Gráfico 3 mostra o fraco desempenho desde 1995 das principais atividades que compõem o setor de serviços (transporte, comércio e outros serviços) que, por concentrarem a maior parte da mão de obra, acabam por influenciar negativamente a produtividade média do setor.[6]
Gráfico 3: Evolução da produtividade por hora trabalhada para os principais subsetores do setor de serviços (comércio, transporte e outros serviços) – Brasil: 1995 até 2024 – Em R$ de 2021
Fonte: Observatório da Produtividade Regis Bonelli. Elaboração do FGV IBRE com base nos dados das Contas Nacionais, Pnad e Pnad Contínua.
O Gráfico 3 e a Tabela 1 mostram que a produtividade do setor de transporte recuou 1,0% a.a. entre 1995 e 2024. No mesmo período, a produtividade do comércio apresentou estabilidade, e a do setor de outros serviços avançou apenas 0,1% a.a.
Após um período de crescimento modesto entre 2003 e 2014, a produtividade por hora trabalhada nos subsetores dos serviços sofreu com os efeitos da recessão iniciada em 2014, que afetou de forma muito negativa a produtividade destas atividades. Os setores de transporte e outros serviços apresentaram quedas mais acentuadas, de 3,8% e 1,6% a.a., respectivamente, entre 2014 e 2019. No mesmo período, a produtividade do comércio caiu 1,4% a.a.
Entre 2019 e 2024, esta queda persistiu no setor de transportes (-2,3% a.a.). No mesmo período, a produtividade do setor de outros serviços avançou 1,8% a.a. e a do comércio apresentou estabilidade. É importante destacar que em 2024 a produtividade do setor de transporte recuou 4,2%. Já no comércio e no setor de outros serviços a produtividade avançou 1,5% e 1,3%, respectivamente
Em resumo, os dados mostraram que o baixo crescimento da produtividade agregada desde 1995 está relacionado principalmente ao desempenho do setor de serviços, que concentra mais de 70% das horas trabalhadas no país e apresentou fraco desempenho ao longo deste período, principalmente no período de recessão e lenta recuperação (2014-2019).
Outro ponto importante diz respeito à desaceleração do crescimento da produtividade agregada observada entre os anos de 2023 e 2024, que foi muito parecida com a observada no biênio 2017-2018. O Gráfico 4 mostra o crescimento da produtividade agregada desde 2017.
Gráfico 4: Crescimento da produtividade por hora trabalhada. Brasil
Fonte: Observatório da Produtividade Regis Bonelli. Elaboração do FGV IBRE com base nos dados das Contas Nacionais e da Pnad Contínua.
Os dados mostram que após crescer 2,3% em 2023 a produtividade agregada cresceu apenas 0,1% em 2024. Este padrão é muito parecido com o observado no biênio 2017-2018, no qual após crescimento de 2,1% em 2017 houve forte desaceleração para crescimento de apenas 0,5% em 2018.
Em particular, o forte crescimento da produtividade agregada em 2023 resultou em grande medida do crescimento extraordinário da agropecuária (22,3%). No Gráfico 5 mostramos o crescimento da produtividade para os três grandes setores da economia desde 2017.
Gráfico 5: Crescimento da produtividade por hora trabalhada para os três grandes setores da economia. Brasil
Fonte: Observatório da Produtividade Regis Bonelli. Elaboração do FGV IBRE com base nos dados das Contas Nacionais e da Pnad Contínua.
Em 2023, a produtividade da indústria (incluindo extrativa mineral, transformação, construção e serviços de utilidade pública) cresceu 2,1% e no setor de serviços, que concentra cerca de 70% das horas trabalhadas, teve aumento de apenas 0,5%. Em função da desaceleração do crescimento da produtividade da agropecuária em 2024 (1,6%), da queda de 0,5% da produtividade da indústria e da estabilidade do crescimento da produtividade do setor de serviços, a produtividade agregada cresceu apenas 0,1% em 2024.
Este padrão foi muito parecido com o observado no biênio 2017-2018, no qual a agropecuária também apresentou forte crescimento da produtividade, seguido de significativa desaceleração. Em particular, em 2017, o crescimento da agropecuária foi de 21%, o da produtividade da indústria foi de 2,9% e o do setor de serviços foi de 0,1%. Já em 2018 houve forte desaceleração no crescimento da produtividade da agropecuária (2,1%). Na indústria e no setor de serviços, o crescimento da produtividade foi de 1,4% e estabilidade, respectivamente.
Diante do fato de que os ganhos de produtividade em 2023 foram concentrados na agropecuária, os dados sugerem que o aumento de produtividade em 2023 foi temporário. Com a desaceleração do crescimento da produtividade da agropecuária em 2024, a produtividade agregada retornou à sua trajetória de baixo dinamismo.
Este é a Seção Em Foco do Boletim Macro FGV IBRE de abril de 2025.
As opiniões expressas neste artigo são de responsabilidade exclusiva dos autores, não refletindo necessariamente a opinião institucional da FGV.
[1] O site pode ser acessado através do link: https://ibre.fgv.br/observatorio-produtividade
[2] No Observatório da Produtividade Regis Bonelli, disponibilizamos as séries setoriais de produtividade tanto por hora trabalhada quanto por população ocupada para os 12 setores da economia.
[3] Na Tabela 1, o primeiro ano de cada período refere-se ao ano-base da análise.
[4] Os dados para os 12 setores da economia podem ser encontrados no Observatório da Produtividade Regis Bonelli, no link: https://ibre.fgv.br/observatorio-produtividade/temas/indicador-setorial-de-produtividade-do-trabalho-anual-desde-1995
[5] A indústria de transformação e a construção civil concentraram em 2024 cerca de 94% das horas alocadas no total da indústria, sendo 58% destinadas à indústria de transformação e 36% à construção civil.
[6] Comércio, transporte e outros serviços concentraram em 2024 cerca de 80% das horas trabalhadas no setor de serviços, sendo 28% destinadas ao comércio, 9% ao transporte e 43% aos outros serviços.
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