Macroeconomia

Mudança no padrão de recuperação do emprego após a última recessão e sua relação com a produtividade do trabalho

16 mar 2020

O IBRE elegeu a produtividade como uma das preocupações centrais de sua missão institucional de contribuir para o debate sobre o desenvolvimento econômico do país. Diante da relevância do tema, o IBRE lançou recentemente o site Observatório da Produtividade, que reúne uma ampla base de dados sobre produtividade da economia brasileira, além de estudos e análises, a fim de fornecer informações para uma maior compreensão do tema e contribuir para a formulação de políticas públicas que possam aumentar a produtividade e impulsionar o crescimento econômico.[1]

Uma das motivações para o aprofundamento de estudos relacionados ao tema é a perda de dinamismo recente da produtividade do trabalho, explicada, em parte, pelo forte avanço da informalidade observado nos últimos anos, principalmente após a última recessão pela qual o Brasil passou, uma das mais longas e profundas da história do país.

Diante disso, o objetivo deste texto é discutir as diferenças entre o desempenho da produtividade do trabalho após esta última recessão, que durou do 2º trimestre de 2014 ao 4º trimestre de 2016, em comparação com a recuperação das demais recessões desde a década de 1980, bem como a mudança no padrão de recuperação do emprego.[2]

A Tabela 1 apresenta a datação dos períodos de recessão e expansão desde meados da década de 1980, bem como suas durações, elaborada pelo Comitê de Datação de Ciclos Econômicos (CODACE).

Tabela 1: Cronologia trimestral dos períodos de recessão e expansão

Recessões

Expansões

Período

Duração em trimestres

Período

Duração em trimestres

Do 1º trimestre de 1981 ao 1º trimestre de 1983

9

Do 2º trimestre de 1983 ao 2º trimestre de 1987

17

Do 3º trimestre de 1987 ao 4º trimestre de 1988

6

Do 1º trimestre de 1989 ao 2º trimestre de 1989

2

Do 3º trimestre de 1989 ao 1º trimestre de 1992

11

Do 2º trimestre de 1992 ao 1º trimestre de 1995

12

Do 2º trimestre de 1995 ao 3º trimestre de 1995

2

Do 4º trimestre de 1995 ao 4º trimestre de 1997

9

Do 1º trimestre de 1998 ao 1º trimestre de 1999

5

Do 2º trimestre de 1999 ao 1º trimestre de 2001

8

Do 2º trimestre de 2001 ao 4º trimestre de 2001

3

Do 1º trimestre de 2002 ao 4º trimestre de 2002

4

Do 1º trimestre de 2003 ao 2º trimestre de 2003

2

Do 3º trimestre de 2003 ao 3º trimestre de 2008

21

Do 4º trimestre de 2008 ao 1º trimestre de 2009

2

Do 2º trimestre de 2009 ao 1º trimestre de 2014

20

Do 2º trimestre de 2014 ao 4º trimestre de 2016

11

Do 1º trimestre de 2017 ao 4º trimestre de 2019

12

Fonte: Comitê de Datação de Ciclos Econômicos (CODACE)

A Tabela 1 mostra que a última recessão foi uma das mais longas pelas quais o país já passou. A perda acumulada do PIB entre o segundo trimestre de 2014 e o quarto trimestre de 2016 foi de 8,1%, um pouco maior do que a perda acumulada do Valor Adicionado (-7,4%), que exclui os impostos (líquidos de subsídios) sobre produtos, e que é a variável usada para o cálculo da medida de produtividade do trabalho que será apresentada adiante.[3]

O Gráfico 1 mostra o comportamento da taxa de crescimento da produtividade por pessoal ocupado, em relação ao mesmo trimestre do ano anterior, nos períodos de recessão e expansão da economia brasileira. Esta análise nos ajuda a descrever fatos estilizados que permitem avaliar as mudanças na dinâmica do crescimento da produtividade após a última recessão, em comparação com as demais ocorridas no passado.

Gráfico 1: Taxa de crescimento da produtividade agregada
(por pessoal ocupado - em % e em relação ao mesmo trimestre do ano anterior) – Brasil.[4]

Fonte: Elaboração IBRE FGV com dados da Pnad e Pnad Contínua.

O primeiro fato estilizado presente no Gráfico 1 é a ocorrência, em todas as recessões, de queda na produtividade por pessoal ocupado. Nota-se que as quedas observadas desde meados da década de 1980 até o início dos anos 1990 foram bem mais intensas que as observadas nas recessões mais recentes. Ao longo da série histórica, o primeiro trimestre de 1992, que marcou o fim de um longo período recessivo, foi o que apresentou maior queda da produtividade, cerca de 8,2% em relação ao mesmo trimestre do ano anterior.

Embora tenham ocorrido em menor magnitude, as recessões ocorridas ao longo dos anos 2000 e 2010 também provocaram queda na produtividade do trabalho. Neste período, os trimestres de maiores quedas na produtividade foram o quarto trimestre de 2015, o primeiro trimestre de 2009 e o quarto trimestre de 2001, com retrações de 4,2%, 4,1% e 3%, respectivamente. Diante da perda de dinamismo gerada ao longo das recessões, é natural que haja uma queda da produtividade durante períodos recessivos.

O segundo fato estilizado presente no Gráfico 1 diz respeito ao padrão no comportamento da produtividade do trabalho observado desde o final de 2016, que é muito diferente do observado nos demais períodos de expansão da economia desde a década de 1980.

Com exceção dos dois primeiros trimestres de 2017, em todo o período de expansão após a última recessão o crescimento da produtividade ficou próximo de zero, ou em terreno negativo, como temos visto desde o quarto trimestre de 2018, não havendo sinais claros de uma recuperação robusta como a observada nos outros períodos de expansão. Em particular, a queda da produtividade por pessoal ocupado no quarto trimestre de 2019 foi de 0,3%, um pouco menor do que a ocorrida no terceiro trimestre de 2019 (-0,5%).[5]

Vale destacar que o crescimento da produtividade no primeiro semestre de 2017 foi fortemente afetado pelo excelente desempenho da agropecuária, cuja produtividade cresceu, em relação ao mesmo trimestre do ano anterior, 30,9% no primeiro trimestre, e 26,4% no segundo trimestre do ano em questão.

Este padrão é diferente do observado nos demais períodos de expansão. Embora alguns trimestres, desde a década de 1980 e início dos anos 2000, tenham apresentado crescimento negativo em períodos de expansão, foi possível perceber uma melhora ao longo desses trimestres, de modo que o crescimento foi ficando cada vez menos negativo, diferentemente do padrão observado na última recessão, em que a produtividade melhorou num primeiro momento, em função do aumento expressivo da produtividade da agropecuária, e depois voltou a piorar, sem apresentar sinais claros de recuperação.

Já nos períodos de expansão ocorridos entre 2003 e 2013, que foram anos de forte crescimento da produtividade do trabalho, a taxa de crescimento da produtividade ficou num terreno positivo e relativamente elevado durante quase todo o período, chegando ao patamar de 6,4% no primeiro trimestre de 2010.

Diante destes fatos, nota-se que houve uma mudança no padrão de comportamento da produtividade após a última recessão em comparação com períodos de recuperação anteriores, principalmente quando comparado com o período de expansão ocorrido entre 2003 e 2013, que foi de forte crescimento da produtividade do trabalho.

Muito se discute sobre as possíveis causas da desaceleração da produtividade desde o fim da última recessão no quarto trimestre de 2016. Uma das possíveis explicações é que o desempenho negativo da produtividade está associado ao forte avanço da informalidade ocorrido desde então.[6]

Para o acesso do texto completo, entre no site do Observatório da Produtividade.

 


[1]O site, disponível no endereço https://ibre.fgv.br/observatorio-produtividade, foi lançado no dia 4 de dezembro de 2019 no I Seminário de Produtividade e Reformas.

[2]Ao invés de utilizarmos o conceito de produtividade por hora trabalhada, cuja série setorial e agregada tem sido regularmente divulgada no site Observatório da Produtividade, iremos utilizar, neste texto, a medida de produtividade por pessoal ocupado, para que haja compatibilidade com a análise de informalidade, que considera a proporção de pessoas ocupadas em atividades informais em relação ao total de pessoas ocupadas no país.

[3]O cálculo de perda acumulada do PIB e do Valor Adicionado já incorpora as revisões feitas na última divulgação das Contas Nacionais Trimestrais, disponibilizada pelo IBGE no dia 3/12/2019.

[4]As áreas sombreadas representam os períodos de recessão. As áreas que não estão sombreadas representam os períodos de expansão.

[5]No quarto trimestre de 2019, a queda da produtividade por hora trabalhada, em relação ao mesmo trimestre do ano anterior, ficou próxima de 0,6%. O relatório contendo a análise trimestral dos indicadores setoriais de produtividade do trabalho por hora trabalhada podem ser acessados através do link: https://ibre.fgv.br/sites/ibre.fgv.br/files/arquivos/u65/indicadores_trimestrais_de_produtividade_do_trabalho_-_4t2019.pdf

[6]Como as empresas formais têm produtividade cerca de quatro vezes maior que a de firmas informais, uma queda da informalidade pode contribuir para o aumento da produtividade. De fato, Barbosa Filho e Veloso (2016) mostram que a realocação do emprego para o setor formal explica cerca de 87% dos ganhos de produtividade da economia brasileira entre 2000 e 2009. Analogamente, um aumento da informalidade pode contribuir para um menor crescimento da produtividade, como no período recente. Ver BARBOSA FILHO, F.; VELOSO, F. “A Contribuição da Formalização para a Elevação da Produtividade do Trabalho no Brasil nos Anos 2000: Uma Análise Exploratória”.  Barbosa Filho, F.; Ulyssea, G.; Veloso, F. (Orgs). Causas e Consequências da informalidade no Brasil. Rio de Janeiro: Editora Elsevier, p. 303-325, 2016.

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