Macroeconomia

O debate econômico não precisa de espantalhos

5 out 2017

O principal trabalho de um economista é buscar a dimensão correta das questões econômicas envolvidas em um determinado problema. Uma contribuição recente dentro desse espírito foi realizada por Bráulio Borges do IBRE que fez um exercício para avaliar qual o efeito das circunstâncias externas à política econômica na recessão de 2014-16. Evidentemente, esse é um exercício complexo e sujeito a uma série controvérsias, mas ao mesmo tempo é capaz de produzir um debate valoroso para a política econômica do país.

A partir de exercícios desse tipo é possível colocar em uma perspectiva correta um dos maiores espantalhos criados na política econômica nacional. A primeira vez que esse espantalho surgiu, foi a partir de uma interpretação da situação econômica, realizada no final de 2012, pelo então Secretário de Política Econômica do Governo Dilma I, que avaliava estar por vir um período de baixas taxas de juros, taxa de câmbio competitiva e uma consolidação fiscal amigável ao investimento.

Com o tempo o que era uma mera avaliação que se mostrou equivocada sobre o comportamento da economia ganhou vida própria. Seu conceito foi ampliado, incorporando outros temas e seu horizonte temporal foi remexido, voltando para antes de 2008. Em resposta a Bráulio, Samuel Pessoa, em coautoria com um dublê de desenho animado, apontou alguns limites no exercício realizado.

Esse debate provavelmente vai continuar por mais tempo e com outros atores. Mas queria chamar atenção para a questão que me parece substantiva e que não foi colocada ainda: quais são os limites ideais da atuação da política econômica? Quais devem ser as regras do jogo? Esses limites devem ser alterados se o país estiver em uma recessão? Se sim, até que ponto?

Questões como essa abundam no dia a dia da política econômica tanto no episódio em debate quanto no presente momento. São exemplos bastante atuais: Quais os limites para a edição de programas de refinanciamento tributário? Deveria haver limites sobre a política de swaps cambiais? É necessário prestar contas dos seus impactos para a sociedade? É adequado alterar temporariamente a regra de ouro? Até que ponto ela atingiu seus objetivos?

Infelizmente o debate caminhou em uma outra direção que serviu para caricaturar algumas alternativas, como vimos no caso do FGTS. No final, ao invés de ampliar as opções da política econômica para solucionar a crise, o debate público acabou por reduzir as alternativas em discussão, o que não me parece adequado.

A caricatura da política econômica levou a outro problema identificado por Nelson Barbosa que, ao analisar as alternativas de consolidação fiscal no Brasil por meio do aumento de receitas, apontou haver amnésia seletiva por parte de analistas que têm defendido algumas propostas que já haviam sido feitas no passado recente quando foram ignoradas. Um bom exemplo ocorreu com a meritória discussão sobre tributação de lucros e dividendos encaminhada pelo Governo Dilma já no final do seu 2º mandato por meio do PL 5.205/2016.

Em resposta, Samuel Pessoa, afirmou não haver amnésia seletiva, mas sim uma discordância sobre o sequenciamento do ajuste fiscal. Defendeu que deveria haver redução das despesas primeiro para depois realizar o ajuste restante pelas receitas. Por fim, Samuel convoca os economistas por uma agenda de consenso apartidária.

Confesso que fiquei intrigado com a resposta de Samuel. Não por discordar, muito pelo contrário, mas por saber que foi exatamente isso o que o Governo Dilma tentou em seu segundo mandato. A Tabela a seguir apresenta a compilação das medidas de redução de despesa e revisão de desonerações que foram implementadas em 2015.

Fonte: Pires, (2017).

Depois desse ajuste, o governo anunciou que iria iniciar os estudos para uma ampla reforma da previdência, que começou a ser debatida no início de 2016. A proposta feita pelo governo atual se assemelha em vários pontos à que estava em discussão na época. Por que propor uma coalisão de consenso apenas agora, depois do ápice da polarização que vivemos em 2015, e não naquele momento? As razões apontadas não me pareceram convincentes em razão dos fatos aqui expostos.

De qualquer forma,  defender algo considerado correto deve ser uma questão de bom senso e honestidade intelectual, e não uma questão partidária, preceito que as pessoas que conheço seguem. Será importante que na eleição no próximo ano, quando as pessoas que participam do debate público terão um papel importante a desempenhar, possamos seguir nessa linha em qualquer contexto e sem o uso de espantalhos.

Pires, M. (2017). “Política fiscal e ciclos econômicos: Teoria e a Experiência Recente”. IBRE e Ed. Elsevier.

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