Após novo crescimento interanual no primeiro trimestre de 2024, produtividade por hora efetivamente trabalhada continua acima da tendência pré-pandemia
Após crescer 1,3% no último tri do ano passado, a produtividade por hora efetivamente trabalhada avançou 1,1% no primeiro tri de 2024. Este resultado contribuiu para que esta medida continuasse acima da tendência pré-pandemia.
Os eventos associados à pandemia de Covid-19 tiveram forte impacto sobre a atividade econômica e o mercado de trabalho, e elevaram de forma extraordinária o nível de incerteza em relação à dinâmica dos indicadores de produtividade, especialmente no Brasil.
Nas últimas semanas foram divulgados dados de produtividade do trabalho para economias avançadas, como os Estados Unidos e Reino Unido. Nos Estados Unidos foi verificada tanto uma elevação da produtividade por hora trabalhada agregada quanto da produtividade do setor manufatureiro no primeiro trimestre de 2024, em comparação com o mesmo período de 2023. No Reino Unido houve elevação tanto no indicador que considera como medida do fator trabalho o número de pessoas ocupadas quanto na métrica que considera as horas trabalhadas.[1]
Desde 2019, o Observatório da Produtividade Regis Bonelli do FGV IBRE tem divulgado estatísticas de produtividade por população ocupada e por hora trabalhada. Esta última medida considera duas informações sobre o total de horas trabalhadas. A primeira são as horas habitualmente trabalhadas em todas as ocupações, obtidas da PNAD Contínua, que têm como referência uma semana em que não haja situações excepcionais que alterem a duração rotineira do trabalho, ou seja, uma semana típica de trabalho.[2]
A PNAD Contínua também fornece informações sobre as horas efetivamente trabalhadas na semana de referência, que podem incluir reduções por motivo de doença, feriado, falta voluntária, atraso ou por outra razão, bem como aumentos por conta de pico de produção e compensação de horas não trabalhadas em outro período.
Até o início da pandemia, os resultados obtidos a partir das duas medidas de horas trabalhadas eram semelhantes.[3] No entanto, em função das medidas de distanciamento social necessárias para conter os efeitos da pandemia, desde o primeiro trimestre de 2020 os dados da PNAD Contínua passaram a revelar um descolamento entre as diferentes medidas do fator trabalho, em especial no segundo trimestre de 2020, tal como exposto no Gráfico 1.
Gráfico 1: Taxa de crescimento das horas efetivamente trabalhadas,
das horas habitualmente trabalhadas e da população
ocupada para o agregado da economia – (Em % e em relação ao mesmo trimestre do ano anterior) – Brasil
Fonte: Observatório da Produtividade Regis Bonelli. Elaboração FGV IBRE
com base nos dados das Contas Nacionais Trimestrais e da Pnad Contínua (IBGE).
No primeiro trimestre de 2020, e particularmente no segundo trimestre, houve forte discrepância entre as medidas de população ocupada e horas habitualmente trabalhadas, de um lado, e das horas efetivamente trabalhadas, de outro. Os dados mostram que a queda nas horas efetivamente trabalhadas foi muito maior que a observada tanto na população ocupada quanto nas horas habitualmente trabalhadas.[4]
Esta discrepância, no entanto, foi diminuindo com a recuperação gradual ocorrida no mercado de trabalho nos trimestres seguintes. Em particular, ao longo de 2021, houve uma recuperação mais rápida das horas efetivamente trabalhadas quando comparado com o observado no emprego e nas horas habituais.[5] Como mostra o Gráfico 1, ao longo de 2022 houve uma desaceleração do crescimento das medidas do fator trabalho.[6]
Esta tendência de desaceleração do fator trabalho se manteve em 2023.[7] No entanto, os dados do primeiro trimestre de 2024 apontaram para uma aceleração no crescimento das medidas do fator trabalho. Em particular, a população ocupada e o total de horas habitualmente trabalhadas (ambos com crescimento interanual de 2,4%) apresentaram crescimento maior que o total de horas efetivamente trabalhadas (1,2%). Este descolamento entre as duas medidas de horas trabalhadas ocorreu em função da forte queda da jornada média efetivamente trabalhada.[8]
Em consequência disso, o indicador de produtividade construído com base nas horas efetivamente trabalhadas, que havia apresentado comportamento muito diferente ao longo da pandemia quando comparado com a produtividade por população ocupada e com a produtividade por hora habitualmente trabalhada, voltou a apresentar descolamento no início de 2024, tal como apresentado no Gráfico 2.
Gráfico 2: Taxa de crescimento da produtividade agregada
com base nas diferentes medidas do fator trabalho (por hora efetivamente
trabalhada, por hora habitualmente trabalhada, e por população ocupada
- em % em relação ao mesmo trimestre do ano anterior) – Brasil
Fonte: Observatório da Produtividade Regis Bonelli. Elaboração FGV IBRE
com base nos dados das Contas Nacionais Trimestrais e da Pnad Contínua (IBGE).
Para o agregado da economia, a dinâmica da produtividade no Brasil até o quarto trimestre de 2019 não depende da métrica considerada. Com o avanço da pandemia de Covid-19, no entanto, o indicador de produtividade com base nas horas efetivamente trabalhadas começou a apresentar um forte descolamento em relação aos indicadores de produtividade por hora habitualmente trabalhada e por população ocupada, em especial no segundo trimestre de 2020.[9]
Por conta do processo de normalização das horas efetivamente trabalhadas houve, no primeiro trimestre de 2021, uma forte desaceleração do crescimento do indicador de produtividade que considera esta medida do fator trabalho, seguida de uma queda significativa no segundo trimestre. Já os indicadores de produtividade que consideram a população ocupada e o total de horas habitualmente trabalhadas tiveram desaceleração do crescimento entre o primeiro e o segundo trimestre de 2021. Os dados mostram ainda que nos dois últimos trimestres de 2021 todas as métricas apontaram um forte recuo interanual da produtividade.[10] Esse quadro de queda interanual da produtividade se manteve ao longo de 2022, embora em magnitude menor ao longo dos trimestres.[11]
No entanto, em 2023, houve uma reversão deste padrão de sucessivas quedas interanuais nos indicadores de produtividade para o agregado da economia. Em particular, ao longo do ano passado os dados apontaram para consecutivas elevações interanuais nos indicadores de produtividade.[12]
Em função do descolamento observado nas medidas do fator trabalho, o crescimento interanual dos indicadores de produtividade do primeiro trimestre de 2024 voltaram a apresentar diferenças significativas. Em particular, enquanto a métrica que considera o total de horas efetivamente trabalhadas cresceu 1,1% em relação ao mesmo período do ano passado, as medidas que consideram o total de horas habitualmente trabalhadas e a população ocupada recuaram 0,1%, na mesma base de comparação.
Outra forma de analisar a dinâmica dos indicadores de produtividade é com base nas séries que descontam os efeitos sazonais de cada trimestre, ou seja, com base nas séries dessazonalizadas. O Gráfico 3 mostra a taxa de crescimento dos indicadores de produtividade do trabalho em relação ao trimestre imediatamente anterior.[13]
Gráfico 3: Taxa de crescimento da produtividade agregada
com base nas diferentes medidas do fator trabalho (por hora efetivamente
trabalhada, por hora habitualmente trabalhada, e por população ocupada -
em % em relação ao trimestre imediatamente anterior) – Brasil
Fonte: Observatório da Produtividade Regis Bonelli. Elaboração FGV IBRE
com base nos dados das Contas Nacionais Trimestrais e da Pnad Contínua (IBGE).
O Gráfico 3 mostra que, embora a produtividade tenha crescido no segundo trimestre de 2020 em todas as métricas, e no terceiro trimestre de acordo com as medidas por população ocupada e hora habitualmente trabalhada, houve queda na margem em todos os indicadores no quarto trimestre de 2020. Em 2021, houve queda na margem em todas as medidas. Em 2022, os resultados também não foram animadores, tendo em vista que a variação de todas as métricas oscilou entre queda ou ligeiro aumento. Após apresentarem elevações entre o primeiro e o segundo trimestre de 2023, houve estabilidade no terceiro trimestre e queda na margem em todas as medidas de produtividade do trabalho no quarto trimestre do ano passado.
Já no primeiro trimestre de 2024, enquanto a métrica que considera o total de horas efetivamente trabalhadas apresentou estabilidade, os indicadores que consideram o total de horas habitualmente trabalhadas e a população ocupada recuaram 0,6% e 0,3%, respectivamente.
Como mostra o Gráfico 4, após um salto expressivo no segundo trimestre de 2020, a produtividade por hora efetivamente trabalhada desacelerou até 2022. As elevações observadas ao longo dos dois primeiros trimestres de 2023 elevaram a produtividade por hora efetivamente trabalhada, por hora habitualmente trabalhada e por população ocupada para um nível acima do observado no quarto trimestre de 2019.
No primeiro trimestre de 2024, apesar do recuo das métricas que consideram a população ocupada e o total de horas habitualmente trabalhadas e da estabilidade da medida que considera o total de horas efetivamente trabalhadas, todas as medidas continuam acima do nível pré-pandemia em 0,8%, 0,5% e 1,2%, respectivamente.
Gráfico 4: Evolução da produtividade do trabalho (4º trimestre de 2019=100)
Fonte: Observatório da Produtividade Regis Bonelli. Elaboração FGV IBRE
com base nos dados das Contas Nacionais Trimestrais e da Pnad Contínua (IBGE).
No Gráfico 5 apresentamos a taxa de crescimento da produtividade do trabalho em relação ao mesmo trimestre do ano anterior, para os três grandes setores da economia (agropecuária, indústria e serviços), com base nas três medidas do fator trabalho (por hora efetivamente trabalhada, por hora habitualmente trabalhada, e por população ocupada).[14]
Acesse o artigo completo no Observatório da Produtividade Regis Bonelli.
[1] Nos Estados Unidos, os indicadores do Bureau of Labor Statistics (BLS) apontaram para uma elevação da produtividade agregada (nonfarm business sector) de 2,9% no primeiro trimestre de 2024 em relação ao primeiro trimestre de 2023. Já no setor manufatureiro a elevação foi menor (1,1% na mesma base de comparação). No Reino Unido, os dados do Office for National Statistics (ONS) mostraram uma elevação de 0,8% na produtividade por pessoal ocupado no primeiro trimestre de 2024 em relação ao mesmo período de 2023. Já na métrica de produtividade que considera como medida do fator trabalho o total de horas trabalhadas, os dados do ONS apontaram para uma pequena elevação de 0,1% na mesma base de comparação.
[2] O total de horas habitualmente trabalhadas em todas as ocupações corresponde ao produto da jornada média pela população ocupada.
[3] Este fato foi amplamente discutido nas notas anteriores, que podem ser acessadas no Observatório da Produtividade Regis Bonelli pelo link: https://ibre.fgv.br/observatorio-produtividade/artigos/categorias/relatoriosnotas-tecnicas
[4] Em 2020, houve uma queda muito mais pronunciada das horas efetivas (-14,1%) em comparação com a população ocupada (-7,7%) e com as horas habituais (-7,5%).
[5] Em 2021, houve um avanço muito mais pronunciado das horas efetivas (13,8%) em comparação com a população ocupada (5,0%) e com as horas habituais (5,1%).
[6] Em 2022, houve crescimento de 7,4% na população ocupada, de 7,7% no total de horas habitualmente trabalhadas e de 7,9% no total de horas efetivamente trabalhadas.
[7] Em 2023, houve crescimento de 1,4% na população ocupada, de 0,9% no total de horas habitualmente trabalhadas e de 1,1% no total de horas efetivamente trabalhadas.
[8] Em particular, enquanto a jornada média efetivamente trabalhada caiu 1,2% no primeiro trimestre de 2024 em relação ao mesmo período de 2023, a jornada média habitualmente trabalhada caiu apenas 0,1% na mesma base de comparação.
[9] Em 2020, todas as medidas apontaram para uma elevação da produtividade agregada. Enquanto a métrica que considera as horas efetivamente trabalhadas apresentou forte avanço de 12,7%, as medidas que consideram as horas habitualmente trabalhadas e população ocupada cresceram 4,7% e 4,9%, respectivamente.
[10] Em 2021, houve queda em todas as medidas de produtividade. Em particular, enquanto a métrica que considera as horas efetivamente trabalhadas apresentou recuo de 8,1%, as medidas que consideram as horas habitualmente trabalhadas e população ocupada recuaram 0,5% e 0,4%, respectivamente.
[11] Em 2022, houve queda em todas as medidas de produtividade. Em particular, enquanto a métrica que considera as horas efetivamente trabalhadas apresentou recuo de 4,4%, as medidas que consideram as horas habitualmente trabalhadas e população ocupada recuaram 4,2% e 4,0%, respectivamente.
[12] Em 2023, houve elevação em todas as medidas de produtividade. Em particular, enquanto a métrica que considera as horas efetivamente trabalhadas cresceu 1,9%, as medidas que consideram as horas habitualmente trabalhadas e população ocupada cresceram 2,1% e 1,6%, respectivamente.
[13] A construção dos indicadores de produtividade com ajuste sazonal foi feita com base na dessazonalização de cada um dos seus componentes. Como o IBGE não divulga séries dessazonalizadas de emprego e horas trabalhadas, utilizamos o mesmo procedimento aplicado ao valor adicionado para fazer o ajuste sazonal do fator trabalho.
[14] No site do Observatório da Produtividade Regis Bonelli disponibilizamos os indicadores de produtividade para as três medidas do fator trabalho nos doze setores da economia. O acesso à base de dados está disponível através do link: https://ibre.fgv.br/observatorio-produtividade/temas/categorias/pt-trimestral
As opiniões expressas neste artigo são de responsabilidade exclusiva do autor, não refletindo necessariamente a opinião institucional da FGV.
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