Trabalho

Mercado de trabalho no Brasil no pós-pandemia

23 mai 2024

Um fato interessante é que desde 2022 tem havido uma maior contribuição do emprego formal para a dinâmica agregada do emprego. Além disso, notamos que a melhora educacional teve contribuição importante na recuperação da renda.

1. Introdução

A eclosão da pandemia de Covid-19 gerou uma série de efeitos adversos sobre o mercado de trabalho brasileiro, em especial sobre o emprego. Em particular, no ano de 2020, fase mais crítica da pandemia, os dados da Pnad Contínua disponibilizados pelo IBGE mostraram que houve uma forte queda na população ocupada, em especial dentre os informais, de baixa escolaridade e com menor proteção social. Ao longo de 2021, passada a fase mais aguda da pandemia, os sinais de recuperação do mercado de trabalho brasileiro começaram a aparecer, tendo a população ocupada informal se recuperado com mais força que a população ocupada formal. [1]

Este processo de melhora do mercado de trabalho se manteve ao longo de 2022, porém com uma dinâmica qualitativamente diferente. Em particular, um fato interessante, que será explorado em mais detalhes ao longo deste artigo, é que desde 2022 tem havido uma maior contribuição do emprego formal para a dinâmica agregada do emprego.

Este fato é corroborado pela melhora no saldo do emprego formal, obtido a partir dos dados do Novo Caged, disponibilizados pelo Ministério do Trabalho, e cujos resultados também iremos explorar a fim de complementar a análise do mercado de trabalho formal.

Por fim, discutiremos a dinâmica de recuperação do rendimento do trabalho no período pós-pandemia. Em particular, os dados mostram que após a forte queda observada ao longo de 2021, o rendimento real começou a apresentar sinais de recuperação de forma gradual, alcançando em 2023 o patamar observado antes da crise sanitária. Neste sentido, a partir de um exercício de decomposição de variação da renda, faremos simulações contrafactuais para quantificar a parcela do aumento observado na renda que decorreu de uma melhora da composição educacional da população ocupada e quanto pode ser explicado por um aumento do nível de renda dos trabalhadores dentro de cada grupo educacional.

A partir desta análise, esperamos contribuir para o debate examinando de forma detalhada a dinâmica do mercado de trabalho brasileiro no pós-pandemia. Além desta introdução, o artigo está organizado da seguinte forma. A segunda seção apresenta a dinâmica de recuperação do emprego no pós-pandemia a partir dos dados da Pnad Contínua. A terceira seção analisa a dinâmica do mercado de trabalho formal no pós-pandemia com base nos dados do Novo Caged. A quarta seção mostra a evolução do rendimento do trabalho no pós-pandemia. E por fim, na quinta seção, apresentamos as conclusões do artigo.

2.Dinâmica de recuperação do emprego no pós-pandemia a partir dos dados da Pnad Contínua

O mercado de trabalho brasileiro foi fortemente impactado pela pandemia de Covid-19. Os efeitos da crise sanitária sobre a população ocupada foram bem maiores do que os observados na recessão ocorrida entre 2014 e 2016 (Gráfico 1).

Gráfico 1: Evolução da população ocupada no Brasil e crescimento em relação ao mesmo trimestre móvel do ano anterior.

 

Fonte: Elaboração FGV IBRE com dados da Pnad Contínua.

O Gráfico 1a mostra que a população ocupada, que vinha crescendo entre 2017 e 2019, recuperando a perda causada pela recessão ocorrida entre 2014 e 2016, caiu para níveis historicamente baixos em meados de 2020. Em particular, após alcançar a marca de 95,5 milhões de pessoas no final de 2019, a população ocupada caiu para 82,6 milhões de pessoas no trimestre móvel encerrado em agosto de 2020. Em 2021, iniciou-se um processo de recuperação do emprego, que se manteve nos anos subsequentes, atingindo 100,2 milhões de pessoas no trimestre móvel encerrado em março de 2024. [2]

Apesar da população ocupada ter crescido ao longo dos últimos anos, a velocidade com que este crescimento tem ocorrido vem diminuindo. O Gráfico 1b, que apresenta a taxa de variação em relação ao mesmo trimestre móvel do ano anterior, mostra que houve forte desaceleração no crescimento do emprego ao longo de 2023. Em 2024, a taxa de variação interanual da população ocupada aumentou um pouco (crescimento de 2,4% no trimestre móvel encerrado em março de 2024). Embora esteja bem abaixo do observado nos anos de 2021 e 2022, é próximo do observado entre 2018 e 2019.

Uma questão que se coloca é se o crescimento do emprego ao longo dos últimos anos foi caracterizado pelo aumento de ocupações formais ou informais. Para responder a esta pergunta, fizemos uma decomposição da variação da população ocupada em dois momentos distintos. Primeiro, entre o quarto trimestre de 2016 e o quarto trimestre de 2019, que corresponde à recuperação da recessão de 2014-2016. Segundo, entre o quarto trimestre de 2021 e o primeiro trimestre de 2024, que abrange a recuperação da pandemia. A ideia é observar se houve alguma mudança de padrão na geração de ocupações formais e informais após esses episódios recessivos.[3] O Gráfico 2 apresenta os resultados.

Gráfico 2: Decomposição da variação acumulada da população ocupada em relação aos períodos selecionados

Fonte: Elaboração FGV IBRE com dados da Pnad Contínua.

Podemos observar no Gráfico 2a que a dinâmica da recuperação da população ocupada após a recessão de 2014-2016 se deu majoritariamente pela melhora no emprego informal. Em particular, a população ocupada informal contribuiu com quase 70% do crescimento acumulado do emprego de 5,9% entre o quarto trimestre de 2016 e o quarto trimestre de 2019. Vale ainda destacar que a população ocupada formal só passou a ter contribuição positiva depois de meados de 2018.

O Gráfico 2b mostra que o padrão de recuperação da pandemia entre o quarto trimestre de 2021 e o primeiro trimestre de 2024 foi muito diferente do observado após a recessão de 2014-2016, com predominância da geração de ocupações formais para o crescimento acumulado de 4,7% em relação ao último trimestre de 2021.

Uma análise mais detalhada revela quais foram as categorias de ocupação que mais contribuíram para a dinâmica do emprego na saída das duas crises. Para isso, desagregamos os dados de modo a entender a contribuição de categorias importantes, como trabalhadores com carteira de trabalho assinada, trabalhadores sem carteira de trabalho assinada e trabalhadores por conta própria que possuem ou não um CNPJ (Gráfico 3).

Gráfico 3: Decomposição da variação acumulada da população ocupada em relação aos períodos selecionados

Fonte: Elaboração FGV IBRE com dados da Pnad Contínua.

Os dados mostram uma clara mudança de padrão na contribuição de cada uma das categorias de ocupação. Em primeiro lugar, podemos notar que na saída da recessão de 2014-2016, os trabalhadores com carteira de trabalho assinada contribuíram negativamente para a dinâmica de recuperação do emprego. Ao longo deste período, os grandes motores do crescimento da população ocupada foram os trabalhadores sem carteira assinada e os trabalhadores que trabalham por conta própria sem CNPJ, que são modalidades de ocupações informais.

Esse padrão mudou drasticamente na saída da crise sanitária, em função da contribuição elevada dos trabalhadores com carteira assinada, além da contribuição negativa daqueles que trabalham por conta própria e não possuem CNPJ. Vale notar ainda que apesar da contribuição dos trabalhadores sem carteira assinada ter se mantido positiva na saída da crise sanitária, ela tem sido menor quando comparada com a observada após a recessão de 2014-2016.

3. Dinâmica do mercado de trabalho formal no pós-pandemia com base nos dados do Novo Caged

O bom desempenho do mercado de trabalho formal observado a partir da Pnad Contínua é corroborado pelos dados do Novo Caged. O Gráfico 4 mostra a evolução do saldo de emprego formal desde janeiro de 2020, que corresponde ao início das informações do Novo Caged.

Acesse o texto completo no Observatório da Produtividade Regis Bonelli

 


As opiniões expressas neste artigo são de responsabilidade exclusiva do autor, não refletindo necessariamente a opinião institucional da FGV.


[1] Este ponto foi discutido em detalhes em Veloso e Barbosa Filho (2022), cujo artigo pode ser encontrado no Observatório da Produtividade Regis Bonelli através do link: https://ibre.fgv.br/observatorio-produtividade/artigos/mercado-de-trabalho-no-brasil-evolucao-efeitos-da-pandemia

 

[2] Uma outra forma de mensurar a melhora do mercado de trabalho é a partir da análise do nível de ocupação, obtida pela razão entre a população ocupada e a população em idade de trabalhar. Os dados mostram que o nível de ocupação passou de 56,5% no último trimestre de 2019 para 48,5% em meados de 2020. Em função do aumento da população ocupada, houve uma forte recuperação do nível de ocupação. Em particular, no trimestre móvel encerrado em março de 2024 ele alcançou a marca de 57%, bem maior que o observado em 2020 e ligeiramente mais elevado que o observado no quarto trimestre de 2019.

 

[3]A população ocupada informal é definida da seguinte forma: empregado no setor privado sem carteira de trabalho assinada; empregado doméstico sem carteira de trabalho assinada; empregador sem registro no CNPJ; trabalhador por conta própria sem registro no CNPJ e trabalhador familiar auxiliar. Já a população ocupada formal é definida da seguinte forma: empregado no setor privado com carteira de trabalho assinada; empregado doméstico com carteira de trabalho assinada; empregado no setor público com carteira de trabalho assinada; empregado no setor público sem carteira de trabalho assinada; militar ou funcionário público estatutário; empregador com registro no CNPJ e trabalhador por conta própria com registro no CNPJ.

Comentários

Sylvio Eugenio
É fundamental observar o impacto do BEm no processo de recuperação do trabalho formal: 11,5 milhões de empregos preservados em 1,6 milhão de empresas, com mais de R$ 43 bi pagos. Certamente, não teria havido este comportamento sem a preservação dos empregadores.

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