Cenários

Hiato foi positivo no 4º tri e PIB cresceu mais que potencial durante todo 2023

14 mar 2024

Em 2023, produto efetivo cresceu 2,9% e produto potencial cresceu 0,7%. Atividade econômica superou o produto potencial devido à virtual estagnação do produto efetivo (falta de oferta) e não devido a um excesso de demanda.

O hiato do produto[1] apresentou sua quarta estimativa consecutiva positiva (0,3%), após permanecer nove anos em terreno negativo, desde 2014.  

As séries utilizadas neste artigo podem ser encontradas neste link.

O Gráfico 1 indica reversão na trajetória do hiato negativo, sugerindo ausência de capacidade ociosa na economia nos últimos quatro trimestres (0,2% no 1T23, 1,4% no 2T23, 0,7% no 3T23 e 0,3% no 4T23). Desde o segundo trimestre de 2014, quando o hiato foi de 0,2%, não havia sido observada leitura de hiato do produto positiva. No primeiro trimestre de 2014 foi datado o início do ciclo recessivo que perdurou até 2016. Até aquele momento, o produto potencial e o efetivo cresciam simultaneamente (em média 0,61% ao ano). A partir de 2016 e até 2023, o produto potencial e o efetivo crescem de forma semelhante, mas a taxas bem inferiores (de 0,26% ao ano).

Em 2023, o produto efetivo cresceu 2,9% enquanto o produto potencial cresceu bem menos (0,7%). Ou seja, a atividade econômica superou o produto potencial devido à virtual estagnação do produto efetivo (falta de oferta) e não devido a um excesso de demanda. O Gráfico 2 mostra que esse crescimento potencial (0,7% acumulados em 4 trimestres) foi composto por crescimento do capital potencial em 0,8 p.p., do trabalho potencial em 0 p.p. e por queda da PTF em -0,1 p.p. Tendo em vista que o crescimento da atividade econômica no primeiro semestre do ano foi fortemente puxado pela agropecuária, é também coerente que o crescimento potencial tenha sido mais forte em capital, pelas máquinas agrícolas.

Fonte: informações primárias do IBGE (PIB, FBKF, trabalho), da FGV (NUCI). Elaboração própria.

Se olharmos a decomposição do crescimento potencial, pensando que a discussão de produto potencial é estrutural e de longo prazo, e ao notarmos que a economia cresce com uma taxa de investimento em torno de 18% e uma PTF que não cresce muito acima de 0,4%, dificilmente vemos o produto potencial acima de 1,6%, 2,0% (Tabela 1).

Observa-se no Gráfico 3 que a PTF apresentou tendência declinante na segunda metade da década de 1980 e início da década de 1990, fato que pode ser associado às diversas crises econômicas vivenciadas pelo Brasil nesse período. Desde então, a tendência da PTF foi ascendente até 2010, tendo passado sem maiores dificuldades pela crise de 2008-2009. A partir de 2010 a trajetória se reverteu, com declínio do nível da PTF que se prolongou até o quarto trimestre de 2015. Em seguida, a PTF volta a crescer, mas essa trajetória ascendente foi interrompida com a chegada da pandemia, em 2020. A partir de então, a PTF segue em níveis historicamente altos, porém com suave trajetória de queda e seu nível atual é inferior ao do segundo trimestre de 2010, que foi seu auge.

 Fonte: informações primárias do IBGE e elaboração própria

O Gráfico 4 apresenta as informações da evolução das utilizações do capital e do trabalho efetivas em percentual dos seus potenciais. Ao longo dos últimos 40 anos, foi frequente a sobreutilização do capital e a subutilização do fator trabalho. Algumas particularidades merecem ser destacadas: o fator capital foi, na quase totalidade do tempo, sobreutilizado, à exceção dos dois primeiros anos da década de 1990 e do Plano Real, durante a recessão de 2014-16 e no ano de 2020 durante a pandemia. A partir daí, o fator capital volta a ficar sobreutilizado.

O fator trabalho na década de 1980 andou próximo à utilização plena e foi sobreutilizado em alguns anos desse período até o quarto trimestre de 1991; em seguida, foi subutilizado no restante do período até 2013 quando a sua utilização cresce, ficando com plena utilização até o segundo trimestre de 2015; a partir de então volta a ficar subutilizado, com alguns períodos de melhoria graças aos incentivos à manutenção do emprego durante a pandemia.


Fonte: informações primárias do IBGE (PIB, FBKF, trabalho), da FGV (NUCI) e elaboração própria.

A produtividade do capital foi declinante durante os anos 80; a partir dos anos 90 cresce até 2009 e declina até 2014, quando volta a subir e cai com a pandemia. A produtividade do trabalho se mantém estagnada durante os anos 80, se reduz até 1992 e cresce até 2014, quando despenca e fica estagnada. 


[1]  No resultado do segundo trimestre, divulgado anteriormente, fizemos um aprimoramento em nosso método de cálculo do produto potencial, que envolve o tratamento da variável Produtividade Total dos Fatores (PTF). Essa variável não é mais considerada um resíduo da função de produção, após a estimativa do capital e do trabalho utilizados. Doravante, a reconhecemos como a tendência daquela série obtida pelo resíduo, após aplicação de método de filtragem. Isso resulta em uma série com menos ruído e volatilidade.

As opiniões expressas neste artigo são de responsabilidade exclusiva dos autores, não refletindo necessariamente a opinião institucional da FGV. 

 

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